Capítulo 8 Alexia narrando

Ao escutar o despertador tocar, me inclinei um pouco e o desliguei. Mesmo sem vontade alguma, me sentei na cama e pude notar o sol tentando entrar por detrás das cortinas.

Eu estou tão cansada.

Me levantei e fui caminhando lentamente em direção ao banheiro. Tenho que pelo menos fingir que estou bem.

(...)

Após tomar um bom banho, fui em direção ao primeiro andar. Por que é que a casa está tão silenciosa assim?

Fui até a cozinha e peguei o galão de leite na geladeira.

-Bom dia, Alexia. Deixa que eu preparo o seu café. -Disse Donna, nossa governanta.

Ela foi contratada por Charlotte há alguns meses. Não gostei muito da ideia no começo, mas assim que a conheci, já me simpatizei logo de cara. Donna é uma senhora de 50 e poucos anos. Ela é bem mais baixa do que eu e seus cabelos são tão pretos quanto o carvão.

-Tá tudo bem, Donna. Eu mesma preparo.

-Sabe que não posso deixá-la fazer isso. -Veio até mim. -Charlotte com certeza me mandaria embora se te pegasse fazendo alguma coisa enquanto eu fico parada com os braços cruzados.

Coloquei o galão de leite em cima do balcão e fui até o armário, onde peguei uma caneca.

-Sim, tem razão. -Falei enquanto despejava o leite na caneca. -Então você pode... -Pensei um pouco. -você pode preparar um sanduíche pra mim.

-Muito bem. -Sorriu. -Vai ficar pronto em um minuto.

Donna foi até a geladeira e começou a retirar os ingredientes necessários. Me sentei em cima do balcão e comecei a tomar o leite.

-Não está achando tudo muito quieto?

-O senhor Gomes teve que sair nessa madrugada. Tinha uma viagem a negócios.

-A negócios? -Perguntei. -Mas ele nem me falou nada.

-Foi tudo de última hora. -Cortou o tomate. -Pelo que eu pude escutar enquanto ele estava em ligação, teve que ir parar Londres o mais rápido possível. Tem alguma coisa a ver com umas peças de roupas que não foram entregues conforme foi pedido.

Bebi mais um pouco do leite.

-Londres. -Sorri. -Lá é tão lindo, Donna. Queria poder ter a oportunidade de ir até lá mais uma vez.

-Por que é que não está na escola ainda, Alexia? -Olhei para a entrada da cozinha e vi Charlotte encostada com os braços cruzados.

Ela ainda está com o seu roupão de seda que deve ter custado uma fortuna. Seus cabelos estão amarrados em um rabo de cavalo e seu rosto está intacto, como se ela sequer tivesse dormido durante a noite.

Mas também, com esse tanto de plástica...

Tive vontade de sorrir com esse pensamento.

-Sabia que papai foi viajar? -Perguntei enquanto bebia os últimos goles do leite.

-Não me surpreende. -Descruzou os braços. -De qualquer forma, quero que você me prepare um café bem fresquinho. -Se dirigiu a Donna. -Ah, e a minha banheira também. Estarei lá em cima esperando.

-Sim, senhora.

Charlotte saiu e Donna olhou pra mim, como se estivesse pedindo para eu terminar o sanduíche por ela.

-Vai lá. -Sorri pra ela.

-Obrigada. -Sussurrou e saiu as pressas atrás de Charlotte.

Me levantei do balcão e coloquei a caneca na pia. Em seguida fui até o sanduíche e coloquei o peito de peru, o fechando logo depois. Coloquei um plástico ao seu redor e fui até o meu quarto.

Nem estou mais com tanta fome, vou levar ele pra escola.

(...)

Eu quase me esqueci que hoje é o aniversário de amizade meu e do Jake. Tenho que comprar alguma lembrancinha. Mas o que?

Acho que se eu for no centro da cidade, tenho mais chances de encontrar algo que ele goste.

