/0/2841/coverbig.jpg?v=d5fbc0fda8a94b5f9d021c8f15e5b49e)
Eu estava exausta quando cheguei ao meu apartamento. O meu corpo fedia a cigarros e a bebida barata, mal conseguia andar devido às dores que sentia nas minhas partes íntimas. Muitos clientes pensavam que foder forte era sinónimo de foder bem. Céus! Como eu estava ansiando por um banho e algumas horas de sono antes de ter que voltar para a batalha. Mas como se um flash tivesse se acendido na minha cabeça eu acabei-me lembrando do pequeno objeto de couro que estava enfiando entre as bagunças do interior da minha bolsa.
Soltei um suspiro frustrado e despejei todas as minhas coisas na cama, vendo a carteira do velho que me rejeitou e perto do meu batom o seu cartão de visitas. Ele havia deixado cair a carteira no estacionamento, dentro haviam cartões de crédito, uma grande quantia em dinheiro, que para mim era muito, mas provavelmente não passavam de trocados para aquele fidalgo idiota, carta de motorista, documento de identidade e algumas fotografias.
No cartão de visitas tinha o endereço da sua empresa, eu tinha de entregá-lo a carteira antes que pensasse que eu roubei e acabassem-me jogando no xadrez.
Além de puta, ter mais de um cadastro na polícia, era só o que me faltava. Se bem que um roubo de carteira não chegava nem perto do crime hediondo que eu havia cometido.
Entrei no pequeno banheiro e soltei um xingamento ao ligar o chuveiro e sentir a água escaldante queimando à minha pele.
__Merda! Merda! Merda!
A minha pele estava ardendo quando abandonei o box, xingando o senhorio dos nomes mais feios possíveis. Ele vivia enchendo o meu saco e ameaçando-me sobre aumentar o valor da renda desse apartamento decadente, todavia não movia sequer um dedo para melhor as condições dessa merda de prédio.
Vesti o meu pijama e joguei-me na cama, como era bom sentir o meu corpo relaxando.
Acordei horas mais tarde, sentindo à minha barriga doendo de tanta fome. Levantei-me e segui até a cozinha separada do quarto por uma simples cortina. Preparei um miojo e vi que ainda dava tempo de levar a carteira antes de preparar-me para a batalha.
Peguei o cartão e disquei o número estampado no rodapé. Hector Menezes. Era o nome do sujeito que se achava bom de mais para mim. Uma voz robótica tirou-me do transe em que eu submergi, sentei-me na borda da cama e apresentei-me após ter percebido que se tratava de uma pessoa.
__O meu nome é Boca louca. Eu quero falar com o seu chefe, diga-lhe que é urgente.
A linha ficou muda por longos segundos, a seguir um suspiro exasperado foi ouvido.
__O senhor Hector Menezes está muito ocupado, não tem tempo para dar atenção a mulheres do seu nível. Não volte a ligar para aqui.
Dito isso desligou na minha cara. Porra! Que vadia desgraçada, quem me dera estar cara a cara com ela para arrancar os seus malditos olhos.
Eu deveria apenas entregar a carteira ao Billy e mandar aquele velho ir se foder, mas eu estava com ânsia de dar um murro no seu maldito rosto. Por isso que ele me deu o seu cartão? Para que eu fosse humilhada?
Tirei do guarda-roupa um vestido dourado, justo e decotado. Cobri a minha cabeleira com a peruca loira e calcei às minhas botas, caprichei na maquiagem para atenuar a cara de ressaca e o fato de ter dormido tanto.
Quando abandonei o prédio recebi uma onda de assobios e comentários maliciosos por parte dos homens e olhares julgadores e invejosos de algumas mulheres. Eu adorava toda aquela atenção que recebia.
A empresa ficava na zona comercial da cidade. Aquilo era como atravessar um portal. De um lado tínhamos a periferia, o lugar inóspito para os fidalgos, onde viviam apenas os miseráveis, os leprosos, os marginais e as prostitutas. Tudo o que a sociedade desprezava. No mundo deles tudo era mais bonito e bem organizado, as crianças já andavam com aquele "Q" de prepotência. Já sabiam que do outro lado era o inferno.
E era muito fácil discernirmos quando alguém era do outro lado, como se andássemos com chips implantados na testa.
Ignorei todos aqueles olhares que iam da lascívia à censura. A empresa de Hector Menezes ficava num edifício de trinta andares, era imponente, espelhado e reluzente como o ouro banhado em sol. A entrada tinha portas giratórias gigantes que faziam com que os homens e mulheres vestindo terno que passavam por eu parecessem minisseres humanos.
Confesso que tudo aquilo era intimidador. Senti-me um inseto pequeno e maldito numa metrópole, prestes a ser esmagado por pés gigantes. Céus! Aquilo parecia ser uma grande loucura, eu estava acostumada ao cenário vagabundo do meu mundo.
