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Chloe Narrando
Me arrumei na força do ódio. Não era como se eu estivesse empolgada para sair essa noite, mas o dinheiro não entraria sozinho. Coloquei uma lace nova, algo diferente do que costumo usar. Geralmente, fico entre os tons loiros e ruivos, sempre em cortes curtos e práticos, mas essa, essa era longa, descendo até a metade das minhas costas.
Terminei de me arrumar e encarei o espelho. Realmente, eu sou linda. O tipo de beleza que faz homens abrirem carteiras sem pensar duas vezes. Pena que não era assim que eu gostaria de usar minha aparência.
Escolhi uma roupa que sabia que chamaria atenção. Um vestido justo de couro preto, curto o suficiente para exibir minhas coxas torneadas, mas longo o bastante para não parecer vulgar de imediato. O decote era profundo, destacando meus seios fartos. Por cima, uma jaqueta cropped de vinil, só para dar um toque mais ousado. As meias arrastão cobriam minhas pernas, levando o olhar direto para os saltos agulha vermelhos, chamativos e perigosos. Coloquei um batom escarlate e finalizei a maquiagem com olhos bem marcados.
Peguei minha bolsa, conferi se tudo estava ali , dinheiro trocado, celular, preservativos, spray de pimenta e saí do quarto. Assim que cheguei na sala, encontrei minha mãe largada no sofá, assistindo TV.
- Olha só essa maravilha - disse ela, com um sorriso satisfeito. - Você fica cada dia mais linda. Se eu fosse mais jovem, ia querer te derrubar do trono.
Revirei os olhos, já esperando esse tipo de comentário.
- Nem trono eu quero, imagina coroa. - Dei um sorriso sarcástico e me inclinei para beijar o topo da cabeça dela.
- Ah, para com isso, Chloe. Você ganha mais dinheiro do que eu ganhei na vida toda. - Ela riu e balançou a cabeça, orgulhosa. - Passei minha coroa de prostituta próspera para você.
- Essa coroa eu dispenso.
Ela riu mais alto.
- Fala isso agora, mas quando ver a grana que vai entrar hoje à noite, aposto que vai me agradecer.
Ignorei o comentário e fui até a porta. Eu evito discutir com minha mãe, especialmente porque sua saúde está cada vez mais debilitada. Não adianta brigar. Ela sempre foi assim. Sempre viu a prostituição como um caminho natural, uma herança. Para ela, se eu estava ganhando dinheiro e vivendo bem, o resto não importa.
Mas para mim importa e muito.
Sai de casa sem olhar para trás, sentindo o vento frio da noite bater em meu rosto. Acendi um cigarro e segui para casa mãe. Mais uma noite. Mais um trabalho. Mais uma parte de mim sendo vendida.
Assim que cheguei na casa, mãe Euclides já me esperava. Hoje, eu ficaria no ponto dele, um lugar bem localizado perto do Centro. Nunca havíamos trocado uma palavra até aquele momento, e para ser sincera, eu preferia assim. Ele é um dos grandes nesse meio, alguém que todos respeitavam ou temiam.
Entrei no carro e fechei a porta, sentindo o cheiro forte de cigarro misturado com couro do estofado. Euclides não perdeu tempo, já começou com gracinha.
- Antes de te levar pros clientes, que tal eu experimentar primeiro? - disse ele, com um sorriso sujo.
Olhei para ele sem nenhuma paciência e respondi, firme:
- Trezentos dólares e um quarto de motel. Não sou cadela pra transar na rua.
Ele soltou uma risada baixa, parecendo se divertir com a minha resposta. Então, sem aviso, tentou tocar na minha coxa. Minha reação foi instantânea: bati na mão dele com força, fazendo um estalo ecoar no carro.
Ele franziu o cenho e se virou para mim, visivelmente irritado, vindo para cima. Mas eu já estava preparada. Botei a mão dentro da bolsa e puxei o spray de pimenta, apontando direto para o rosto dele.
- Guarda isso aí, garota - ele disse, levantando as mãos em sinal de rendição. - Eu mereço um pouco mais de respeito.
- Estou te respeitando - retruquei, sem abaixar o spray. - Falei o valor do meu programa e as condições. Foi assim que aprendi com Bandeira. Ou quer que eu leve essa sua gracinha pra Zilda? Ela vai adorar saber.
Na mesma hora, o sorriso sumiu do rosto dele. Sua expressão ficou tensa, e vi seus dedos apertando o volante com força. Ele forçou uma risada seca.
- Era só brincadeira, Chloe. Não precisa ficar tão na defensiva.
- Aham, sei. Agora dirige.
Ele não respondeu, apenas ligou o carro e saiu cantando pneu. Eu guardei o spray, mas continuei com a bolsa no colo, pronta para reagir se precisasse.
Sei bem como funciona esse mundo. Se abaixasse a cabeça uma vez, ia passar a vida toda sendo pisada. E isso eu não aceito.
Assim que chegamos ao ponto, vi que já havia três mulheres por lá. Veteranas. Mulheres mais experientes que eu, que já conheciam cada detalhe dessa esquina. Euclides estacionou e saiu do carro comigo, indo direto até elas.
- Essa aqui é a Chloe - ele disse, me apresentando sem muita cerimônia. - Ordem da Zilda, ela vai ficar com vocês.
Nenhuma delas demonstrou surpresa. Também não fizeram questão de me cumprimentar. Uma delas, morena de cabelos curtos e olhos afiados, apenas cruzou os braços e desviou o olhar. A outra, loira, acendeu um cigarro sem nem fingir interesse. A terceira, uma ruiva de pele marcada pelo tempo, soltou um suspiro e revirou os olhos, como se eu fosse apenas mais um incômodo.
Já esperava esse tipo de recepção. Aqui, respeito não se ganha com palavras, mas com atitude.
Não fiz questão de puxar assunto. Apenas me encostei num canto, ajeitei a alça da bolsa no ombro e esperei. Felizmente, não precisei ficar ali muito tempo. Um carro preto de luxo encostou, o vidro desceu, e um homem de terno escuro me analisou de cima a baixo.
- Você - ele disse, apontando para mim. - Quero a noite toda.
Sem hesitar, me aproximei e me inclinei para falar com ele.
- Dois mil dólares adiantados. Motel à minha escolha.
Ele sorriu e pegou a carteira.
- Entra.
Abri a porta e entrei no carro sem olhar para trás. Sabia que as veteranas estavam me observando, talvez se perguntando se eu voltaria viva, talvez apenas com inveja.
E essa noite, eu já garanti a minha diária.