Peguei um metrô que para exatamente na rua das principais lojinhas daqui e desci.

-Olá. -Uma moça de cabelo colorido veio em minha direção. -Posso ajuda-la?

Olhei para o seu crachá e vi seu nome. Stéfany.

-Sim, na verdade. -Olhei ao redor. -Eu estou querendo comprar um presente para o meu melhor amigo mas não faço ideia do que. -Voltei minha atenção para ela e sorri levemente.

-Então você veio no lugar certo. -Ela se virou, e apontou para outro cômodo. -Poderia me acompanhar, por favor?

Começamos a caminhar até lá e consegui ver diversas coisas. Desde camisetas de séries, canecas, livros, histórias em quadrinho e etc.

-Poderia me dizer do que ele mais gosta?

Essa é a questão. Jake gosta de muitas coisas. Chega a ser difícil ter que decidir qual é o seu favorito.

-Bom... -Comecei. -Ele assiste bastante coisa relacionada a carros e também ama filmes de terror.

-Mais alguma coisa? -Perguntou enquanto ia em direção ao balcão.

-Ele também é viciado em uma série chamada The Walking Dead. -Peguei algumas das camisetas que estão penduradas no cabideiro.

-Bom, eu tenho algumas coisinhas aqui com esse tema. Veja só. -Voltei minha atenção para ela e a vi se abaixando, provavelmente para pegar objetos que estão debaixo do balcão. -Essa camiseta aqui está se esgotando todos os dias. -Me mostrou uma na qual aparece o personagem Rick bem grande na parte da frente e logo abaixo estão os outros integrantes do grupo.

-É muito bonita. -Toquei nela e virei o papelzinho para poder ver o preço. -Mas será que teria mais alguma coisa para poder completar?

-Nós podemos fazer um porta retrato com algumas fotos de vocês dois. Aposto que ele vai adorar. -Sorriu, deixando a mostra seu aparelho nos dentes.

-Sim, ótima ideia.

-Então eu já vou indo lá para preparar, fique à vontade, viu? -Saiu de trás do balcão e começou a ir para a frente da loja.

-Obrigada. -Falei e voltei a olhar ao redor.

Qualquer pessoa viciada em personagens iria adorar esse lugar.

-Ah, perdão, me esqueci de perguntar se você possui as fotos aí com você.

Droga, estou sem celular.

-Ahn... -Pensei. -Eu tenho algumas no meu Instagram, se não for problema.

-De forma alguma. Volto em um segundo.

(...)

Apesar de ter chegado um pouco atrasada na escola, ainda consegui entrar e assisti algumas aulas. Ainda não vi Jake, mas estou indo para o lugar que sempre ficamos. Embaixo de uma árvore próxima do pequeno campo que os meninos do time aproveitam pra ficar jogando futebol americano.

O que na verdade é bem errado. Levando em consideração que o esporte praticado por nossa escola é o basquete.

Enquanto ele não vinha, aproveitei para escrever uma pequena carta. Nós dois sempre amamos cartas. E lamentamos quase que diariamente por não termos nascido na época que a carta era mais "valorizada".

-Olha só, até o seu amiguinho já se cansou de você, Alexia?

Respirei fundo ao escutar a voz de Clair. Ergui meu olhar para ela e notei suas duas amigas logo ao seu lado.

-Pelo visto a coitada vai ficar sozinha o restante do ano letivo. -Acrescentou Alysson.

-Mas não se preocupa não, viu fofa? Logo logo você se acostuma.

As três riram e eu desviei meu olhar delas. Mesmo sem perceber, meus olhos foram em direção aos caras jogando futebol americano. Onde encontrei Zack derrubando um de seus oponentes no chão. Logo em seguida ambos começaram a rir.

Acredito que Clair deve ter visto para onde eu estava olhando, já que ela gritou o nome de Zack em seguida. Ele olhou para cá e eu rapidamente desviei minha atenção para outra coisa.

-Você está um gato assim todo suado, meu amor. -Ela gritou.

