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CHIARA
Só podia estar em meu inferno astral.
Acordei com o despertador berrando, e quis jogar o celular contra
a parede. Olhei rapidamente as horas, após desligar aquela merda, e vi
que ainda eram oito da manhã. Suspirei, sabendo que deveria ter dormido
no máximo vinte minutos. Uma noite em claro, bebendo até cair e
cantando sertanejo sofrência até Adele, fora o que me restou. O sábado
de folga que tanto almejei, de repente, seria apenas a base para dormir o
dia todo, diante da ressaca causada por vodca, vinho e rejeição.
- Saúde as pobres almas apaixonadas por cretinos de terno e
gravata. - Ironizei para o quarto vazio, e suspirei profundamente.
Apenas a lembrança do porque tinha aquela dor de cabeça, faziame querer pegar as garrafas deixadas no entorno de minha cama, e
quebrá-las na cabeça de Cael, da forma como ele quebrou meu coração.
Liguei a televisão, e de repente, fui presenteada com o volume no
máximo e a música que continuava minha terrível playlist de sofredora
com álcool no youtube. Assim que Fergie cantou que garotas grandes não
choram, revirei os olhos, discordando por completo.
- Garotas grandes choram e muito, só que com álcool como
acompanhante.
Minhas reflexões sozinhas, eram tão necessárias quanto eu para
Cael. O dia mal começou e apenas queria esquecer que de fato existia.
Melhor, esquecer que Cael existia. Porém, o maldito era a causa de estar
daquela forma. Ainda mais, por ser um insensível. Soltei o grito entalado
na garganta, e levei as mãos aos cabelos. Como pude esperar algo?
No fundo, iludindo-me de que era diferente. O carma de toda
mulher apaixonada, e pensa que vai ser a diferente para o cara. Às vezes,
simplesmente, não era para ser. No meu caso, impossível. Assim como,
dispensei várias mulheres durante os dois anos trabalhando com ele, fui
apenas mais uma. Tão clichê e dramático, que de repente, me peguei
ouvindo Marília Mendonça.
A cabeça a ponto de explodir e o corpo mal se acostumando a
estar de pé novamente. Era uma péssima rejeitada.
"Sei
Que o pra sempre virou pó
E na cabeça deu um nó
Mas eu tô bem consciente
Mas amei
Amei sozinha, mas por dois
Me conformei que agora, e não depois
Vou ter que seguir em frente
Preocupa não
Que eu não vou bater no seu portão
Preocupa não
Que não vai ver mais o meu nome em nenhuma ligação
Preocupa não
Que eu vou tomar vergonha na cara
Preocupa não
Pra um bom entendedor, meia ausência basta"
Meu celular despertou mais uma vez, tirando-me do momento
gritando minha dor besta. Soltei um grunhido e peguei o aparelho a ponto
de querer jogá-lo na parede. O que me surpreendeu não foi o fato do
despertador ter decidido me infernizar, mas do número que me ligava –
Anne Liv. Massageei minhas têmporas, e peguei o controle, baixando o
som da televisão. Respirei fundo e atendi o telefone.
- Bom dia, perfeitinha.
Sorri diante do cumprimento de Anne, mesmo que minha vontade
fosse me esconder de qualquer um de sua família. Mesmo tendo certeza
que nenhum deles tinha a mínima ideia de meu envolvimento com Cael.
Na realidade, éramos discretos ao extremo. Como era sua assistente
pessoal, não abria chance para desconfiarem. Ao menos, nunca fora um
assunto em pauta em nenhuma revista de fofoca ou até mesmo, em roda
de amigos e nos corredores da empresa.
- Olá, ex chefinha preferida.
- Nisso tenho que concordar. - Anne Liv e sua autoestima
infinita. - Agora mesmo fui te procurar, e adivinha minha surpresa
quando não te achei?
Fechei os olhos, imaginando que dali um dia, voltaria para a
empresa e assim, encararia Cael. Tinha que deixar o sofrimento para o
momento, porém, minha ansiedade já conseguia me fazer sentir vergonha
de reencontrá-lo após aquela declaração catastrófica. Teria aquele fim de
semana para trabalhar minha frieza e ser impecável no trabalho. Sem
brecha para que lembrássemos do que aconteceu. Duvidava do fato de
que ele lembraria.
- Não devia estar no Rio? - indaguei.
- Bom, as reuniões aconteceram mais rápido e consegui voltar a
tempo de comemorarmos o aniversário do Cael. - Paralisei e minha
cabeça deu voltas. - Sei que ele odeia esse tipo de coisa, festa com a
família sabe? O jeito dele é sempre aquelas festas extravagantes cheio de
mulher pelada para todo lado... - ela soltou um som de nojo, e me
segurei para não pensar sobre.
Era a realidade. O fato era que organizei a festinha privada de seu
aniversário no ano passado, e sequer passei em seu apartamento no dia.
