Com amor, Holandês de Terceira
img img Com amor, Holandês de Terceira img Capítulo 5 Fevereiro de 2007 - Salt Lake City, Utah
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Capítulo 6 Maio de 2007 - Salt Lake City, Utah img
Capítulo 7 Presente - Holambra, Brasil Setembro de 2018 img
Capítulo 8 Junho de 2007 - Salt Lake City, Utah img
Capítulo 9 Agosto de 2007 - Salt Lake City, Utah img
Capítulo 10 Outubro de 2007 - Salt Lake City, Utah img
Capítulo 11 Presente - Holambra, Brasil - Setembro de 2018 img
Capítulo 12 Outubro de 2008 - Salt Lake City, Utah img
Capítulo 13 Outubro de 2008 - Salt Lake City, Utah img
Capítulo 14 Presente - Holambra, Brasil - Setembro de 2018 img
Capítulo 15 Novembro de 2008 - Salt Lake City, Utah img
Capítulo 16 Novembro de 2008 - Salt Lake City, Utah img
Capítulo 17 Novembro de 2008 - Salt Lake City, Utah img
Capítulo 18 Presente - Holambra e região, Brasil - Setembro de 2018 img
Capítulo 19 Dezembro de 2010 - Denver, Colorado Salt Lake City, Utah img
Capítulo 20 Julho de 2012 - Denver, Colorado img
Capítulo 21 Dezembro de 2012 - Salt Lake City, Utah img
Capítulo 22 Presente - Holambra, Brasil - Setembro de 2018 img
Capítulo 23 Setembro de 2013 - Salt Lake City, Utah img
Capítulo 24 Presente - Rio de Janeiro, Brasil - Setembro de 2018 img
Capítulo 25 Março de 2016 - Salt Lake City, Utah img
Capítulo 26 Doreen & Peter - Março de 2018 img
Capítulo 27 Holandês de Terceira img
Capítulo 28 Chuva de Pétalas - Holambra, Brasil - Setembro de 2018 img
Capítulo 29 Epílogo - Salt Lake City, Utah img
Capítulo 30 Agradecimentos e Nota da Autora img
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Capítulo 5 Fevereiro de 2007 - Salt Lake City, Utah

– Doreen, Doreen!! Acorde!! Vamos chegar atrasados! – Nícolas disse me balançando freneticamente.

– Me deixe em paz, seu holandês falsificado! De terceira categoria.

– Não me chame desse jeito! Vamos, precisamos nos apressar! Você já faltou quase três semanas de aula.

– Dê o fora daqui! – Puxei o cobertor para cima de minha cabeça.

– Seu pai me mandou acordar você para levá-la à escola.

– Eu não vou e pronto! Passe aqui depois da escola e me coloque à par de tudo, Okay?

– É uma pena. Hoje é o último dia da venda dos ingressos para o show da banda OneRepublic. Você sabe que Sophia só vende para a pessoa e não encomenda. Caramba! Você queria tanto ir naquele show e sua mãe iria querer que você fosse.

– Okay! Eu vou, mas só por causa dos ingressos! – Levantei e fuzilei meu melhor amigo com meu olhar matutino. – Eu te odeio!

– Eu também te odeio! E agora vá se arrumar, está me assustando! E seu hálito está horrível! – Ele torceu o nariz. – Agora entendo porque nenhum garoto te beijou ainda.

– Cale a boca, Nícolas! – Lancei o travesseiro no rosto do meu amigo. Ele revidou e ficamos guerreando com os travesseiros por alguns minutos antes de eu decidir me arrumar.

* * *

O dia estava ensolarado, mas com a brisa gélida de sempre de Salt Lake City. Vesti meu casaco assim que saltamos do carro de meu pai e caminhamos juntos até a sala de biologia, nossa primeira aula do dia. Só de pensar em ter que passar cinquenta minutos ouvindo sobre mitose e meiose meu estômago embrulhou e meus olhos pesaram de sono novamente. Alguns alunos me olhavam como se eu fosse aluna nova, o que me fez concluir que de fato eu havia passado muitos dias sem ir à escola. Notei ainda que as paredes de todo o colégio estavam diferentes, possivelmente uma reforma mudara tudo, era isso ou eu havia passado os últimos meses bem desligada, já que eu não percebi antes.

