Havia algo no ar, algo que a perseguia, uma sensação de que as peças de sua vida estavam desmoronando e que nada poderia devolvê-las à forma certa.
Enquanto revisava alguns papéis em sua mesa, um objeto diferente chamou sua atenção entre os papéis espalhados. Uma carta. Uma carta simples, sem remetente, sem qualquer indício de quem a havia deixado ali. Estava dobrada com cuidado, como se alguém tivesse se dado ao trabalho de garantir que ficasse oculta, que não fosse vista. Ana franziu a testa, sentindo um calafrio percorrer sua espinha ao olhar para ela. Havia algo inquietante naquele envelope, algo que a fazia sentir-se exposta, como se, de alguma forma, estivesse prestes a descobrir um segredo enterrado, uma verdade perigosa demais para ser revelada.
Ela pegou a carta com as mãos trêmulas, respirando com cautela antes de abri-la. Ao fazê-lo, seus olhos percorreram as palavras rapidamente, como se seu corpo tentasse se adiantar à sua mente, temeroso do que pudesse encontrar. Mas quando leu a primeira mensagem, algo em seu peito se congelou.
"Se soubesse o que aconteceu naquela noite, não ficaria ao lado dele."
O impacto foi direto, implacável. Ana deixou a carta cair sobre a mesa, sua mente se desbordando em um turbilhão de pensamentos. "A noite"... a qual noite se referia a carta? Seria a mesma noite que havia marcado um antes e um depois em sua vida, a noite do acidente? Ou havia algo mais que ela não havia percebido até então?
A carta era críptica, ambígua, mas a ameaça de suas palavras era clara. O que essa pessoa sabia? O que se escondia nas sombras de seu casamento, algo tão sombrio que poderia destruí-lo se fosse revelado? Um suor frio percorreu sua testa enquanto ela tentava assimilar o conteúdo.
De que "noite" ela falava? O que havia acontecido que ela não sabia?
As lembranças começaram a se tornar mais vívidas, mais inquietantes. Pensou em Sebastián, pensou em Gabriel, pensou na estranha tensão que sempre pairava no ar quando os dois estavam juntos, aquela espécie de corrente elétrica invisível que parecia uni-los de algum modo. Havia algo mais entre eles do que ela tinha percebido? Havia algo que Sebastián lhe ocultava, algo que ele não queria que ela soubesse?
Uma onda de dúvidas a invadiu. Ela se levantou da cadeira e começou a andar pela sala, de um lado a outro, sem encontrar descanso. Quem tinha deixado aquela carta? A caligrafia era desconhecida para ela, não era a letra de Sebastián, nem a de Gabriel, nem de ninguém que ela pudesse imaginar. Mas havia algo em seu conteúdo que a perturbava de maneira visceral. O medo de enfrentar a verdade era o que a mantinha imóvel, embora, ao mesmo tempo, sua necessidade de respostas a empurrasse para a ação.
- O que aconteceu naquela noite? - ela sussurrou, quase num murmúrio, sentindo-se presa entre o amor que ainda sentia por Sebastián e o abismo de possibilidades que se abria diante dela.
Ana sabia que não poderia ignorar o que havia encontrado. A carta, com sua mensagem ambígua, havia sido um golpe direto, mas também lhe oferecia uma pista, um indicativo de que algo estava profundamente errado. Ela não podia seguir em frente sem respostas. Mas, quem confrontar? Sebastián, seu marido, que sempre fora sua rocha, mas que agora parecia esconder algo? Gabriel, o enigma que havia ressurgido em sua vida com uma força perigosa?
Ela decidiu que não poderia tomar nenhuma decisão sem entender o que realmente havia acontecido, sem conseguir juntar as peças do quebra-cabeça. Se a carta falava de uma "noite", deveria ser uma noite crucial, algo que havia ficado enterrado no tempo, mas que agora começava a ressurgir como uma sombra, pronta para revelar segredos que talvez ninguém estivesse preparado para ouvir.
O som dos passos de Sebastián pelo corredor fez com que ela parasse imediatamente. Ele havia chegado, provavelmente após um longo dia de trabalho. Ana pegou a carta com as mãos firmes, escondendo-a rapidamente entre as folhas de um caderno que estava sobre a mesa. Sua mente estava em um caos, mas seu rosto mostrava calma. Ela precisava de tempo. Precisava de respostas, mas não podia confrontar Sebastián sem estar preparada.
Quando Sebastián entrou no estúdio, seu olhar imediatamente se fixou nela. Ele parecia exausto, mas não tanto a ponto de não notar sua quietude tensa.
- Está tudo bem, querida? - ele perguntou, sem suspeitar o que estava se passando na mente de Ana.
Ana o olhou nos olhos, e por um instante, sua mente passou rapidamente por todas as respostas possíveis, pelas mil perguntas que ela ainda não teria coragem de fazer. Mas algo dentro dela lhe dizia que aquele momento não era o certo. Não agora.
- Sim, está tudo bem. - ela respondeu com um sorriso tenso, quase imperceptível, que escondia a tempestade interna que a abalava.
Sebastián a olhou fixamente, como se quisesse dizer algo mais, mas se conteve. A incerteza pairava entre eles, uma presença desconfortável que nenhum dos dois se atrevia a abordar.
Ana sabia que em breve enfrentaria a verdade, mas ainda não estava pronta para conhecê-la. Algo em seu coração lhe dizia que, o que quer que tivesse acontecido naquela noite, mudaria sua vida para sempre. E talvez, também mudaria a vida de Sebastián para sempre.
Enquanto ele se retirava para a sala, Ana não pôde deixar de pensar que não importava o quanto se esforçasse para esconder, o mistério estava no ar, e cada vez mais ela sentiria ele a envolver.