Andei até meu escritório, sem conseguir acreditar que andava tão
distraída. Abri o planner e me deparei com o que sequer imaginava ser
naquele dia.
Festinha privada – Cael
Suspirei, sentindo-me uma completa idiota. Aquele evento fora
programado há meses, e sequer fiquei atenta ao que acontecia. O fato era
que meu coração e mente se embaralharam no meio do caminho, e tentei
evitar pensar que não éramos exclusivos, muito menos, jurou-me
fidelidade. A que ponto chegamos, em Chiara?
- No que posso ajudar? - perguntei por fim, jogando-me contra
a cadeira. Minha cabeça parecia doer ainda mais, e logo senti um peso
sobre meu corpo. Sorri para Noctis, meu gatinho de apenas três meses,
que se emaranhou em meu colo, e fechou os olhinhos. Ao menos, tinha
um amor real bem ali.
- Bom, tem tempo para cancelar tudo? - engoli em seco e
arregalei os olhos. - Sei que é sua folga, mas... Mamãe e eu queremos
fazer algo diferente para Cael, e bom, se ele estiver na putaria, não
teremos como.
- Anne... - engoli em seco, imaginando o quanto aquilo
poderia ser errado. - Não sei se posso fazer isso. Pode custar meu
emprego.
Passei as mãos em Noctis, que parecia uma bolinha de pelos
negros. Olhei para os números anotados em meu planner, logo abaixo do
evento, e comecei a maquinar o que poderia ser feito. Seria uma
vingança de acordo acabar com sua festinha de aniversário que não
passava de uma suruba? Sequer conseguia entender como me esqueci
por completo do aniversário de Cael. Ao menos, no ano anterior,
comprei-lhe um presente. Sequer tinha lembrado daquela vez. Minha
mente, com certeza, focou tanto em querer ser sincera com ele, que
deixei todo o resto se tornar irrelevante.
- Então, talvez, possa me passar os números das pessoas que
combinou e... eu me encarrego de cancelar tudo. - a voz provocativa de
Anne Liv surgiu do outro lado da linha e tive que sorrir. Ela era o
tormento de Cael: fato.
- Tudo bem. - acabei por concordar e repensei o que de ruim
poderia acontecer. - Se ele me demitir, volto a ser sua assistente. -
negociei e ela gargalhou alto.
- Amo fazer negócios com você, senhorita Moreira.
- Sei. - Sorri de sua determinação. - Vou te mandar uma foto
com os números por mensagem.
- Certo. Já até organizei o jantar de aniversário para ele, no
meu apartamento, e ele sequer tem ideia. - comentou e levei o cotovelo
ao tampo da mesa, querendo apenas esquecer. - Aliás, está mais do que
convidada.
Fechei os olhos com força, pois já esperava por aquilo.
- Não posso, Anne. - Engoli em seco. - Tenho um encontro
justamente hoje, e é bom, um velho amor... Enfim, é complicado. -
Lembrei-me do filme que estava ansiosa para rever; bom, seria um ótimo
reencontro com Matthew McConaughey.
- Sabia que existia alguém nesse coraçãozinho. - Sua fala me
pegou desprevenida. - A maioria das mulheres acerca de meu irmão
parecem que caem de amores, e você, sendo tão próxima... aposto que
percebeu os defeitos e mais, tem alguém em sua vida.
- É.
Se ela soubesse...
- Ok, vou te deixar descansar e se preparar para o encontro. -
por mais horrível que pudesse parecer, estava dando graças a Deus por
Anne Liv me deixar em paz. Ela foi uma ótima chefe e era uma ótima
amiga. Entretanto, não era o meu dia para conversa. - Obrigada pela
ajuda, perfeitinha.
Sorri de seu apelido.
- De nada, Anne. Até mais!
Ela desfez a ligação, e em seguida, tirei a foto da folha do planner
e lhe mandei, sabendo que ela teria que ser rápida para cancelar tudo. Por
fim, poderia ficar em paz. Noctis se remexeu em meu colo, no momento
em que cliquei na galeria. Não era fã de fotos, mas ali existiam algumas
que eram especiais. Principalmente, algumas tiradas em momentos
bêbados com Cael.
Toquei seu sorriso perdido, que tanto pensei ser meu, e que
implorei internamente para que fosse. Suspirei, deixando uma lágrima
descer. Amar doía. Principalmente ele. O amava por coisas tão pequenas
e momentos tão únicos, que duvidava que fosse de fato algo congruente
com o tamanho do sentimento. O problema era que encontrava amor
onde não devia.
- É, Noct. - Sorri para meu pequeno. - Vamos superar isso!
Disse em voz alta, para ver se atraía. Quem sabe o universo me
presenteava com a superação. Um amor só se cura com outro, era o que
mais ouvia. Esperava poder superar o que sentia por Cael, sem me
complicar ainda mais.
O amor de Noctis contava?
Passei as mãos por seus pelos e sorri. Naquele momento, tinha
que bastar.