A Sra. Greenswim entrou em nossa turma, minutos depois que nos acomodamos, com seu astral efervescente de sempre, como se todos na face da terra estivessem empolgados para estudar biologia às oito da manhã. A professora era baixinha, tinha o quadril largo e braços gordos, como se tudo o que ela comesse se acumulasse apenas naqueles lugares, o que a deixava esquisita.

Adormeci nos primeiros quinze minutos de aula e Nícolas precisou me cutucar diversas vezes para eu conseguir manter os olhos abertos. Quando o sinal finalmente tocou, acordei sobressaltada enxugando a saliva do meu queixo. Esfreguei os olhos e peguei minha mochila do chão que nem havia me dado o trabalho de abrir e fui em direção à saída quando a Sra. Greenswim me chamou.

– Sim? – Respondi mais alerta do que nunca e com o coração saltitando.

– Posso falar com a senhorita um minuto?

– Claro! – Virei-me para Nícolas que havia voltado para me acompanhar na conversa. – Te vejo na aula de inglês.

Caminhei até uma carteira que ficava em frente à mesa da Sra. Greenswim e me sentei enquanto ela organizava alguns materiais dentro de uma pasta rosa choque, o que me fez quase ficar cega ao olhar diretamente para ela.

– Srta. Scott, o que está acontecendo?

Olhei para os lados franzindo o cenho sem saber o que responder. Quando comecei a pensar em algo para falar, minha professora me interrompeu.

– Eu sei que no último ano você passou por muitas coisas e eu sinto muito mesmo por tudo o que houve, mas precisamos decidir o que fazer com certas coisas a seu respeito. Você está me devendo quatro trabalhos, seis atividades e ainda perdeu o último exame. Está correndo risco de repetir o ano escolar e tenho certeza que a senhorita não quer iss...

– Eu vou me esforçar, prometo!

– Eu espero que sim! Você é mais inteligente do que aparenta, sei disso. Pode ir agora, não pode se atrasar para a próxima aula.

– Okay, obrigada!

* * *

– O que ela te disse? – Nícolas me perguntou quando me sentei ao seu lado na aula de inglês.

– Você precisa me ajudar em alguns trabalhos, se não vou repetir o ano escolar! – Digo aterrorizada com a ideia. – Meu pai vai me matar!

– Hoje não teremos aula no período da tarde, o que acha de estudarmos juntos?

– Com certeza! Preciso colocar as atividades em dia o quanto antes. Se possível até ao final de semana do show da OneRepublic ou então meu pai não me deixará ir!

– Duvido que dê tempo! – Nícolas disse e se recostou na cadeira, falando um pouco alto como se eu estivesse do outro lado da sala.

– Eu não perco esse show por nada! E fale baixo, por favor.

Na aula de inglês o Sr. Jacobs, um professor de meia idade, pele escura, cabelo black power e olhos verdes, falou sobre algumas literaturas americanas que teríamos que ler naquele semestre e, ao final da aula me chamou para conversar, assim como a Sra. Greenswim. Quando a hora do almoço finalmente chegou, eu já estava completamente exausta. Todos os professores com quem tive aula me chamaram para reclamar minhas responsabilidades como aluna, o que foi muito chato. Nícolas sentou-se ao meu lado com seu sanduíche quase vegetariano habitual e eu comi pelo menos três sanduíches com tudo o que tinha direito.

– Eu acho que você deveria cuidar mais da sua saúde, Doreen!

– Não me enche, Nícolas! Eu não como há um dia.

– Ohh... então vai fundo! Mas saiba que não é saudável da mesma forma.

– Okay... – Digo largando o meu sanduíche de presunto e afinando a voz. – Sr. Nutricionista chato para caramba, eu vou ao banheiro! Já volto.

