É engraçado como nós, seres humanos, temos a capacidade de nos adaptarmos às situações mais adversas que existem. Mas ainda assim, todo dia se torna uma luta diária, todo dia tentamos nos superar e superar aquilo que nos afligiu. Tentando bravamente nos recuperar das porradas que a vida nos dá. Às vezes é fácil, porém algumas vezes, é sofrido, doloroso e leva tempo, no nosso caso foram exatamente três anos. Ainda acordada deitada na minha cama, penso nas diversas coisas que tenho para fazer, é assustador como o dia passa voando, parecendo frequentemente que necessitamos de mais algumas horas para completar tudo que temos para fazer.
Decido me levantar, pois tenho que encontrar dona Olga e depois ainda tenho algumas encomendas para concluir. Levanto, me espreguiçando, visto minha calça jeans , uma blusinha de alça, calço minhas sapatilhas e saio para tomar café da manhã. Na mesa do café, encontro minha família já sentada conversando.
- Bom dia, família! – Digo, já me sentando a mesa com eles.
- Bom dia, filha.- Mamãe responde.
Meu pai me cumprimenta soltando um pequeno balbuciar de palavras. Depois que ele teve o AVC, teve que fazer diversos acompanhamentos, graças a Deus ele não se recusou a ir ao médico, nem a fazer os tratamentos, mas ficamos preocupados com seu estado psicológico depois do que aconteceu. Apesar de hoje ele estar um pouco melhor, soltar pequenas palavras balbuciadas e conseguir dar alguns passos arrastados, ainda assim ele não é mais o mesmo de antes, se tornou uma pessoa fechada e retraída, seu passatempo preferido é ficar na varanda de casa olhando os pássaros e vendo as meninas brincarem no quintal.
- Bom dia irmãzona. - Felícia e Flávia dizem juntas.
-Bom dia, irmã. - Fernanda também me cumprimenta.
- Mãe, o pai tem consulta hoje? – Questiono minha mãe, meu pai ainda segue fazendo acompanhamento para melhora de suas condições físicas.
- Hoje não filha, o médico mudou as consultas para a cada 15 dias agora. – Ela diz.
- Ah sim, é por que tenho que comprar algumas latas de tinta hoje no centro, depois que sair do trabalho, então vou chegar mais tarde.
- Não tem problema filha, pode ir. Aproveita pra se distrair um pouco você vive para casa e trabalho Flora, precisa aproveitar a vida como uma menina da sua idade , você tem apenas 21 anos precisa conhecer alguém, namorar...- Ela diz de um jeito meigo que só minha mãe tem, então Fernanda se intromete.
- Ih! Mãe já falei pra ela, daqui a pouco Felícia está passando a perna nela. – Olho para ela irada e reviro os olhos para cima. Meu pai , Fefe e Flávia ficam nos observando discutir.
- Mãe, eu estou bem do jeito que eu estou. Não preciso de ninguém mais na minha vida, para me dar trabalho já basta Fernanda.
- Eita que sobrou pra mim agora, olha aqui Flora se você está falando daquele cara da loja, a culpa nem foi minha, eu tentei de verdade não dar bola para as sandices dele ... - Ela diz como uma cara de santa que até o padre acreditaria.
- Fernanda, precisava ter dado um chute nas partes íntimas do cara. Pelo amor de Deus! Ele era cliente da loja do seu Zé ! - Falo num tom meio debochado com vontade rir da situação.
- Ele foi um sem noção irmã, insistindo que eu saísse com ele, todo meloso me chamando de "Lindinha, Florzinha ", e eu nem bati de verdade, eu só falei que arrancaria as bolas dele se ele me enchesse o saco de novo, ele que ficou se cagando de medo e já correu fazer fofoca pro seu Zé ...- Ela diz dando com ombros como se não fosse nada demais, e eu e mamãe rimos por que essa é Fernanda sendo Fernanda, destemida, corajosa e não baixa a bola pra ninguém.
- Mamãe, por que Nanda queria arrancar as bolas do moço? Bolas são muito caras, meu amiguinho Arthur perdeu a dele de futebol e ficou desesperado imagina esse senhor coitado perder mais de uma - Felícia diz do jeitinho inocente num tom bem preocupado e eu estou realmente segurando o riso agora. Mamãe olha pra ela com uma cara horrorizada, papai balança a cabeça negativamente bem devagar e solta alguns resmungos. Flávia está concentrada comendo e já nem liga mais para nossa conversa. E Nanda dá com ombros na maior cara de pau.
- A culpa não foi minha, e ele quase perdeu as bolas por ser chato e insistente Felícia, eu só resolvi o problema, nem foi nada, ele que é um chorão - Mamãe tapa os ouvidos de Fefe e da um olhar de repreensão em Nanda.
- Sim! Mas não gritando para os quatro ventos no meio da loja lotada que arrancaria as...Bom você sabe o que neh Nanda! - Digo e erguendo a sobrancelha e dando uma risadinha.
- Que seja , já consegui outro emprego, graças a Deus, no pub pelo menos eu só atendo as mesas. - Ela diz me dando uma piscadinha.
- Ok, só não vai querer chutar as bolas de ninguém lá também! - Digo rindo e levando a mão na boca por que esqueci da Fefe na mesa, Nanda revira os olhos de forma dramática
- Bom! Chega desse assunto neh. Eu vou trabalhar por que dona Olga está me esperando.- Término meu café dou um beijo em todos eles e sigo até a casa da minha chefe.
