Capítulo 7 Eu aceito!

PONTO DE VISTA DE HELOÍSA

Cheguei em casa e fui direto pro banho, precisava colocar a cabeça no lugar pra não tomar nenhuma decisão que pudesse me arrepender depois. Se eu aceitasse, mudaria tudo. Eu deixaria de ser a secretária quase invisível, para me tornar a namorada do CEO mais sexy do país. Algo que não acredito que seria fácil. Ainda não sabia o que poderia pedir em troca dessa ajuda, mas tinha certeza que não queria ser a secretaria interesseira que quer ficar rica à custa do problema do meu chefe. Tudo bem que ele é um babaca, mas não me sentiria bem o usando como um trampolim pros meus próprios interesses.

Nos livros que costumo ler no celular, o CEO arrogante oferece uma quantia obscena pra mocinha se casar com ele, por fim eles se apaixonam e vivem felizes para sempre. Mas trazendo pra vida real, eu não estou endividada até o pescoço, talvez um pouco, mas nada que não consiga resolver com o tempo. E nessa minha vida real eu não me apaixono pelo Patife, de jeito nenhum, nem nessa vida e nem na próxima. Isso está fora de cogitação.

Saio do banho um pouco mais calma, visto meu pijama de poá, e vou pra cozinha encontrar uma Liz totalmente eufórica, cantando uma música sertaneja que eu amo, e dançando como se não houvesse amanhã. Sento-me na banqueta e apoio os cotovelos na bancada da cozinha esperando ela notar a minha presença.

- "Ai que susto, Heloísa!" – Minha melhor amiga diz dando um pulinho e colocando a mão sobre o peito.

- "Oi pra você também." – Digo com cara de inocente e batendo os cílios pra ela. – "Como foi o seu dia?"

- "Foi bom, estou esperançosa. Acho que vou ser chamada pra alguma entrevista essa semana." – Ela diz cruzando os dedos e querendo demonstrar positividade. – "O que aconteceu que você chegou em casa mais cedo?"

-"Meu chefe me liberou pra vim embora, depois de me fazer uma proposta de trabalho."

- "Proposta? Você será promovida?" – Ela pergunta com os olhos brilhando.

Começo a contar sobre a conversa mais maluca que já tive na vida, e tento ser o mais detalhista possível, não esquecendo nenhum pequeno detalhe de tudo que foi dito naquela sala.

- "O seu chefe realmente disse que você é o tipo dele? Ai meu Deus, não acredito!" – Minha melhor amiga diz com um sorriso tão grande que tenho medo que o rosto dela sofra alguma deformidade.

- "É serio que depois de tudo que eu contei essa foi a única parte que você realmente escutou?" – Pergunto revirando os olhos.

- "É claro que eu ouvi tudo que você disse, mas vamos combinar que isso é totalmente surreal. Pelo que você me conta, o seu chefe te ignora 95% do tempo e agora diz que você faz o tipo dele. Esse cara é bipolar por acaso?" – Ela diz com o rosto confuso.

- "Eu também não entendi direito essa parte, mas vamos focar no que realmente importa, por favor?! Eu preciso tomar uma decisão, se vou ajudar ou não. Tem muita coisa envolvida e não sei o que fazer." – Digo e jogo minha cabeça sobre o mármore da bancada tentando organizar os pensamentos.

- "Bom, eu só consigo ver oportunidades nessa situação, amiga. É claro que conviver com o Patife não será fácil, mas você já faz isso diariamente, não é como se você fosse conhecer alguém do zero. Além disso, se ele precisa da sua ajuda, ele terá que aprender a te tratar melhor, então é uma ótima oportunidade pra você ensinar bons modos pro babaca."

- "Vendo por esse lado, pode não ser tão ruim mesmo."

- "Outra coisa, você pode aproveitar também pra aprender a lidar com o sexo oposto, amiga. Você já tem 24 anos e não consegue ficar mais que dois minutos ao lado de um homem sem corar e gaguejar. Quer curso melhor do que namorar um cara lindo e rico?" – Ela diz com um sorrisinho conspiratório nos lábios e eu novamente reviro os olhos.

- "Você entendeu a parte que não é um relacionamento de verdade né, Liz?"

- "É claro, mas ainda sim você precisará agir como uma namorada em público, além de frequentar alguns lugares que nem de longe você iria por vontade própria. Amiga, você nunca sai de casa, está sempre de casa pro trabalho e do trabalho pra casa, não se relaciona com ninguém e nem conhece gente nova. O único percurso que você conhece além do trajeto pro Grupo Cesarini é o caminho do mercado. Pelo amor de Deus, está na hora de você viver um pouco."

- "Mas eu me sinto bem dessa forma, Liz." – Eu digo, mas acho que não convenço nem a minha mesma.

