- É o último mês - Raf falou com animação, empurrando levemente os ombros dela. - O pessoal está planejando uma viagem para Cancun como formatura. Eu já confirmei sua presença.
- Não, Raf - ela reclamou, franzindo o cenho. - Você sabe que mal falo com eles.
- É o nosso último ano - ele disse, ainda na tentativa de convencê-la. - Talvez nunca mais vejamos algumas pessoas. A Emma, por exemplo, está pensando em se mudar para a Itália e ficar perto dos avós.
- Eu tenho certeza que eles não darão falta da minha presença.
- Mas eu quero você lá.
Cassie olhou para ele e viu o brilho em seus olhos. Raf era uma das pessoas pessoas, se não a única, que se importava verdadeiramente com ela e almejava a sua presença. Ela não poderia deixar um amigo sozinho nessa viagem, precisava fazer esse sacrifício por ele.
- Não sei - falou, passando pelas enormes portas da saída. - Vou pensar.
- Você sempre fala isso e me dá um bolo.
- Dessa vez é verdade, eu vou tentar. - Entrelaçou seu braço no dele e desceu as pequenas escadas para fora da universidade. - Você sabe que eu não sou como eles, não tenho pais ricos e meu único salário é de garçonete, que não sobra quase nada. Não sei se vou ter como bancar uma viagem da classe deles.
- Eu pagaria para você - ele sugeriu com um sorriso, retomando suas esperanças.
- Ah, qual é, Raf? Eu sei que você é meu amigo, mas não posso deixar você pagar uma viagem dessas para mim. É muito caro.
- Por que não? Meus pais são ricos, eles não vão se importar, nem vão se dar conta, na verdade.
Era exatamente por isso que ela não queria. Ela sabia que Raf poderia pagar sem problemas, mas não queria ficar em dívida com ninguém, ainda mais uma dívida grande como essa e com pessoas que não tinha tanta intimidade.
- Vamos fazer assim, eu vou fazer um esforço para tentar ir nessa viagem, ok? - Ela segurou os braços dele com um sorriso.
- Tudo bem. - Ele sorriu, revirando os olhos sem opção. - Quer carona para o trabalho?
- Quero... - Cassie se virou para frente com o sorriso ainda em lábios, então seu corpo paralisou no lugar e desfez o sorriso instantaneamente. - Na verdade, não. Eu vou andando mesmo.
- Cassie, tudo bem?
- Tudo, sim - respondeu, jogando um beijo no ar para ele. - Te vejo amanhã.
Cassie deixou Raf sem entender o que acontecia e saiu em passos largos, quase correndo pela rua movimentada na esperança de chegar logo no trabalho que era próximo dali.
- Cassiopeia! - A voz grossa e familiar gritou, a fazendo parar imediatamente no lugar com o susto.
- O que você quer? - Ela se virou para ele, sentindo sua cabeça doer só de vê-lo em sua frente novamente. - Eu disse para nunca mais me procurar!
- Eu gostaria que fosse simples assim, mas temos um acordo e os anjos estão planejando outro ataque.
- Isso é problema seu.
- Não sei se esqueceu, mas está na mira deles também. Você está bem na ponta da espada de Miguel e ele não vai parar até matá-la.
- Bom, se houver mesmo um contato como você diz, é só desfazê-lo. Você mesmo disse isso é possível.
- É possível, mas não é fácil. Talvez traga a sua morte. - Ele se aproximou, diminuindo o tom de voz. - Vamos para outro lugar. Você está parecendo uma louca gritando no meio da rua, eles não podem me ver.
Cassie olhou envolta e realmente algumas pessoas curiosas a olhavam como se estivesse doida, tentando entender o que eu estava fazendo.
- Vamos para minha casa - falou por fim, tentando se convencer de que não era uma péssima ideia. - Mas a conversa terá que ser breve, preciso trabalhar.
(•••)
Assim que os dois saíram do elevador no décimo primeiro andar, Cassie sentiu que havia algo errado. A porta estava entreaberta, com arranhões na madeira e, quando ela abriu a porta, se deparou com móveis jogados no chão e coisas quebradas por toda parte.
- Não! - Ela colocou as mãos sobre a boca sem reação. - Será que roubaram algo?
- Espera. - Sky a puxou para trás de si, então entrou primeiro, verificando se não havia mais ninguém. - Não foram ladrões, foram os anjos.
- Sky, por favor...
- Nossa ligação está ficando mais forte, eu sinto isso. Meu sangue manchou a espada de Miguel, então ele pode me encontrar em qualquer lugar, assim como pode encontrar você também.
E tudo só piorava a cada palavra dita. Quando o assunto era Sky ou qualquer um que estivesse ligado a ele, era sem sombras de dúvidas um atestado de óbito e uma lista com vários problemas.
- Plutão! - Cassie chamou, tentando evitar as lágrimas. - Aonde você está?
- Quem é Plutão? - Sky questionou, a ajudado vasculhar as bagunças mesmo sem saber o que procurava.
- Meu gato - respondeu rapidamente, limpando as lágrimas que caiam de preocupação.
- Serve esse?
Ela virou para olhá-lo e soltou um suspiro aliviado ao ver Plutão nos braços de Sky.
- Obrigado. - Pegou o gatinho preto das mãos dele e acariciou sua cabeça com cuidado.