Ergui a cabeça e avancei com confiança, mas antes que pudesse passar pelas portas giratórias dois homens grandes trajados em ternos pretos e óculos escuros interpelaram-me.
__Aonde vai?
O homem negro com a cabeça raspada indagou, avaliando-me de cima a baixo com o cenho franzido.
__Eu vou ter com o senhor Hector Menezes. Tenho algo que o pertence e tem de ser entregue pessoalmente.
Os dois homens entreolharam-se com suspeita.
__Passe os credenciais.
Eu arregalei os olhos, nervosa, e peguei à minha carteira com estampa de Zebra. Mostrei-lhes com enfado. Avaliaram o documento de identidade e depois olharam para mim.
__Aqui está!
Recebi o documento de volta bruscamente e adentrei o edifício. O interior era frio, homens de terno saíam e entravam de um elevador perto de uma bancada de mármore. Atrás da bancada estavam duas mulheres e um homem, aproximei-me e esperei que as pessoas que estavam à minha frente fossem atendidas antes de chegar à minha vez.
__Boa tarde senhora. Eu vim ter com o senhor Hector Menezes.
As três pessoas que estavam atrás da bancada olharem-me de baixo para cima e a seguir adotaram uma postura empafiada.
__Qual é o seu nome?
A mulher à minha frente indagou com frieza e voltou o seu olhar para a tela do Mac como se eu fosse um ser indigno de receber à sua atenção.
__Diga a ele que é a Boca louca.
Os três voltaram a encarar-me. As suas expressões de horror quase fizeram-me soltar uma gargalhada.
__Sente-se aí senhora. Vou anunciá-la a secretária do senhor Menezes.
Eu assenti e sentei-me numa poltrona de veludo disposta em torno de uma mesinha de centro onde repousavam revistas. Fiquei apreciando as pessoas, algumas delas olhavam de volta para mim com curiosidade, e outras passavam simplesmente, demasiado apressadas com os seus telefones caros presos aos ouvidos e valises de couro.
__O senhor Menezes está muito ocupado com uma reunião senhora. Tem algum recado?
Ela perguntou após ter-me deixado à espera durante trinta minutos. Larguei a revista que falava sobre apostar na bolsa de valores ser um ótimo investimento e fitei-a com o cenho franzido.
__Foi o senhor Hector quem me pediu para contactá-lo.__eu disse com uma careta.__Ele até me deu o seu cartão. Qual é o andar dele?
A mulher retirou os seus óculos de grau e entrelaçou os dedos.
__Eu sinto muito por você. Todos os santos dias o senhor Menezes pega uma mulher diferente. Modelos, actrizes, advogadas, não acho que ele queira perder o seu tempo consigo.
A mulher do seu lado sorriu com escárnio. Eu aproximei-me novamente da bancada e apontei o meu dedo no seu rosto.
__Ouve aqui vadia, eu não pedi os seus conselhos, não estou aqui para mendigar ou foder com aquele velho frouxo. Diga-me agora a porra do andar dele!
Eu havia-me excedido e a prova disso eram as pessoas me olhando com horror.
__Retire-se agora ou vou chamar os seguranças.__ falou entredentes.
__Vai tomar no cú infeliz, vadia mal comida, porca nojenta. Eu vou descobrir o andar dele sem à sua ajuda.
Com o rosto vermelho ela pegou o telefone e em questão de segundos os brutamontes estavam adentrado.
__Soltem-me seus cavalos! Não encostem em mim porra.
Eu fui jogada para fora do edifício como uma cadela sarnenta. Respirei fundo e ajeitei à peruca, olhei para eles com ira.
__Saia logo daqui, por acaso confundiu o caminho do prostíbulo vagabunda?
Eu coloquei as mãos sobre os quadris e sorri para eles. Estava pronta para xingar as mães deles quando quem eu estava procurando abandonou o prédio.
__Hector Menezes!
Eu gritei e o homem olhou para mim atordoado, ele estava andando com outro senhor que me pareceu ser mais jovem do que ele.
__O que está fazendo aqui?
Reconhecimento passou pelo seu rosto. Eu não o respondi, vasculhei a minha bolsa à procura da sua carteira e quando achei joguei-a contra o seu peito.
__Eu espero que você e esse prédio ardam nas profundezas do armagedom. tranquiliza-me bastante o facto de que apesar de vestirem roupas caras, viverem em mansões e comerem caviar são tão podres e vazios quanto essa puta aqui.
Aponto o meu dedo do meio para todos eles e os mando irem se foder. Caralho eu precisava de cigarros e um cliente que soubesse usar bem o seu pinto para aliviar toda aquela tensão e raiva que estava sentindo.