A experiência de ser mãe, naquelas circunstâncias, era algo muito intenso. Saber que dela havia acabado de nascer alguém que em outra realidade tinha sido responsável pela destruição do Universo e, ao mesmo tempo, se afeiçoar àquela pequena e adorável bebê eram sentimentos contraditórios. Elas estavam sozinhas no planeta inteiro e não ter nenhuma perspectiva da chegada de outra vida era particularmente estranho. Isso criava uma proximidade ainda maior entre elas. Aquela linda mulher, de pele alva, cabelos loiro escuro, corpo esbelto, não dependia de alimentação. Já sua filha, sim. Por um tempo, apenas a amamentação foi suficiente, mas aos poucos ela precisava de mais. Percebeu que não nasciam frutos naquele planeta. A vegetação era simples, sem diversidade, ainda. E da mesma forma que Krakor a ensinou na outra Era, ela tentou e conseguiu fazer uma árvore completamente nova brotar da terra. Criou uma horta completa, um jardim e pela primeira vez, as algas que ela também tinha como simbiose e que voltaram a sair de seu corpo. Elas agiram nas plantas aquáticas e geraram pequenos insetos que ajudaram a manter e ampliar a fertilização natural.
Ter as algas verdes e sua outra simbiose, Namos era muito menos solitário e sua filha adorava brincar com eles. Namos era um animal esquisito e ao mesmo tempo encantador. Grande e desajeitado, rolava pelo chão e derrubava a pequenina que era amparada pelo conjunto de algas que voavam pelo ar, não apenas flutuavam nas águas.
E então, ela reaprendeu a voar e pôde conhecer todo o planeta. A estrutura era muito parecida com a que ela já conhecia, o que a deixou confusa.
Ela teria ficado presa muito tempo no espaço? O Planeta já tinha evoluído tanto a ponto de estar parecido com o que ela se lembrava dele? Ou a formação do Universo dessa vez estava seguindo uma lógica diferente?
- Olá, Emma...
A imagem de Athos surgiu à sua frente. Aquele homem de pele amarronzada, de rosto de expressão forte, mas muito bonito.
- É você mesmo ou estou alucinado? - Foi sua pergunta, completamente surpresa.
- Sou eu mesmo. Na verdade não estou de verdade aí. Eu aprendi essa técnica, é uma espécie de projeção astral. Eu consigo enviar minha imagem sem ir para o lugar. Ainda não consegui me teletransportar. - Ele parecia mais forte e mais alto, também. Ainda não estava com suas asas de sua simbiose. Talvez não tivesse tido a mesma sorte que ela.
- Como você me localizou? - Emma perguntou.
- Na verdade não localizei ninguém ainda, nem você... A única pessoa que acabei de sentir a presença foi essa bebê... Sua filha? - Athos parecia estar controlando as palavras.
- Você já sabe quem ela é?
- Você também já sabe?
Ela apenas abaixou a cabeça e olhou para a pequena, tão pura e ingênua.
- Emma, você precisará abandoná-la em breve!
- Eu jamais faria isso, Athos, você deveria saber disso - foi sua resposta sem sequer pensar algo diferente.
- Você não pode ficar. Elaryan é a primeira mulher a nascer no Universo. Sempre foi assim. Mas ela não tem mãe, seu desenvolvimento é primordial na dinâmica dos acontecimentos e se ela tiver uma mãe, se tiver você, não poderemos prever absolutamente nada do que irá acontecer...
- E isso é ruim, Athos? Mudar tudo o que aconteceu seria ruim?
- Você ficar, iria significar não ter nenhuma chance de rever seu marido, de ter seus filhos, de encontrar as mulheres de sua vida, em circunstâncias que permitissem que vocês ficassem juntas.
- Athos, não importa. Eles vão nascer e viver de qualquer forma. De todo modo, não existe nenhuma certeza de que eu possa conviver com eles. - O diálogo prosseguia até que Athos finalizou:
- O que posso te dizer é que se você não fizer isso por bem, você fará por mal! Sinto muito!
