Dei um passo à frente, minhas mãos tremendo levemente enquanto eu segurava a caixa grande e chata.
Eu passei três meses pintando uma aquarela detalhada da casa ancestral da família na Sicília. Era para ser minha oferta de paz. Minha tentativa desesperada de ser aceita neste tanque de tubarões.
"Feliz aniversário, Dona Eleonora", eu disse, minha voz mais firme do que eu me sentia.
Levantei a tampa.
Um grito escapou da minha garganta antes que eu pudesse impedi-lo.
A pintura tinha sumido.
Dentro, preso ao forro de veludo preto, havia um rato morto.
A zombaria era grotesca. A carcaça estava vestida com um minúsculo e tosco véu de noiva, e suas patas rígidas e frias estavam coladas com supercola a um martelo de leilão em miniatura.
O cheiro adocicado e doentio de podridão atingiu a sala instantaneamente, silenciando os convidados.
O rosto de Eleonora se contorceu, suas feições se transformando em uma máscara de pura fúria.
"O que é isso?", ela sibilou, o som como vapor escapando de uma válvula.
"Eu... eu não...", gaguejei, recuando enquanto o sangue sumia do meu rosto.
Carla emergiu das sombras como uma víbora atacando na grama.
"Oh, Juliana", ela disse, sua voz pingando uma simpatia artificial que mal escondia sua alegria. "Isso é uma confissão?"
"Um rato", cuspiu Eleonora, levantando-se lentamente de seu trono. "Você traz um rato para a minha casa?"
No nosso mundo, um rato não era apenas um insulto ou uma pegadinha.
Era uma acusação.
Significava traidor.
"Não!", gritei, o pânico crescendo no meu peito. "Eu pintei a casa! Alguém trocou!"
Virei-me desesperadamente para meu marido.
"Alex, por favor", implorei, procurando em seus olhos por um pingo de humanidade. "Você me viu pintando. Você sabe que eu fiz."
Alex olhou para a criatura em decomposição na caixa.
Então, lentamente, ele voltou seu olhar para mim.
Seu rosto era uma parede de pedra - impenetrável, frio e totalmente desprovido de misericórdia.
"Ela precisa aprender a ter respeito, Vovó", ele disse com naturalidade.
Meu coração parou.
Ele não ia me salvar.
Foi ele quem abriu a jaula.
"Campos", ordenou Eleonora, apontando um dedo ossudo para o chão. "A vara."
Dois capangas agarraram meus braços antes que eu pudesse me mover. Eles me arrastaram para o centro da sala e chutaram a parte de trás dos meus joelhos, forçando-me a cair no chão.
Eu não gritei.
Travei a mandíbula. Eu não lhes daria essa satisfação.
Campos, um homem com olhos mortos de tubarão, deu um passo à frente segurando uma vara de bambu flexível.
"Dez chibatadas", pronunciou Eleonora. "Pelo desrespeito."
O primeiro golpe acertou, atingindo minhas costas como um chicote de fogo líquido.
Mordi o lábio com tanta força que senti o gosto de cobre.
Uma.
Alex assistia.
Ele ergueu o copo e tomou um gole lento e indiferente de seu uísque.
Duas.
Carla sorriu, seus dedos traçando ociosamente o pingente da Estrela dos Borges em seu pescoço.
Três.
A dor irradiava para fora, envolvendo minhas costelas como um torno esmagador. Forcei meus olhos a se abrirem, focando no padrão intrincado do tapete persa.
Foquei no ódio.
Era a única coisa que me mantinha consciente.
Quatro.
Cinco.
Na décima chibatada, eu não conseguia respirar. Minhas costas pareciam ter sido esfoladas.
Os capangas me soltaram, e eu caí para a frente no chão, ofegando por ar.
Alex se aproximou. Vi seus sapatos polidos pararem a centímetros do meu rosto.
Ele se agachou.
Ele não ofereceu a mão. Ele não me ajudou a levantar.
Em vez disso, ele se inclinou, seus lábios roçando minha orelha.
"Nunca mais me envergonhe", ele sussurrou, sua voz sombria e letal.
Ele se levantou, ajustou os punhos da camisa e foi embora com Carla em seu braço.
Fiquei ali no tapete, tremendo.
Através da agonia, comecei a contar.
Não a dor.
Os dias.
Sessenta e dois dias.