- Você estava chorando por causa de um gato? - O olhar de Sky era incrédulo.
- Eu só tenho ele na minha vida - respondeu, fechando os olhos ao encostar o rosto na cabeça de Plutão.
- E sua família?
- Minha mãe morreu quando eu era criança e cresci em um orfanato. Sem parentes próximos.
- E aquele garoto da faculdade não é seu namorado?
- Não. - Ela balançou a cabeça negativamente, como se ele tivesse dito uma piada. - O Raf é só meu amigo.
- Você disse isso a ele?
- Ele sabe. - Cassie franziu o cenho, tentando entender o que aquilo significava.
- Voltando ao que realmente importa, você precisa vir comigo agora.
- O quê?
- É isso mesmo. Enquanto você tiver um acordo comigo, estará em risco e eu não posso te proteger em território humano comandado por anjos.
- Você e aquele outro são loucos. Eu não posso largar minha vida assim.
- Você pode morrer, então. Mas eu garanto que seu nome não estará na lista da entrada do céu.
Ela ficou em silêncio, sem esperanças sobre mudar de ideia.
- Tudo bem, Cassiopeia, me escute - ele continuou com seriedade, indo até ela. - Você não queria que aquilo acontecesse, eu também não queria estar em um acordo com você, acredite, mas aconteceu por algum motivo e agora precisamos dançar conforme a música. Existe muito mais que apenas um acordo entre um demônio e uma humana.
- Não vou mudar de ideia, Sky.
- O contrato não pode ser desfeito a menos que faça um desejo e que esse desejo seja cumprido.
- Você é tipo um gênio da lâmpada?
- Quase isso. A diferença é que você tem apenas um desejo e não três.
- Bom, se é a única forma de acabar com isso, eu aceito. Depois eu volto para a minha vida completamente normal.
Sky sorriu com alívio e colocou as mãos na cintura, olhando envolta. Algo a dizia que havia muito mais do que o que ele estava dizendo e o olhar dele era preocupado, não só pelo presente mas pelo futuro também.
- Eu já falei com o seu chefe e disse que sou um parente próximo que precisa de alguém que fique com uma tia doente - ele disse, indo até a janela e abrindo a mesma com força. - Ele vai pagar um adiantamento pelas três semanas.
- Você me demitiu? - Ela quase gritou em surpresa.
- Sim.
- Não pode fazer isso! Eu preciso daquele emprego!
- Se for esperta, vai descobrir que não precisa. As lendas de famosos que ficaram ricos após fazerem pactos não são só lendas. Você pode ter o que quiser, Cassiopeia.
A ideia era tentadora. Saindo dos lábios de Sky parecia algo mais proibido ainda, o que fazia Cassie ter mais vontade de fazê-lo. Ele, com toda certeza, sabia como manipular alguém e ela precisava tomar muito cuidado com suas ofertas tentadoras e o preço que teria pagar por isso.
Sky tirou um livro antigo feito de couro de dentro do blazer perfeitamente passado, então entregou a ela com relutância.
- O que é isso? - Ela questionou, passando as pontas dos dedos pela capa de couro.
- É o livro dos demônios, aí tem tudo o que você precisa saber - ele respondeu com os olhos fixos nela. - Ele é muito poderoso, Cassiopeia. Ele não contém só informações sobre os acordos, ele possui feitiços e até o portal para o Pandemonium.
De repente, aquele livro havia se tornado mais pesado do que era. Cassie sabia que uma responsabilidade daquele tamanho seria perigoso, ela nem sabia se conseguiria guardar aquilo. O nome "livro dos acordos", era bonito e muito valioso.
- Não sei se posso guardar isso, Sky - ela disse, estendendo o livro a ele novamente.
- Eu sei que pode. - Ele se aproximou e colocou as mãos nos ombros dela. - Esse livro possui todos os nossos segredos, a nossa casa, a minha vida... estou entregando tudo nas suas mãos. Consegue fazer isso?
E mais uma vez, tudo piorava.
- Se os anjos vierem atrás de mim, vão me matar por isso. Não vou poder guardar isso morta.
- Quanto a isso, não precisa se preocupar - ele assegurou com um sorriso. - Ninguém vai tocar em você enquanto estivermos juntos nessa.
- Está bem - Cassie concordou com um sorriso. - Vou guardá-lo com a minha vida.
- E eu vou te proteger com a minha.
Sky soltou Cassie e limpou a garganta, percebendo que segurou os ombros dela por muito mais tempo do que planejava, então sentou no chão e esperou que ela fizesse o mesmo.
- Vamos? - Ele perguntou.
- Eu preciso levar algumas roupas.
- Você tem tudo o que precisa lá.
- Tudo bem, mas o Plutão vem comigo.
- Sem problemas. Eu até que gosto de gatos.
Então Cassie se sentou no chão em frente a ele e colocou Plutão em seu colo, ainda segurando o livro.
- Você precisa ler esse feitiço de conjuração enquanto segura as minhas mãos - ele explicou, abrindo o livro na página certa.
Sky deixou o livro no chão e Cassie passou os olhos por cada palavra em latim escrita nele. Ela tinha medo de dizer aquelas palavras que não conhecia em voz alta porque sabia as histórias que contavam sobre demônios, mas o toque quente das mãos de Sky fez ela acreditar que não precisava temer nada, então recitou as frases em voz alta.