Ao chegar no banheiro feminino, me certifiquei de que não havia ninguém, fui até um vaso sanitário, enfiei meu indicador na garganta e vomitei tudo o que havia comido minutos atrás. Comecei a tossir até minha garganta doer e sair lágrimas dos meus olhos. Caminhei até à pia, lavei minha boca, em seguida o rosto e voltei para o lado de Nícolas no refeitório.

– Você estava chorando? – Ele perguntou em tom acusatório.

– Não. Senti um cheiro ruim no banheiro, comecei a espirrar e meus olhos ficaram marejados, só isso. Acho que foi alguma coisa que as zeladoras colocaram por lá. – Respondi sem olhar nos olhos de Nícolas.

– Hum... sei.

– Vamos comprar nossos ingressos? – Perguntei entusiasmada.

Levantamo-nos para irmos de encontro com nossa vendedora particular. O pai de Sophia sempre recebia vários ingressos de shows de graça por trabalhar no ramo de eventos da cidade. Então ela vendia alguns para descolar uma grana extra, apesar de ter dinheiro de sobra em sua conta bancária.

Saímos da escola por volta das doze horas e meia e peguei uma carona com os pais de Nícolas. Assim que chegamos em minha casa ele afirmou que voltaria em breve e caminhei para dentro da minha casa, onde eu estaria sozinha por algumas horas. Coloquei meus materiais na minha escrivaninha e comecei a arrumar as coisas, já que não tínhamos empregada em casa. Minha mãe geralmente fazia tudo, além de trabalhar no museu com meu pai, e eu a ajudava. Depois que ela morreu, achei indelicado falar sobre a contratação de alguém para nos ajudar e esperei a poeira baixar. Então eu ajeitava tudo sozinha e meu pai ajudava fazendo o que sempre fazia, como lavar os banheiros, aparar a grama do jardim, limpar a piscina e cozinhar em seus melhores dias. Limpei os quartos na parte de cima, as escadas e por fim, a sala e a cozinha. Assim que finalizei, tomei um longo banho e fui assistir televisão, a fim de esperar pelo meu amigo para estudarmos.

* * *

Nícolas chegou por volta das quatorze horas em minha casa trazendo consigo um jarrinho com um broto de magnólia roxa para mim.

– Você deve plantar logo, elas crescem muito!

– Obrigada, Nícolas! É linda, eu amei! – Dei um abraço nele.

Coloquei a plantinha perto da janela, ao lado das frésias amarelas que ele havia me dado uma semana anterior e passamos a tarde estudando. Nícolas me ajudou com boa parte dos trabalhos que eu precisava entregar. Fizemos as atividades do dia e ainda iniciamos a leitura de um livro indicado pelo Sr. Jacobs.

Por volta das oito da noite, meu pai entrou em meu quarto para perguntar se gostaríamos de comer uma pizza e afirmamos entusiasmados. Então às oito e meia deixamos nossas atividades de lado e fomos para a sala assistir televisão e comer pizza com meu pai.

Depois da morte da mamãe nos ajudávamos bastante. Sabia o quanto papai sentia falta dela, era ainda perceptível. Às vezes ele ficava no escritório até altas horas da noite, olhando as fotos do casamento deles e outras de nossa família reunida. Haviam dias em que eu me juntava a ele e conversávamos, riamos e chorávamos muito, relembrando nosso incrível passado ao lado dela.

Nos primeiros meses, ele mal saia do quarto, não comia e, por alguns dias pensei que ficaria órfã dos dois. Mas ele melhorou e naquele momento achava que eu era quem estava piorando. Eu não ligava para mais nada ultimamente, apenas para o meu pai e Nícolas e ainda de uma forma muito distorcida, não era como antes, quando tudo estava em seu devido lugar.

Alimentava-me pouco e vomitava tudo em seguida, havia largado as aulas de dança, piano, tênis e ia para a cama às cinco da manhã, apenas para não ter que ir para a escola no dia seguinte. Enfim, o sentido da vida estava sendo perdido para mim. Mas eu tentava ao máximo não demonstrar isso para meu pai e meu melhor amigo. Afinal, eles precisavam de mim.

                         

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