Bianca saiu do Clube sem olhar para trás. Ela estava nervosa e chocada, não esperava encontrá-lo, por isso não soube como reagir. Na calçada, do lado de fora, se deu conta de que não sabia o caminho e nem tinha como voltar para a pensão.
"Por que ele tinha que aparecer agora? Por que não me deixa em paz?"
Bianca levou as duas mãos ao rosto e parou de tentar prender o choro. Esse choro estava dentro do peito preso por tanto tempo, que quando ela finalmente se permitiu, as lágrimas escorriam profusamente. Algumas pessoas passavam por ela, olhando espantados, imaginando qual seria o motivo daquela jovem estar parada sozinha aos prantos. Bianca ouviu passos correndo em sua direção e sentiu alguém colocar uma mão em seu ombro, puxando-a contra o peito.
Ela reconheceu o perfume, o abraço e o calor que lhe fez sentir em casa, segura, como na primeira vez que o sentiu naquela mesma noite. Suas lágrimas molhavam a camisa dele, mas ele não pareceu se importar, pelo contrário, puxou-a ainda mais para junto de si.
Ficaram assim, abraçados no meio da calçada por um tempo, até que Bianca se acalmasse e cessasse choro.
- Você está bem? - Ele perguntou.
Bianca simplesmente fez que sim com a cabeça. Ele se afastou um pouco terminando o abraço em que se encontravam e segurou a mão dela, entrelaçando os dedos.
- O que acha de irmos para outro lugar, mais tranquilo e longe de toda essa gente? - Ele perguntou.
Bianca concordou e os dois seguiram até o estacionamento. Ele abriu a porta para ela e ela se sentou em silêncio. Ele ligou o carro e seguiu caminho para o lugar proposto, lugar esse que Bianca não fazia ideia onde era. Por alguma razão, ela confiava nele, ou talvez estivesse estressada demais para se preocupar. Ela olhava pela janela do carro, observando o céu noturno, não se atrevendo a olhar para ele, embora sentisse claramente o olhar dele em sua direção.
Ela estava nervosa esperando que ele fizesse perguntas que ela não queria responder, pelo menos não agora, mas ele também continuou em silêncio. Quando a olhou, ele percebeu o esforço que ela estava fazendo para evitar contato visual e por conta disso, ele decidiu que aquele não era o momento para perguntas.
Enquanto Eduardo dirigia, ela se perdeu em seus pensamentos e lembranças desagradáveis, não prestando atenção no caminho que ele fazia. Eduardo parou o carro e Bianca olhou em volta, estranhando o lugar.
- Onde estamos, que lugar é esse?
- É um lugar muito especial para mim, que poucos conhecem. Você vai se sentir muito melhor, confie em mim.
Estavam em frente a pequena lanchonete e Bianca pôde perceber que não era uma lanchonete comum, como as que ela conhecia, essa era especial, toda decorada como se estivessem na década de 1950. Assim que entraram, foram saudados por um senhor muito simpático.
- Eduardo! Que bom te ver!
- Olá, senhor Antônio, como estão as coisas?
- Estão bem, graças a Deus! - Respondeu Antônio, que desviou o olhar de Eduardo para Bianca e sorriu. - Pelo visto estão melhores ainda para você... Quem é essa bela jovem?
- Bianca, esse é um grande amigo meu, Antônio; Antônio essa é Bianca, hum... minha amiga.
- Amiga, hein? - Antônio apertou a mão de Bianca e piscou para Eduardo
Antônio os acompanhou até uma mesa no canto. Bianca olhou mais uma vez em volta, admirando o que via e sorriu ao olhar para um pôster na parede, cuja imagem consistia em um carro conversível vermelho com um Bad Boy segurando um cigarro, vestindo jaqueta preta, cabelo lambuzado de brilhantina, ao lado de uma jovem de vestido rosa.
- O que vocês vão pedir? - Perguntou Antônio.
- Eu não sei... - Respondeu Bianca tímida e ainda distraída com a decoração da lanchonete.- O que você sugere? - Ela perguntou a Eduardo.
- Ok... Antônio, nós vamos querer uma pizza grande, metade quatro queijos, metade calabresa e dois refrigerantes.
Antônio anotou os pedidos e se retirou. Havia poucas pessoas lá dentro: um casal que esquecera sua refeição por estar ocupado demais em suas demonstrações públicas de afeto; um grupo de amigos que já estava terminando seu lanche, e um idoso que, por alguma razão desconhecida, considerava que aquela hora da noite era ideal para ler jornal e comer torradas com bacon.
O silêncio entre eles foi quebrado pelo toque do celular de Eduardo, que vibrava no bolso de trás de sua calça.
- Oi... Achei sim... Ela está bem.
Eduardo colocou a mão no celular para abafar o som de sua voz e se dirigiu a Bianca.
- É o Val, está preocupado com você.
Bianca corou, constrangida por causar tanto inconveniente a seus novos amigos.
- Não se preocupe, eu vou levá-la pra casa inteira... Ok, depois a gente se fala. - Disse Eduardo antes de colocar o telefone de volta no bolso.
- E-eu estraguei a noite de vocês, não é? - Perguntou Bianca, olhando para o chão.
- Não estragou nada, não se preocupe. - Disse Eduardo segurando a mão dela entre as suas sobre a mesa.
Antônio chegou trazendo a pizza e os refrigerantes. Eduardo soltou a mão de Bianca para deixar a mesa livre para receber a pizza. O Cheiro era maravilhoso, estimulando os sucos gástricos de ambos. Bianca pegou o garfo e a faca, mas Eduardo tirou os dois de sua mão.