Chego a casa de dona Olga e ela me dá um sorriso e um abraço acolhedor, tem sido assim desde que comecei a trabalhar com ela. Sou sua companheira, ela me contratou pois mora sozinha e já é de idade, seus filhos moram em outra cidade e ela não quis largar a casa e ir morar com um deles na cidade grande. Conheci ela através do seu Pedro dono da barraca na feirinha onde meus quadros ficam em exposição, ele soube que eu estava procurando serviço e me apresentou a Olga, desde então nós nos tornamos grandes amigas, eu faço companhia nas suas manhãs e parte da tarde, dirijo e a levo a onde ela precisa. Apesar de ter muitos empregados dona Olga queria uma companheira, ela se tornou uma pessoa muito especial em minha vida e criamos uma amizade forte e bonita.
- Olá minha querida, como está hoje ?- Ela me questiona.
- Tudo bem, e a senhora como amanheceu ?- Digo tocando suas mãos num gesto de carinho e lhe dando um sorriso.
- Bem minha filha, nessa idade a gente sempre está bem e só quer descansar. E Seus pais como estão ?
- Estão bem dona Olga, papai daquele jeito recluso... Mamãe reclamando que não tenho vida social..- Digo dando a ela um sorrisinho.
- Sabe minha filha eu entendo sua mãe, também acho que você deve sair mais. Ho minha querida você é tão linda, uma mulher extraordinária mas vive reclusa perdida no meio das suas tintas e desenhos. A vida é mais que isso Flora.
- Eu sei disso dona Olga, mas eu simplesmente não sei por onde começar...
- Comece deixando as pessoas entrarem querida sem medo de arriscar...- Ela diz passando a palma da mão no meu rosto e fazendo um carinho. Dou um sorriso singelo e aceno com a cabeça, confusa com meus próprios pensamentos.
O dia passa voando e quando vejo já está na hora de ir embora, como dona Olga precisava ir ao centro da cidade aproveitei que fui levar ela e já encomendei as tintas que precisava para terminar as encomendas no final de semana. Chego em casa e vou para área externa, lá me perco nos meus desenhos e nas minhas tintas me pego refletindo sobre tudo que conversei com Olga durante a tarde e se isso realmente me faria bem, deixar as pessoas entrarem, sem medo ou receios, porém sem achar uma resposta ou solução, volto a me concentrar na tela em branco a minha frente, molhando o pincel na lata de tinta e dando pinceladas leves e alternando entre cores e traços finos e grossos, me perco novamente no meu mundo confortável.
***
// GUILHERMO //
A semana passou voando e o dia da viagem, chegou. Estou no meu apartamento terminando de ajeitar minha mala quando vejo uma mensagem de Raissa.
"Boa viagem chefinho gostoso"
Respondo lhe enviando uma carinha emoji piscando. Acabamos dormindo juntos novamente, foi durante a semana quando ela me ligou dizendo que precisava falar urgente comigo. Fui até sua casa e assim que toquei a campainha do seu apartamento ela abriu a porta somente de calcinha de renda e sutiã preto. Ela me beijou e uma coisa levou a outra e acabamos dormindo juntos novamente, porém no outro dia conversei novamente com ela, dizendo que não queria magoá-la e que eu não estava aberto para ter um relacionamento no momento, que achava melhor seguirmos só amigos, ela concordou, dizendo que tudo bem e que poderíamos ser amigos de " Foda ou não" nas palavras dela e que tudo tinha sido apenas sexo casual.
Olhando pro meu celular novamente vejo que recebi mais uma mensagem, dessa vez é do grupo "Os três mosqueteiros" grupo Ricardo fez para falarmos sobre a viagem.
Rick: "E ai, estão prontos? Caio cadê você que não chega"
Caio: "Já estou quase saindo de casa."
Eu: "Tô terminando de ajeitar minhas malas ainda."
Rick: "Porra Gui! Vai levar quantas malas caralho, é uma menininha mesmo"
Eu: "Ah Rick, vá se foder. Quer que eu passe 10 dias com a mesma roupa."
Rick: "E você Caio, que caralho de demora é esta, está com alguma gatinha aí é isso"
Caio: "Acabei de chegar no seu prédio seu otário!"
Eu: "rsrsrs"
Fico rindo por que meus amigos são muitos loucos e essa viagem promete, não demora muito e recebo mais uma mensagem no grupo.
Caio e Ricardo respondem que já estão quase saindo de casa. Caio não iria na viagem porém seus pais tiveram uma viagem em cima da hora e ele acabou se juntando conosco na viagem. Por isso Ricardo teve a ideia brilhante de fazer um grupo e colocar o nome de" Os três mosqueteiros". Mando mensagem para eles dizendo que estou pronto e eles respondem que já saíram de casa e estão chegando aqui .
Vamos todos viajar no meu carro, não vejo hora de chegar no nosso destino e aproveitar a tranquilidade e beleza de uma cidade pitoresca. Aguardo uns 20 minutos e Ricardo e Caio chegam, guardamos as malas no carro e quando já estamos todos acomodados, Rick que irá dirigindo fala:
- Bora Rapaziada, pé na estrada que Morretes nos aguarda! Um por todos e todos por um! - Ele diz levantando um dos braço pra cima como se estivesse empunhando uma espada. Damos risada do jeito dele, ligamos o som e partimos rumo ao nosso destino, tenho certeza que esta viagem será incrível.