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Montar a minha barraca sem ajuda de ninguém é um pouco complicado. Eu me embaralho dezenas de vezes com a carcaça metálica que sustenta a lona vermelha, precisando recomeçar algumas vezes para fazer do jeito certo.
O que me ajudou foi observar algumas barracas já montadas dos outros alunos que são mais ou menos iguais a minha. Elas me dão certa base de como a minha deverá ficar, e depois de quase uma hora tentando, finalmente termino de monta-la.
Testo a força de resistência dela para saber se o vento da noite não irá derruba-la, mas pelo visto eu enterrei as estacas fundo o suficiente para que ela não se mova um centímetro sequer quando eu a empurro para trás.
A parte de dentro da barraca é espaçosa e um tanto confortável. Ela é meio retangular, de modo com que eu consiga deitar com as pernas totalmente esticadas sem problema nenhum. O chão é coberto por um colchonete azul escuro meio fino, mas acredito que como as pedras de calcário são minúsculas e a areia é bem fofa, não será nem um pouco desconfortável.
Tiro a terra dos minhas mochilas e às carrego para o interior da barraca, colocando-as empilhadas ali no canto, para então tirar meus livros cuidadosamente de dentro da mochila e os colocar em uma pilha bem organizada. Eu trouxe seis livros, mas provavelmente não vou ler todos (a não ser que o tédio me consuma nessas duas semanas e me faça deixar de lado a promessa que fiz a mim mesmo de que não iria ficar isolado nesse meio tempo).
Os títulos que trouxe são: a estratégia do charme; Era uma vez um coração partido; os mortos não contam segredos; aurora ascende; Aristóteles e Dante descobrem os segredos do universo (apesar de já ter lido esse umas três vezes) e reino das bruxas.
Tinha pensado em trazer coração das trevas, mas isso me faria lembrar de pânico no lago (a protagonista do quarto filme comenta sobre esse livro), e eu realmente não quero pensar sobre pânico no lago ou qualquer coisa assustadora envolvendo essa viagem.
Na verdade eu fiz uma minuciosa pesquisa antes de concordar em vir. Então tenho 100% de certeza de que estamos totalmente livres de: piranhas; cobras assassinas; crocodilos e tubarões.
- Because I'm pretty when I cry... I'm pretty when I cry... - começo a cantarolar uma música aleatória da Lana del Rey, enquanto engatinho até a entrada da barraca e fecho o zíper que está aberto. O casulo de privacidade que me envolve é um tanto confortável, mas aqui dentro é quente pra caramba, principalmente às três horas da tarde, então preciso sair logo logo.
Abro o botão da calça cargo que estou vestindo e livro-me dela rapidamente. As minhas pernas pálidas são um pouco torneadas porque vou para a escola de bicicleta todo santo dia, mas não é nada que faria alguém olhar e falar "NOOOOSSA! OLHA COMO AQUELE CARA ALÍ TEM AS COXAS MUSCULOSAS!!".
Tiro a cueca Boxer Branca e visto uma sunga verde escura. Eu obviamente não tenho coragem de sair por aí vestindo esse negócio que mal cobre as minhas partes íntimas, então visto um short fino por cima.
Não tenho problemas em mostrar o meu dorso, apesar de ser magrelo e ter sardas por todos os lados, então retiro a camisa e não visto outra no lugar. Eu tenho 1,78 de altura, e acho que isso me ajuda a ser ainda mais desengonçado do que já sou, o que é a cereja do bolo quando se trata de "más qualidades do esquisitão chamado Luther".
Passo protetor solar em cada canto de pele exposta do meu corpo, tendo dificuldade para passar em toda as minhas costas, mas não desistindo até que cada milímetro da minha pele esteja protegido. Eu já cometi o erro de me expor ao sou sem protetor uma fez, e podem acreditar que não quero repetir isso, a menos que seja minha intenção virar um sósia do Donald Trump.
Assim que coloco os pés fora da barraca, sou agraciado por uma brisa fresca. Há pequenas nuvens espalhadas pelo céu, mas elas não chegam nem perto de barrar os raios intensos que nos banham.
- VENHAM PEGAR UM LANCHE GALERA!! - O diretor Halloran grita. Ele é um senhor careca de quarenta e poucos anos e está parecendo um palhaço, com a cara completamente branca de tanto protetor solar.
