Hoje ela é minha menina, linda mulher, libertinaa...
Libe, libe, libe, libertinaa, ai, ai, ai..."
Estava curtindo a música, mas de repente não escuto mais nada. Olho para o lado e noto que a Carina está brava.
- Estava ouvindo, sabia? Não posso mais ouvir música? - Indago.
- Poder, você pode! - Disse. - MAS ESCUTA EM SOM AMBIENTE E NÃO ESTOURANDO MEUS TÍMPANOS! - Grita. Agora eram meus tímpanos que estavam estourando. Verifico minha orelha, checando se não fiquei surdo com esse grito. Olho para ela sem entender.
- Desculpa, mas adoro aquela música e não percebi que estava tão alto assim. - Digo com suavidade, voltando a atenção para a estrada.
- Tudo bem... Devo desculpas por ter falado daquele jeito. - Ela diz encolhendo os ombros. - É que... É que... - Para de falar. Tem alguma coisa aí?
- Fala, garota.
- Sabe... O que... - Me olha e depois volta a olhar pra frente. - Não é nada importante. - E muda de assunto. Oi? Sério? Aí tem. Você não me engana.
- Carina Gonçalves Martins! Diz o que aconteceu! - Ela arregala os olhos.
- Não! Você vai ficar preocupado... - Coloca o livro na altura do peito e abraça. - Não é nada... Já disse!
- Me deixa te falar uma coisa... - Minha atenção continuava na estrada, apesar de ela me deixar nervoso com todo aquele mistério. - EU JÁ ESTOU PREOCUPADO! ENTÃO FALA!
- Ok. Ok. Não precisa gritar. - Solta o ar. - Mas promete que não vai ficar nervoso? - Me analisa.
- Prometo. Fala logo. - Mencionei.
- Sabe que meu pai paga a faculdade? Depois que se separou da minha mãe, continuaria pagando, lembra? - Coloca uma mecha de cabelo atrás da orelha.
- Sim. O que tem? - Não enrola, Carina! Diz logo que estou ficando ansioso, porra!
- Bem... Bem... Bem... - Gagueja.
- Fala. - Merda, estou perdendo a paciência. - Pode ir direto ao assunto, por favor!
- Meupaiparoudepagarevouterquefazerumaprovahojeparaganharumabolsa. - Olho para ela sem entender o que me disse.
- Bruno, OLHA PRA FRENTE! - Levo um susto, percebo que estou fora da estrada. Dou uma freada brusca e quase atropelei o cachorro que estava na calçada. Me viro para ver como a Carina está, tiro o cinto e vejo se não se feriu. Graças a Deus ela está bem.
- Está louco? Quase nos mata e ainda atropela o cachorrinho! - Ela me dá uma bronca. - Seu... Seu... Bobo.
- Eu estou todo preocupado com você, se não sofreu nenhum dano e você me chama de bobo? Não tem de quê. - Faço sinal de positivo pra ela e cruzo os braços.
- Aii... Desculpa... Desculpa, Bruno. - Ela tira o cinto e me abraça. - Você está bem? Não se machucou? - Começa a procurar por algum ferimento.
- Estou bem. - A afasto. - Agora me explica isso direito. Pode repetir o que você disse, mas devagar, por favor. - Ela balança a cabeça afirmativamente.
- Vou ter que fazer uma prova para ganhar uma bolsa. Meu pai parou de pagar a faculdade. - Ela diz, e não tenho como não perceber que nunca a vi daquele jeito. Insegura, nervosa, aflita...
Depois que Dona Andréa se separou do senhor Ricardo Gonçalves, dono de uma empresa que agora não me lembro o nome, ele trabalhava muito e quase não parava em casa, sempre viajando, viagens longas, de uns três meses, mais ou menos isso. Ela e a mãe tinham vida de madame. Carina só andava de táxi, usava roupas de grife, as duas iam para os melhores salões do Rio de Janeiro.
Sua mãe também tinha essa mordomia, porém não era o suficiente; faltava a presença, o amor e carinho, sentimentos que coisas materiais não substituem. Até que saiu na televisão, no programa de fofoca, que o senhor Gonçalves estava tendo um caso com uma de suas colegas de trabalho. Pior maneira de descobrir uma traição.
Então, decidiram que mesmo o casal estando separado, ele continuaria pagando a faculdade. Ele era um mau marido, mas, em compensação, era um bom pai. Sempre conversava com ela por telefone, arrumava um jeito para passar um final de semana com ela. Mas ela me contou que depois que fez uma viagem de negócios para o Canadá, ele não retornou mais as ligações. A mãe dela disse que deveria ser o trabalho, então ela parou de se preocupar.
- Ontem minha mãe recebeu uma ligação do diretor Roriz. Ele disse que meu pai parou de pagar e perguntou se ela pagaria. Ela disse que não, foi quando ele disse que abriu uma vaga de uma bolsa de 100% e que tenho que fazer uma prova hoje! Hoje, Bruno! - Encostou a cabeça no banco do carro. Estava aflita.
- Por isso que você está nervosa? - Já sem o cinto, me viro, olho para ela e pego na sua mão.
- Estou estudando desde ontem, quando minha mãe me contou... E agora, Bruno? - Cai uma lágrima de seu rosto. Droga! Chega a doer meu peito vê-la naquele estado. - Se eu não co...
- Nem se atreva a pensar isso. - Coloquei minha mão na sua boca. Não deixei que terminasse a frase. - Você consegue. É a garota mais inteligente que conheço. - Seguro seu rosto e enxugo a sua lágrima. - Lembra que teve uma prova surpresa na aula de literatura na semana passada? - Tento animá-la. Me ajeito no banco, colocando o cinto de segurança, e ligo o carro.
- S... Sim... E tirei a maior nota. Nem acreditei. Até o professor me elogiou. - Ela sorri. Detalhe: um sorriso lindo!
- Então? Você consegue! Pense positivo. - Digo.
- Tem razão, Bruno! Vou pensar positivo. Isso não vai me abalar. - Ela coloca o cinto e dá um tapa no livro que está no seu colo.
- Isso aí. - Depois de animar minha amiga, voltamos a ouvir o rádio. Ela começa a dançar e nos divertimos. Com isso, nem percebemos que chegamos ao estacionamento da faculdade. Ela voltou a ficar nervosa, e eu peguei na sua mão para acalmá-la.
- Vai dar tudo certo, Carina! Estou aqui! - Digo, e ela me abraça.
- O que seria de mim sem você? - Ela se afasta e me olha nos olhos. - Obrigada por estar ao meu lado. - Me beija no rosto e não digo nada, só balanço a cabeça. Saímos do carro e fui com ela até a sala do diretor. Porém, sinto meu coração bater mais forte depois do seu beijo. Que merda está acontecendo comigo?