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- Problemas no paraíso? - Santiago perguntou tirando o capacete, a encarando com um leve sorriso.
Ela o olhou apertando os olhos não querendo demonstrar sua irritação, mas sem conseguir disfarçar.
- Vamos? Te dou uma carona. - Ofereceu.
Sua roupa estava suja de graxa e de poeira. Os cabelos amassados por conta do capacete. Os olhos vivos e negros fixos nela.
Ana recusou.
- É sério? - Não acreditou. - Se não ficar muito perto não vai se sujar, minha irmã anda comigo o tempo todo e está sempre limpinha e cheirosa, bom eu acho. - Brincou abrindo um sorriso de canto a canto lhe tomando o rosto inteiro ao ponto de fechar os olhos.
Deveria ser pecado alguém ser tão bonito! Ainda mais sendo o cara mais mulherengo e rebelde de uma cidade pequena com tão poucas opções de modelos masculinos.
Se não fosse o histórico dos dois até poderia pensar que a tivesse escolhido para sua próxima vítima. Era estranho vê-lo assim "normal," geralmente se dirigia a ela apenas para a irritar com alguma brincadeira sem noção com o propósito de provocá-la. Os sorrisos que a direcionava eram sempre sarcásticos ou de deboche. Tê-lo assim a tratando com gentileza chegava a gerar um quentinho em seu coração.
- Ana? - O ouviu chamar a trazendo de volta se dando conta de que estivera perdida em seus pensamentos.
- Não é isso. Onde ela está? Por que ela não está com você? - Falou muito rápido deixando aparente o seu desconcerto pelo charme do rapaz.
- Ela pegou carona com uma amiga. Quando cheguei já estava dentro do carro. Então apontou em sua direção e me lembrou que te devia um pedido de desculpas pelo susto de hoje cedo. Aliás, dona moça, deveria olhar para os lados antes de atravessar a rua, e se eu tivesse te atropelado? - Aproveitou a oportunidade para chamar a sua atenção.
E lá estava o velho Santiago de guerra...
Como podia ser tão cínico, não havia acabado de dizer que lhe devia desculpas? Como de repente a culpada passou a ser ela e ele estando no direito de lhe dar bronca?
Como aquele idiota tinha o poder de a irritar tanto?
- Não ia me atropelar. Eu vi que estava vindo e calculei o perigo. - Disse de supetão a primeira coisa que lhe veio a mente.
- Quê? Calculou o perigo? Como assim? - E o sorriso sarcástico também estava de volta.
- Ah, esquece! - Explodiu sem paciência, nenhum um pouco disposta a tentar explicar. - Obrigada por me oferecer a carona, mas não será necessário, estou bem do jeito que estou. - Continuou orgulhosa.
- Aham, tô vendo mesmo... - E ele a provocando. - Acha que chega até onde com esse sapato? Já imaginou as bolhas terríveis nos seus pés? A dor...
Mas mesmo sendo um cretino se aproveitando de situação, Santiago tinha razão e ela sabia disso.
Se viu entre a cruz e a espada.
Não aceitar a carona oferecida por ele seria tragédia na certa, mas ao mesmo tempo não se sentia a vontade para subir em sua moto.
- Vamos? - Insistiu. - E olha, é a ultima vez que eu ofereço, preciso trabalhar depois do almoço, não tenho o dia todo. - Foi falando acelerando a moto, e saindo bem devagar para que ela tivesse tempo de aceitar.
- Tá. Eu aceito! - Rendeu-se a contra gosto. - Obrigada!
O sorriso de satisfação nos lábios do rapaz.
E que sorriso!
Como podia ser tão bonito!
A combinação perfeita. Os cabelos castanho escuro, os olhos negros e vivos, se alinhando com o sorriso de dentes brancos feito leite. A pele morena tostada pelo sol. E tudo isso envolto por uma capa de rebeldia.
Santiago a passou o capacete reserva e Ana o ajeitou na cabeça. Subiu na moto temerosa ainda não convencida de que aquela era uma boa idéia.
A moto mal se encaixou na estrada e o rapaz acelerou, ela mais do que depressa, sem pensar, o abraçou forte enlaçando os braços em seu corpo, colando as mãos uma na outra na altura do abdômen dele, que possuía uma aparência magra visto de longe, entretanto, tendo a oportunidade de tocá-lo Ana percebeu que por debaixo da camiseta surrada cheirando a graxa tinha mais do que um corpo esquelético, havia músculos. E ela não pode deixar de imaginar o rapaz com o abdômen a mostra.
- Na próxima você vira a direita. – Gritou esforçando para que fosse ouvida, lutando contra o bloqueio do capacete e ainda mais contra a força do vento.
Santiago por sua vez fingiu não escutar acelerando ainda mais a moto passando reto estrada a fora.