Uma mesa improvisada foi montada no centro do acampamento, e nela há alguns sanduíches embalados em papel alumínio. Minha barriga ronca assim que coloco os olhos na comida, já que faz mais de umas cinco horas que não como nada.
Eu até trouxe algumas barrinhas de chocolate e ceral, mas resolvi deixar para mais tarde mesmo.
Começo a caminhar em direção a mesa, passando por outras barracas e pessoas. Há menos barracas que pessoas, o que indica que alguns deles irão dormir juntos, apesar de uma das regras impostas antes de viajarmos era de que isso não acontecesse, mas já que estamos aqui, o que os professores podem fazer? Obrigar os espertinhos a dormirem na areia??
Enquanto caminho, olho de relance para alguns garotos que passam por mim. Eu posso até ser tímido e solitário, mas isso não me impede de observar a grande quantidade de pele bronzeada, os músculos magros, o volume da sunga...
Balanço a cabeça para os lados, tentando me livrar desses pensamentos esquisitos, até porque todos esses caras são bem chatinhos, héteros e com certeza não fazem o meu tipo. Tirando o fato de que sou virgem e nunca tive experiência alguma a não ser com minhas mãos.
Os meus cachos escuros que caem sobre a minha testa formam uma sombra bacana sobre meus olhos, protegendo-os do sol. Isso me faz agradecer internamente por não ter cortado o cabelo nos últimos tempos.
- Hey. - Liza, uma menina ruiva que está vestindo um biquíni minúsculo me encara. Seu olhar varre o meu corpo lentamente, como se me visse pela primeira vez.
- ãhn... Oi? - Olho por cima dos ombros para saber se é comigo mesmo que ela está falando. E na verdade é sim.
- Você é novo na turma? Nunca tinha te visto antes. - Liza tira alguns mechas do cabelo liso do rosto, varrendo meu corpo com o olhar novamente. Isso faz eu me sentir um pouco desnudo, como se não tivesse vestindo nem o calção e nem a sunga.
- Eu sento na fileira ao lado da sua desde... Ãhn... O quarto ano do fundamental? - digo meio sem jeito, passando por ela para pegar um sanduíche para mim antes que eu fique sem.
- Sério?? - ela exclama, meio surpresa, enquanto eu abro o embrulho de papel alumínio e dou uma checada no sanduíche. Não sou chatinho com comida, mas fico alegre quando percebo que não é de pasta de amendoim, e sim de queijo e presunto.
- Já está dando em cima do nosso lobo solitário, Liza? - uma voz grave diz ao mesmo tempo que um braço bronzeado é jogado por cima dos meus ombros, me fazendo quase engasgar com a primeira mordida do sanduíche, devido ao contato repentino.
Olho para o cara e sinto meu corpo estremecer quando percebo que ele está só de sunga, quase esfregando aquela coisa na minha perna. Ele é um dos quaterbarcks do time de futebol, acho que seu nome é Victor.
- Sai pra lá, Victor!! - Liza confirma as minhas suspeitas sobre o nome, antes de voltar os olhos para mim.
- Você fica bem diferente sem aqueles moletons, as calças cargo e tudo mais. - Ela diz, cruzando os braços sobre o biquíni preto e quase fazendo seus peitos saltarem pra fora dele.
- Verdade. - Victor confirma.
- Hum... Obrigado. - fico um meio sem jeito pela atenção repentina, porque pelo visto eu não sou tão invisível quanto achei que fosse.
- Mas Então Luther, o que está achando da viajem? - Victor continua, virando o rosto na minha direção. Ele tem olhos verdes; o seu cabelo é liso e castanho; o nariz dele tem uma pequena protuberância na ponte, num estilo meio aquilino.
- Ótima, na verdade. - dou um pequeno e discreto passo para o lado, fazendo com que ele tire o braço dos meus ombros. Solto um suspiro rápido e retiro os cachos escuros que caem sobre os meus olhos.
- porque não vamos nadar um pouco? - Liza pergunta, alternando o olhar entre Victor e eu. Boa parte dos nossos colegas já caiu na água, e há algumas boias redondas e coloridas na margem.
- Claro!! - Victor me dá um soquinho no ombro e começa a andar em direção ao lago, com Liza no seu encalço.
- Eu vou terminar de comer logo. - Digo, abrindo um sorriso amarelo que não deve chegar aos olhos. É um pouco estranho tê-los falando comigo agora, quando não dirigiram uma palavra a mim sequer nos últimos anos, e olha que estudo com esses dois desde que consigo me lembrar!