Argh.

-Vejo você depois, né? -Perguntou em seguida.

-É claro, princesa. -Zack respondeu.

Não pude evitar de olhar para lá mais uma vez e o encontrei com os cabelos molhados virado para nós. Só que o que eu não esperava era que ele retribuiria o olhar. Ele sorriu ao perceber a mesma coisa e logo voltou a jogar.

Quando voltei minha atenção para as três novamente, vi Clair me encarando de cima a baixo.

-Você viu ele sorrindo pra ela? -Perguntou Alysson.

-É Clair, eu também vi. -Falou a outra que eu nunca me lembro o nome.

Clair se aproximou um pouco mais de mim e chutou minha mochila.

-Escuta aqui, sua nerdzinha de merda. -Arqueou uma sobrancelha tentando passar superioridade. -Você não tem uma chance sequer com ele, me entendeu? Então se eu ver você dando em cima dele, você está encrencada.

Sorri e isso parece ter lhe irritado mais ainda.

-Não se preocupe quanto a isso, Clair. Zack não faz o meu tipo.

Dessa vez foi ela que sorriu, só que de forma irônica.

-Eu espero mesmo. -Se virou para suas amigas. -Agora vamos, já me enjoei da cara dessa idiota.

Clair saiu andando e as duas foram logo atrás.

-Ah, oi.

Virei minha cabeça na direção de Jake e sorri feliz de finalmente o ver.

-Chegou faz tempo? -Perguntou enquanto retirava sua mochila das costas.

-Um pouquinho. -Respondi enquanto ele se sentava. -E eu tenho um presente pra você. Espera aí. -Peguei minha mochila e a abri, retirando de lá de dentro a caixa com os presentes dentro.

-Eu espero que goste. -Guardei rapidamente a carta lá dentro e o entreguei.

Jake pegou a caixa de minha mão e sorriu enquanto retirava a tampa.

-Você escreveu mesmo uma carta pra mim? -Sorriu enquanto a pegava.

-Escrevi. Mas eu quero que você leia quando estiver sozinho, e não aqui agora.

-Tá, tudo bem. -Retirou a próxima coisa. -Alexia. -Sorriu e virou o porta retrato para mim. -Esse dia...

-Sim. -Sorri me lembrando. -Tínhamos 12 anos.

-E você ainda tinha franja. -Tentou segurar a risada.

-Ei. Mais respeito pela minha franjinha, por favor. -Bati em seu braço. -Eu gostava dela.

-Mas convenhamos que você ficou muito mais bonita assim, sem ela. -Piscou um olho para mim.

-Idiota. -Ri. -Vai logo para a outra coisa.

Ele me obedeceu e retirou o último presente. A camiseta.

-Não acredito que você foi capaz de fazer isso. -Virou a camiseta para mim. -Como não se lembrou de que eu sou team Negan!?

-Ah, meu Deus. -Tampei a boca. -É verdade. -Tentei não rir.

-Que ótima melhor amiga que eu fui arranjar, viu? -Fingiu estar desapontado. -Mas eu vou deixar essa passar porque eu também tenho um presente pra você.

Colocou a caixa ao seu lado e pegou uma pequena caixinha em sua mochila. Ele a abriu e entregou para mim. É um colar com um pequeno pássaro como pingente.

Ele se lembrou de como eu amo a trilogia de livros de A seleção. Esse pássaro representa os rebeldes do norte.

-Jake. -Sorri e peguei o colar de sua mão. -Isso é... -Não consegui encontrar as palavras certas. -Obrigada.

-Vem, deixa eu colocar em você.

O entreguei e me virei de costas, levantando o cabelo.

-Tenho que confessar que não entendo muito bem o significado desse pássaro pra você, mas imaginei que ia gostar.

-E acertou em cheio. -Sorri. -Eu amei.

O som do sino tocando nos assustou e tivemos que voltar para a sala. Só que no meio do caminho acabei me batendo contra alguém.