Ana sentiu o estômago gelar. Sabia que não deveria ter aceito a carona. Com a mão direita encerrada em punho golpeou na costela do rapaz chamando sua atenção. Ele a olhou virando ligeiramente a cabeça para a esquerda.
- Você tinha que ter virado la atrás. -Dirigiu-lhe um olhar de fuzilamento.
- Relaxa! E aproveita a viagem. - Ele gritou. - Nós temos tempo.
O rapaz ligou a seta indicando que entraria a esquerda, e assim o fez. Ana respirou fundo. Não havia o que fazer. Já cometera o erro de subir naquela moto, saltar naquela velocidade não seria uma boa idéia. Tudo que lhe restava era confiar e esperar para saber o que Santiago pretendia. E se a levasse a algum lugar com má intenção tentaria se defender de qualquer jeito. Elaborou um plano. Assim que a moto parasse saltaria e correria procurando por qualquer coisa com a qual pudesse se defender, um pedaço de madeira, pedra...
Santiago acionou mais uma vez a seta e dessa vez foi para a direita. Virou o rosto para olhar a garota que tinha os olhos arregalados de pavor e medo.
- Relaxa! - Ele gritou mais uma vez fazendo sinal com a cabeça apontando para o lado.
Caramba! - Santiago não a estava seqüestrando, levando para algum lugar deserto. Apenas tomou o caminho mais longo pelo privilegio da vista ao contornar o pequeno lago da cidade desfrutando da sombra das árvores que se estendiam por ambos os lados da estrada.
Por toda a extensão do parque havia plantação de flores e naquela época do ano em especial tudo ali parecia ainda mais belo e perfeito. Pela primeira vez afrouxou os braços ao redor do corpo do rapaz abandonando a tensão.
Contornaram o lago em questão de minutos. Ali era o lugar onde as pessoas da cidade aproveitavam para se conectarem com a natureza. No final da tarde aquele era o destino de muitos para ali permanecerem até tarde da noite.
Àquela hora, no entanto, o lugar estava deserto, apenas um ou outro caminhando por ali, dando uma sensação de paz ainda maior.
Eram os pássaros e pequenos animais que dominavam naquele horário, a vontade era de deitar debaixo de uma daquelas arvores e se deixar flutuar perdida no silêncio calando os pensamentos.
A estrada que Santiago optara para seguir contornava a cidade pelo lado de fora, de pouco movimento, o que lhe dava a liberdade para acelerar. Ana não ousou sentir medo pela aventura não pedida.
A sensação de liberdade, a velocidade, o vento batendo forte contra si, não saberia descrever o que estava sentindo...
Seria contraditório dizer que o perigo eminente era o que lhe trazia a paz interior? E por que seria necessário descrever qualquer coisa? Não queria pensar, não queria explicar...
Aquilo era bom! E seria capaz de permanecer de olhos fechados sentindo o vento a tocar o rosto com brutalidade pelo tempo que Deus se dispusesse a lhe dar esse presente.
Que pelo jeito não era muito, pois, naquele mesmo instante o rapaz reduziu a velocidade e virou na próxima rua a direita.
Voltando a acelerar em seguida ganhando mais uma vez velocidade, para então reduzir. Virou outra vez entrando á direita e logo a esquerda. Indo em baixa velocidade até parar a moto em frente pequena casa de cor amarela.
- Pronto! Entregue, sã e salva! - Disse ao tirar o capacete e esperar que ela fizesse o mesmo.
Ana sorrindo entregou o que acabara de usar. Seus cabelos soltando-se, caindo por sobre suas costas.
- Obrigada!
Santiago sorriu de volta.
O que tinha naquele sorriso que parecia a prender em um encanto hipnótico? O contemplaria pelo resto da vida se fosse permitido.
Viu quando a irmãzinha denunciou sua chegada á mãe, bisbilhotando pela janela. Sabia que teria problemas. Onde já se viu uma moça aceitar carona de rapazes, o que os vizinhos irão falar? Era o que provavelmente escutaria...
O rapaz percebendo sua inquietação, entendendo que era hora de ir guardou o capacete reserva, e olhando fixamente nos olhos da garota tornou a colocar o seu, os olhos denunciando o um sorriso.
- Se não tivesse vindo comigo aonde estaria?
Disse a lembrando de seu pesadelo, olhando rápido para os pés se certificando de que a sola ainda estava no lugar que lhe correspondia. Sim! Ainda estava ali.
- Obrigada! - Foi tudo que conseguiu pronunciar ao ver que chegara em segurança em casa, envergonhada por pensar coisas tão terríveis a seu respeito.
- Se cuida!
Ela levantou a mão gesticulando a despedida.
A moto foi ligada e acelerando se foi.
Ana tirou os sapatos e entrou para dentro de casa encontrando a mãe apostos.
- Por que demorou tanto? – Seu semblante demonstrava sua irritação. - Quem te trouxe? - Disparando antes mesmo que a filha respondesse a primeira pergunta.