- "Mas você pode acabar se arrependendo de não viver coisas que mulheres da nossa idade vivem, Helô. Estamos no momento de arriscar, cometer erros, tomar decisões precipitadas. Vamos deixar pra fazer tudo certinho depois dos 30, OK? Eu acho que você precisa se jogar mais na vida, ser mais inconsequente. Você sempre fez o que esperam de você, pela primeira vez se permita fazer algo pensando somente em si mesma." – Liz diz com um olhar tão compreensivo que aquece meu coração. Eu sempre vivi a minha vida da forma que as pessoas julgam certa, meus pais sempre se orgulharam de eu ser uma boa moça e no trabalho ninguém pode falar algo contra mim. Será que eu realmente estou vivendo de forma morna, monótona?

- "Talvez, e ressalto que apena TALVEZ, você esteja certa." – Digo e vejo o rosto da minha amiga se iluminar.

– "Mas o que eu posso pedir em troca dessa ajuda? Eu não quero pedir uma fortuna e nem que aumente meu salario. Realmente não tenho o que negociar."

- "Nisso eu não posso opinar, porque só você sabe o que é importante pra si mesma. Mas escute a proposta dele e faça os ajustes necessários. Você sempre soube se virar bem sob pressão. Não é atoa que trabalha pro babaca a tanto tempo."

Vou pro meu quanto com o coração mais leve, talvez a Liz tenha razão, talvez eu precise me arriscar mais e viver de forma mais livre. Mas será que vou conseguir isso justamente com o cara mais canalha que já conheci? Bom, acho que só vou saber se arriscar.

Acordei no dia seguinte com a decisão tomada e uma coragem que não sei de onde surgiu. Me arrumei e fui pro trabalho pensando na melhor forma de abordar o assunto sem parecer desesperada, afinal ele precisava mais de mim do que eu dele.

Cheguei ao Edifício do Grupo Cesarini e passei pelos corredores pensando que talvez fossem os últimos dias de anonimato, eu que sempre prezei pela minha privacidade, estava entrando, por vontade própria, em um caminho sem volta. Esperava não me arrepender, mas percebi que talvez arrependimento maior fosse não tentar.

Iniciei o meu dia como de costume, cheguei a minha mesa, arrumei minhas coisas, fui buscar o café do meu chefe, bati duas vezes na sua porta e entrei. Coloquei o seu café em cima da sua mesa e quando levantei as vistas, me deparei com o sr Cesarini e o sr Bernardi me encarando como se eu fosse um animalzinho a ser estudado. Corei imediatamente e abaixei o olhar encarando os meus pés.

- "Bom dia, senhores." – Disse de forma contida.

- "Bom dia, Heloísa. Dormiu bem?" – o sr Bernardi perguntou com um sorriso de lado.

- "Sim, sr Bernardi. Obrigada por perguntar."

- "Acredito que tenha uma resposta para nos dar. Certo?" – O advogado perguntou entrando no seu modo profissional.

- "Tenho sim." – Respirei fundo buscando a coragem que parecia ter me abandonado quando entrei nessa sala. – "Eu aceito a proposta de trabalho."

O meu chefe soltou o ar pela boca que parecia estar prendendo a muito tempo. Alex pediu para eu me sentar na poltrona e os dois homens vieram se sentar no sofá a minha frente.

- "É uma noticia maravilhosa, Heloísa. Tenho certeza que não irá se arrepender." – Ele sorriu de forma amigável e observei que o meu chefe batia o pé de forma acelerada, como fazia sempre que estava ansioso. – "Quer nos dizer as suas condições?"

- "Eu prefiro ouvir a proposta de vocês, se não se importarem."

- "Claro, sem problemas. Você quer começar, Brian?" – O advogado perguntou querendo envolver meu chefe na conversa. Ele parecia tão nervoso quanto eu, o que passaria desapercebido pela maioria das pessoas, mas eu o conhecia o suficiente pra ler os seus sinais.

- "Ok, vamos lá!" – Meu chefe começou se endireitando no sofá e assumindo a postura de homem de negócios. – "Será um contrato de seis meses, podendo ser renovado por mais seis, vai depender dos resultados. Você precisará me acompanhar em eventos de negócios e familiares. Teremos uma rotina de sermos vistos juntos ao menos uma vez por semana, na prática isso significa um almoço ou jantar em algum restaurante, ou um passeio ao ar livre... enfim, vai depender da nossa agenda. Até aqui tudo bem?"

- "Sim, de acordo." – Respondi de forma sucinta.

- "Eu irei disponibilizar um cartão de credito em seu nome pra arcar com qualquer custo que esse acordo possa gerar pra você. O limite dele é bem alto, então não se preocupe com os gastos, apenas entregue sempre o seu melhor. Isso inclui estar sempre bem vestida e arrumada a partir de agora. Até ao trabalho você deve vir sempre impecável. Nada de terninhos básicos e sapatos baixos." – Eu revirei os olhos sem conseguir conter a irritação por uma exigência tão descabida.

- "Você será observada e analisada a partir do momento que for reconhecida como namorada do CEO, Heloísa." – O advogado interviu. – "Todos estarão sempre esperando que você cometa um erro para poder criticá-la e desvalorizá-la, inclusive falar da sua aparência. É importante que esteja sempre apresentável e a altura da posição. As pessoas podem ser bem cruéis quando querem." – Ok, ele tinha um ponto.