- Não, princesa., isso tira toda a graça da pizza, toma isso aqui. - Eduardo pegou três guardanapos de papel sobre a mesa entregou a Bianca. - Observe como se come pizza de verdade.
Eduardo pegou uma fatia da pizza, pôs sobre um guardanapo, dobrou-a fazendo parecer um sanduíche e deu uma enorme mordida.
- Hummm... Assim que se faz, agora é sua vez.- Disse Eduardo com a boca cheia.
Bianca colocou uma fatia no guardanapo que Eduardo lhe deu e repetiu os movimentos dele, dando uma enorme mordida na pizza.
- Muito bem, Bianca Padawan. - Comentou Eduardo, dando outra mordida em sua pizza.
-Star wars? O Bad boy na verdade é um Geek? - Perguntou Bianca, rindo.
- Hey! Quem você está chamando de Bad boy? - Perguntou Eduardo, com a mão no peito, fingindo estar magoado, fazendo Bianca sorrir novamente. - E se tivesse me conhecido há alguns anos, nosso grupo costumava se fantasiar como os personagens nas festas de dia das bruxas.
Um instante de silêncio se seguiu, mas foi quebrado por Bianca.
- Por que você me trouxe aqui?
- Para comer pizza. Reparou como ninguém fica triste comendo pizza? Pode estar triste antes, ficar triste depois, mas enquanto comemos pizza, somos felizes.
Bianca sorriu para Eduardo e insistiu na pergunta.
- Não foi isso que perguntei...
- Você não tinha como voltar para a pensão sozinha, ia acabar se perdendo.
- Muito obrigada! Por me trazer aqui e por... - Bianca parou de falar, hesitante.
- Por? -Eduardo a olhava nos olhos.
- Por me ensinar a comer pizza... - Respondeu Bianca, sorrindo. - E por não fazer perguntas.
- O fato de não fazer perguntas não significa que eu não esteja interessado em saber o que houve, ou que não esteja disposto a te ouvir.
- Eu sei...Eu só não me sinto bem pa-
- Com a licença dos pombinhos - Interrompeu Antônio trazendo uma taça de sorvete tamanho gigante, coberto de chantili, chocolate derretido e morangos. - Essa é a primeira vez que você traz uma garota aqui, então, é por conta da casa.
Tanto Eduardo quanto Bianca coraram de imediato, sorrindo um para o outro como duas crianças.
- Não precisava, Antônio... - Disse Eduardo agradecido.
-Ta, ta... Eu sei que não precisava, mas eu faço questão. Desde que cresceram você e Valdemar quase não vêm aqui me ver, me deixe paparicar quando estão aqui! Agora sirvam-se e aproveitem, o sorvete é feito aqui, receita de família.
Bianca enfiou uma colherada do sorvete na boca, fechou os olhos e gemeu de prazer quando sentiu o sabor gelado de sua sobremesa favorita.
"Hummm"
Em seguida abriu os olhos e se deparou com Eduardo a olhando com o rosto sério.
- O que foi? Tem alguma coisa no meu rosto? - Perguntou Bianca, passando a mão pelo rosto pensando que ele poderia estar sujo ou algo do tipo.
O rosto de Bianca estava limpo, mas ao ouvir as palavras de Bianca o típico sorriso cínico de Eduardo retornou lentamente aos lábios dele.
- Tem uma sujeirinha do lado esquerdo. - Mentiu Eduardo, apontando para a bochecha de Bianca.
- Saiu? - Perguntou Bianca, passando a mão pela bochecha.
- Não.
- Melhor ir ao banheiro lavar o rosto então. - Disse Bianca, preparando-se para se levantar.
- Não precisa! - Disse Eduardo tocando o rosto dela. - Deixa que eu limpo para você.
Eduardo tocou o rosto dela com a mão delicadamente, deslizando o polegar para limpar a sujeira fictícia. Enquanto a mão dele tocava o rosto de Bianca, seus olhos não se desviaram dos olhos dela.
No instante seguinte, ele tirou a mão do rosto de Bianca e chegou o corpo para trás, mais uma vez com uma expressão séria no rosto que permaneceu pelo resto da noite. No caminho de volta para a pensão, eles trocaram poucas palavras, até voltarem ao silêncio.
Chegando ao quarto, Eduardo tirou o tênis, a camisa e se jogou na cama sem dizer nada. Bianca se sentiu confusa com a mudança de humor de Eduardo e foi direto para o banheiro. Abriu o chuveiro e deixou a água morna relaxar seu corpo. Sua mente dava voltas, teimosamente trazendo imagens de tudo que tinha acontecido naquela noite. O reencontro com Fábio, as lembranças que insistiam em abrir feridas, que ela acreditava estarem curadas e Eduardo...
O que sentiu quando dançaram juntos, ou quando ele tocou seu rosto na lanchonete?
Ela não saberia dizer, especialmente depois da mudança de humor que ele apresentou. Ficou tão frio e distante que ela se sentiu tentada a perguntar a ele o que aconteceu, se havia feito ou dito algo errado, mas se lembrou que ele lhe fez o favor de ser discreto e não fazer nenhum pergunta que a constrangesse e decidiu fazer o mesmo por ele.
Vestiu uma camisola e voltou para o quarto. A luz estava apagada e Eduardo parecia estar dormindo. Ela se aproximou dele, parecia tão tranquilo enquanto dormia, que ela tentou não fazer nenhum barulho para não acordá-lo. Aproximou-se e o beijou suavemente no rosto.
"Obrigada por tudo!"
Sussurrou no ouvido dele, antes de deitar e adormecer, sem saber que ele estava acordado.