- Okay então! Mas anda longo. - Victor diz, antes de dá meia-volta e correr até a água.
Eu como o meu sanduíche em silêncio, enquanto observo as pessoas ao meu redor. Os professores estão organizando a comida no bagageiro do ônibus e dando ordens aos alunos, para que não sumam de vista ou vão muito adentro do lago. Um grupinho de adolescentes já montou uma rede de vôlei e agora estão desenhando as linhas da quadra improvisada na areia com um graveto.
Não demora mais do que uns dois minutos para que eu devore todo o sanduíche, comendo tão rápido que mal registro o seu gosto. Ele é o suficiente para saciar minha fome, já que nunca fui de comer muito (isso deve explicar o meu físico de magricela).
Limpo as minhas mãos no calção e procuro algum lixeiro próximo para jogar o papel alumínio, encontrando um cesto improvisado pelos professores a não mais do que uns cinco metros de distância. Eu descarto o meu lixo lá, antes de enfim andar até a água.
Fiz alguns meses de aula de natação quando era mais novo, então sei nadar muito bem, não que tenha posto em prática essas habilidades nos últimos tempos. Assim que meus pés tocam a água cristalina, arregalo os olhos ao perceber que a água é bem quente e relaxante.
O calcário e os grãos grandes de areia fazem com que a água não fique turva ou vire uma lama esquisita, mesmo com meus colegas pulando sem parar e correndo pela margem.
Consigo ver alguns peixinhos bicolores nadando tranquilamente perto dos meus pés, nem um pouco preocupados com a aproximação de humanos, como se soubessem que não representamos nenhum perigo para eles (pelo menos eu não represento. Não posso falar o mesmo desses outros).
- Hey Luther!! - Victor acena para mim freneticamente. Ele está a uns cinquenta metros de distância, perto de alguns outros garotos, que movem o olhar na minha direção também.
Engulo em seco e mergulho, já começando a nadar na direção deles para pelo menos dá um "oi" para Victor e não deixá-lo no vácuo. Ele está sendo bem legal comigo, na verdade, então não tenho motivos para ser um escroto ou não tentar conseguir o amigo.
A água envolve meu corpo por completo e faz uma sensação de liberdade passar por mim. Abro os meus olhos e depois de uma ardência primária, eles se acostumam a água cristalina.
Aqui embaixo é lindo!! A água é tão límpida que eu poderia achar sem problema nenhum uma agulha no fundo do lago, que é repleto de pedras circulares e não tem lixo ou lodo em lugar nenhum. Os peixinhos curiosos se aproximam e me analisam, antes de seguirem seu curso e desaparecerem de vista.
Bato os braços e as pernas de forma tranquila, nadando em direção ao lugar em que o grupinho de Victor está. Aqui já é bem fundo, mas mesmo assim consigo ver o fundo do lago sem problema.
Não demora mais do que uns três minutos até eu chegar até ele, subindo para respirar apenas umas duas ou três vezes.
- Hey. - digo timidamente, começando a flutuar a pouco menos de dois metros de distância dele. Preciso tirar o meu cabelo molhado do rosto repetidas vezes, porque os cachos cheios se desfazem quando estão molhados e batem quase no meu queixo, atrapalhando a minha visão.
- Nós vamos brincar de pega-pega. Quem for pego vai ter que pegar os outros. - Ele explica, enquanto seus amigos acenam para mim em reconhecimento. Liza também está no grupo, e abre um pequeno sorriso para mim.
- Certo. - Confirmo com a cabeça. Eu posso ser até um pouco desajeitado em terra firme, mas sou bem veloz na água, e eles terão um pouquinho de trabalho se quiserem me pegar. Também percebo que entre os meninos, eu sou o único que não está vestindo apenas uma sunga; não que isso tenha importância.
- Eu vou ser o pega primeiro. - Victor continua, então todos os seus amigos se afastam dele na velocidade da luz, como se ele estivesse com alguma doença contagiosa. Nós começamos uma contagem regressiva rápida:
- Quatro... Três... Dois... UM!!! - Quase antes mesmo da contagem regressiva terminar, o olhar de Victor foca em mim e ele avança na minha direção com um sorriso diabólico no rosto, mas eu não lhe dou chance alguma de me pegar, mergulhando o mais rápido e fundo que consigo.