- "Tudo bem, será feito." – Disse sem querer me alongar no assunto.

- "Como eu ia dizendo..." – Meu chefe pigarreou querendo chamar minha atenção pra ele. – "Além do cartão, será depositado em sua conta o valor referente a um ano do seu salario de forma imediata, não é muito, mas acredito que seja suficiente para amenizar qualquer dor de cabeça que você possa ter no momento. Teremos que lidar com muita coisa nos próximos meses, então não queremos dividir sua atenção com qualquer problema desnecessário. Caso não seja suficiente, é só nos passar um valor exato." – Meu chefe me encarou esperando por uma resposta.

- "É o suficiente, obrigada!"

- "Ao final do período de seis meses, você receberá o valor de $250.000,00 pelo trabalho realizado, e caso seja necessário renovar por mais seis, o valor também será renovado..."

- "Espera!" – Eu falei no impulso e o meu chefe se assustou com a interrupção. – "Eu não quero esse dinheiro." – Falei de forma atropelada e o meu chefe me encarou.

- "Você quer negociar o valor?" – Rebateu de forma séria.

- "Não, eu não quero dinheiro algum." – Os dois homens pareceram surpresos e estavam prestes a argumentar, mas fiz um gesto com a mão para que me deixassem continuar. – "Não me sinto bem recebendo um valor desses por esse tipo de trabalho." – Olhei para o rosto do meu chefe antes de continuar – "Você já está me pagando um valor significativo de imediato, e mesmo que não seja muito para o senhor, vai aliviar muito as minhas finanças. Qualquer valor que o senhor me pagasse ao final disso tudo seria maravilhoso, mas tenho certeza que me deixaria com gosto amargo na boca. Então, não quero. Mas agradeço."

Os dois homens me encaram como se eu tivesse chifres e se abateu um silêncio incomodo na sala. Respirei fundo e decidi colocar as minhas condições na mesa.

- "Então..." – Pigarrei para que eles voltassem a prestar atenção no que eu dizia – "Eu tenho três condições, sendo duas delas inegociáveis. A primeira e mais simples, é que a minha amiga, que divide o apartamento comigo, seja contratada pelo Grupo Cesarini. Ela estuda Economia e seria ótimo se ela conseguisse algo na área dela."

- "Isso não é problema, considere feito." – Meu chefe disse e fez gesto pra que eu continuasse.

- "A segunda é que você sempre me tratará bem na frente de outras pessoas. Nunca, em hipótese alguma me responderá com grosseria ou aumentará o tom de voz." – Falei com calma e esperei a reação do meu chefe. Ele me encarou e pensou por um momento antes de responder.

- "Que tipo de homem você pensa que eu sou, Heloísa?" – Não me passou despercebido que, pela primeira vez em três anos, ele me chamou pelo primeiro nome. E pior, eu adorei o som que tem na voz dele. Droga, Heloísa, para com essa merda, ele é o seu chefe insuportável.

- "O tipo que me ignora metade do tempo e na outra metade é um babaca." – Arregalei os olhos e coloquei a mão sobre a boca ao perceber o que tinha acabado de dizer. O sr Bernardi começou a gargalhar para piorar a minha situação e eu não sabia como concertar aquilo. Ai meu Deus, comecei com o pé esquerdo. – "Me desculpe sr Cesarini, eu não quis dizer isso. É claro que o senhor não é um babaca metade do tempo, só as vezes. Quer dizer, NÂO! o senhor não é um babaca nunca, eu só quis dizer pra não ser mais um babaca...."

- "Ok, sr Mortágua, eu entendi. Não ser mais um babaca, anotado." – Ele me interrompeu e agradeci mentalmente por isso. Eu preciso aprender a deixar a língua dentro da boca. – "E qual a última condição?"

- "Eu não serei corna." – Falei ficando vermelha igual um tomate e vendo meu chefe ficar completamente confuso.

- "Como assim? É claro que não será, até porque não seremos namorados de verdade." – Ele rebateu parecendo impaciente por ter que me explicar o óbvio.

- "O que eu quero dizer, é que não terei a imagem da namorada corna que aceita tudo em nome do amor. Se ficaremos nisso por seis meses, não quero ser colocada como traída durante todo o tempo que estivermos juntos." – Expliquei tentando parecendo tranquila, mas estava surtando por dentro. Era agora que ele iria cancelar tudo.

- "Eu sei ser discreto quanto as minhas relações, Heloísa. Quanto a isso não se preocupe." – Ele rebateu parecendo incomodado por ter que falar sobre o assunto comigo. Mas eu não iria ceder tão fácil, mas não mesmo.

- "Não estou me referindo a ser ou não discreto. Estou dizendo que não irá acontecer. Não haverá uma terceira pessoa nessa relação, não haverá relacionamentos as escondidas. Não serei traída pelo meu namorado falso. Nenhum de nós dois terá qualquer envolvimento amoroso, casual ou não, durante o período desse contrato." – Joguei a bomba em cima dele e esperei ela estourar.

E ela estourou.

                         

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