Capítulo 4 Anna

Acordei com o corpo dolorido. Não sabia se era pelos galhos da floresta, pela tensão que enrijecia meus músculos ou por algo que eu não queria lembrar. Minha garganta estava seca, e minha mente parecia um emaranhado de fragmentos - flashes de olhares, toques e a floresta escura.

Me sentei devagar. A cama era grande demais. Limpa demais. Fria.

No encosto de uma cadeira, um vestido branco me aguardava. Longo, de tecido caro, com rendas delicadas. Ao lado, um par de saltos e uma caixinha com brincos de pérola. E, sobre a cômoda, um bilhete com uma caligrafia familiar:

"Se arrume e desça, se comporte hoje se não quiser encontrar o meu pior lado novamente"

- Derek.

Meu estômago revirou.

Agora queria que eu... me arrumasse? Como se aquilo fosse normal. Como se não tivesse me arrancado da minha vida, me colocado nesse lugar isolado, como se eu fosse uma boneca nova que ele acabou de comprar e agora queria exibir.

Me vesti. Não por vontade, mas por sobrevivência.

O vestido escorregava pelo meu corpo como um lembrete cruel de quem eu não era mais. Olhei no espelho: meus olhos estavam inchados, meu rosto pálido, e meus braços ainda marcados pelos arranhões da floresta. Eu não me reconhecia.

Quando desci, encontrei Derek na sala, calmamente sentado no sofá com um copo de uísque. Estava vestido impecavelmente. Tão em contraste comigo que doía.

Ele ergueu os olhos e me analisou como se eu fosse uma obra inacabada.

- Tire o vestido - disse ele, como quem pede para tirar os sapatos antes de entrar em casa.

Senti o chão girar. Ele estava falando sério?

- Mas... só vamos conversar?

- Preciso de um incentivo - disse, sem desviar o olhar. - Vai me desobedecer de novo?

Fechei os olhos. A humilhação era um veneno silencioso. Mas eu estava presa ali. E ele sabia disso.

Soltei o zíper do vestido. Senti o tecido cair lentamente, deslizando até o chão. Fiquei ali, de pé, exposta. Meus machucados visíveis. Minhas marcas. Minha vergonha.

Ele se levantou devagar. Chegou perto, passando uma mão fria pela minha cintura.

- Você é linda até quando está arranhada - murmurou.

Tentei não tremer. Tentei não mostrar nada. Mas meus olhos o traíram.

Ele se inclinou. Beijou minha boca como se estivesse marcando território. Um beijo que não pedia permissão. Que me engolia inteira. E por um segundo... eu não consegui reagir.

Me afastei num impulso.

- Assim está bom?

Ele sorriu de lado.

- Pode melhorar. Mas gosto de progresso.

Engoli em seco.

- Derek... você vai... tirar minha virgindade na noite de núpcias?

Ele ergueu uma sobrancelha.

- Você quer?

- Não foi isso que eu perguntei.

- Eu não vou se você não quiser. Não sou um monstro.

- Não? Você me arrancou da minha casa, mentiu pra mim, me isolou, me ameaçou, me bateu... e diz que não é um monstro?

Ele não respondeu. Apenas caminhou até a lareira e virou de costas para mim. O silêncio durou mais do que eu suportava.

- Nunca te explicaram como as nossas famílias funcionam?

- Como assim?

Ele se virou de volta. Seus olhos estavam diferentes. Menos controlados. Mais... intensos.

- A cada trinta anos, uma Romanoff casa com um Corleone. É assim que mantemos o que temos. Seu sangue é metade Romanoff, Anna. E agora é sua vez.

- Isso é loucura.

- É tradição. Sua avó, sua tia... todas seguiram. Você também vai.

- Mas eu sou Hartmann!

- De nome. Mas sua mãe é Romanoff. E isso basta. Nós fomos criados para isso.

Minha cabeça girava. Tudo que ele dizia parecia retirado de um ritual antigo. Algo sombrio demais para ser real. Mas no fundo... alguma parte de mim sabia que não era mentira. Algo em casa sempre pareceu oculto. Sempre pareceu... planejado.

- E por que eu? Por que agora?

- Porque você é perfeita pra isso. Seus pais te prepararam a vida toda sem te contar. Porque sabiam que se contassem, você fugiria. E não queriam correr o risco de perder tudo.

Me sentei devagar no sofá, sentindo minhas pernas fraquejarem.

- E o que você ganha com isso?

Ele se aproximou. Ajoelhou-se diante de mim e segurou meu queixo.

- Eu ganho você. E você ganha a chance de não ser como as outras.

- Que outras?

- As que quebraram. Que desistiram. Que se tornaram sombras. Eu quero você viva, Anna. Mas pra isso... você vai ter que jogar do meu jeito.

Ele me beijou de novo. E dessa vez, por um instante, eu não resisti.

Talvez fosse o medo. Talvez fosse a dúvida. Talvez fosse só a vontade desesperada de entender por que alguém como ele dizia que queria algo além da obediência.

Ou talvez... fosse só o começo da minha ruína.

            
            

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