- Parece que você se tornou a nova Elaryan nessa realidade... Talvez pior? - Ela ainda disse antes dele desaparecer.
- Filha eu nunca vou te abandonar! Nunca! - Emma a abraçou firme e a pequena sorriu.
Algum tempo se passou e a bebê, que aparentemente tinha um tempo de crescimento muito diferente do que Emma estava acostumada, bem demorado, estava começando a aprender a andar, a entender algumas coisas, a tentar falar.
Ainda existiam muitas dúvidas sobre tudo. Ela lembrou dos seus dois filhos na outra Era. Eles estariam, provavelmente, a milhares de anos ainda de nascerem e não seriam dela. Talvez pudessem ser, se abandonasse a pequena Elaryan sozinha e tentasse simular sua existência na Terra. Isso ainda dependeria de conseguir aprender a se teletransportar.
- Mas se eu fosse, levaria Elaryan comigo... - falou consigo mesma, pensando alto.
- Será que eu posso te ajudar com isso? - Dessa vez quem surgiu veio de um portal. Apesar de diferente, ela reconheceu: era Trovar.
Emma não podia acreditar que ele estava ali, que podia se teletransportar. Sua primeira reação foi abraçá-lo, mas depois se afastou, com receio de ele ter os mesmo interesses de Athos.
- Tudo bem, tudo bem! Digamos que de grandes parceiros, muito alinhados, passamos a ter ideias completamente diferentes. - Trovar disse, como se tivesse lido sua mente. - Eu consegui encontrá-lo e ele queria vir aqui imediatamente. Eu percebi que ele estava diferente. Eu o confrontei, dizendo que ele sempre quis mudar o futuro que conseguia enxergar em suas visões, se fosse para salvar alguém, buscando justiça, mas agora queria manter a ordem das coisas, para que pudesse continuar sabendo como tudo iria acontecer. Eu lhe disse que não concordo. Mas uma coisa é um fato: Elaryan ou Shiva, como ela também foi chamada, é mesmo uma figura importante para toda a história do Universo. Eu gostaria de te sugerir uma simbiose. O que você acharia da ideia de viver por um tempo dentro dela? Você poderia cuidar dela, protegê-la, monitorá-la.
- E por que não posso simplesmente ser mãe dela? - Emma não estava convencida sobre o que ele estava falando.
- Por que Elaryan cresceu sendo a primeira mulher, sozinha, forte, liderando as pessoas. O que eu sei da história dela é que ela nasceu em Néon e morreu num evento catástrofe, com o fim da vida nesse lugar. Milhares morreram. Ela era a Rainha. Depois disso o lugar se tornou um planeta inferno, abrigando mulheres suicidas em sua primeira vida, como foi o seu caso...
- Você está dizendo que se eu for mãe, ela não será a primeira mulher, terá minha influência em sua formação, provavelmente não será Rainha e os acontecimentos seguintes podem ser diferentes?
- Isso mesmo... - Ele respondeu.
- Trovar, depois de tudo isso, gostaria de pedir que você fosse embora! Já tomei minha decisão. Elaryan vai ter uma mãe!
- Emma, sinto muito, não queria que fosse assim. - Ela tinha certeza que algo estava errado, atacou Trovar de todos os lados, manipulando a água por trás dele, criando lâminas de gelo e enviando-as pelos lados, criando vapor fervente por baixo, mas não foi suficiente. Ele fez surgir uma aura negra que o protegeu de todos os ataques e essa mesma aura a sugou, jogando-a dentro de Elaryan. Houve uma explosão e ele desapareceu.
Emma agora era apenas uma expectadora dentro de Elaryan, da pequena Shiva, nome que daria a si mesma, nessa sua primeira jornada, uma das poucas memórias que conseguiria trazer da mente de sua mãe. Mas ela não era mais uma bebê, podia ter consciência disso, apesar de ter acabado deitada e desacordada.