Capítulo 5 Gustavo

Gustavo Narrando

Já tinha dado o prazo que eu dei para Antônio, e hoje é dia de cobrar ele daquele jeito. Eu sabia que ele ia tentar me enrolar, mas dessa vez não ia dar mole. Estava tudo preparado, eu já tava de boa na boca, resolvendo umas paradas, quando o rádio chiou e um dos menores da contenção me chamou.

- Ô, Diabo, o velho tá querendo subir, mano. - o menor falou rápido, já sabendo que eu não gostava de perder tempo.

Levantei da cadeira de um jeito rápido, mandando o pessoal me deixar tranquilo. O Antônio ia aparecer, e dessa vez não tinha volta. Ele podia tentar o que fosse, mas não ia escapar da cobrança.

- Deixa o velho subir. - falei, firme, já sabendo que a conversa ia ser quente.

No fundo, eu sabia que ele vinha com alguma desculpa. Mas o tempo já tava contado, e eu não ia mais ouvir "vou resolver". O negócio ia ser resolvido na hora.

Me preparei pra o que vinha, me ajeitando, dando uns toques nos caras que estavam comigo. O barraco de Antônio tava no asfalto, uma quebrada onde tudo se resolve na hora certa, sem enrolação. Eu não ia deixar passar mais um minuto. Ele sabia que o tempo dele tinha acabado.

Quando o velho entrou na sala da boca, eu já tava lá, de boa, esperando. Mas, na hora que ele entrou, eu vi logo: o cara tava tremendo todo. As mãos, o rosto, o corpo inteiro. Ele tava nervoso, e não era pouco. Não demorou pra eu soltar uma risadinha, porque eu sabia que ele tava no desespero.

- E aí, Antônio... tá nervoso, né? - falei, com aquele sorriso de quem já sabia o que tava rolando. - Não tem mais como fugir, irmão. O tempo já acabou.

Ele ficou parado ali, balançando a cabeça, tentando se manter firme, mas era óbvio que o medo tava tomando conta dele. Me ajeitei na cadeira, sem pressa, só esperando ele se decidir. E foi quando ele, com a voz meio trêmula, jogou a proposta que me deixou no mínimo... surpreso.

- Eu sei que você tá cobrando, Diabo... - ele falou, engolindo seco. - Mas eu tenho uma solução. Minha filha... minha filha é virgem. Eu ofereço ela em troca da dívida.

Meu cérebro até deu uma travada. O que ele tava dizendo? Oferecer a filha dele? Eu olhei pra ele, sem acreditar no que tava ouvindo, mas ao mesmo tempo, senti uma mistura de interesse e raiva crescer dentro de mim.

- Como é que é? Tu tá me dizendo que vai pagar a dívida oferecendo sua filha pra mim? - perguntei, quase rindo de nervoso, sem saber se tava sendo mais irônico ou irritado.

Ele ficou ali, quase implorando, como se fosse uma troca justa.

- Ela é jovem, Diabo... ela vai pagar o que eu não consigo. Ela é... ela é boa.

Aquilo me deixou puto. Não era o que eu esperava. Eu não tava ali pra negociar com a moralidade de ninguém, mas tem coisas que até eu não ia aceitar, por mais sacana que eu fosse.

- Olha, Antônio, eu sou maluco, mas não sou porco, não. Não vou pegar sua filha não, irmão. - minha voz saiu mais dura do que eu queria, mas a raiva tomou conta. - Resolve a parada do jeito certo ou fica quieto, porque não vai ter jeito fácil.

Ele me encarou, tentando entender se eu tava falando sério. E, no fundo, sabia que tava. Eu não queria brincadeira de gente suja. O papo era outro, e ele devia arrumar o dinheiro, não me vir com essa merda.

O velho não parou de implorar, a voz dele ficou cada vez mais baixa, como se cada palavra tivesse um pedaço de orgulho a menos. Ele tava completamente sem saída, e aquilo me deu uma sensação estranha. Ele me ofereceu a filha dele, mas, no fundo, ele tava mais desesperado do que qualquer coisa.

- Por favor, Diabo, eu te peço... faz isso por mim, eu resolvo de outro jeito depois, mas não posso perder mais tempo! - o velho falava, quase aos prantos, e na cara dele dava pra ver que ele já tinha aceitado que não tinha mais escolha.

Eu fiquei ali, quieto, observando ele se retorcendo, vendo a humilhação no olhar dele. Eu até pensei em mandar ele embora, dar uma última chance pra ele arrumar a grana, mas ele me fez perceber que aquele era o único jeito que ele tinha de salvar a pele.

Foi aí que eu dei a resposta que ele não tava esperando.

- Beleza, Antônio, vou aceitar essa parada, mas já vou te avisar: nunca mais tu vai ver sua filha. Tu vai perder o direito de olhar pra ela, de cuidar dela. E se tentar se meter depois, vai ser pior. - falei, já sentindo que o acordo tava fechado.

Eu vi ele se contrair, todo corpo dele parecia se encolher, como se a ideia de perder a filha fosse mais pesado do que a dívida em si. Mas, mesmo assim, ele concordou.

- Eu vou dar um jeito de levar a menina até você sem que a minha mulher saiba. - Ele falou.

O velho se calou, aceitando o acordo. Mas, no fundo, eu sabia que ele ia tentar dar uma de esperto depois, e não ia ser fácil pra ele lidar com a situação que tava se metendo. No fim das contas, o problema dele era meu agora, e eu não ia deixar barato.

O clima na sala tava pesado, mas o acordo já tava fechado. O velho tinha aceitado a condição e, embora eu soubesse que ele não ia gostar de perder o controle sobre a filha, ele não tinha mais escolha. Ele tinha se metido em algo que não ia ter volta.

Olhei bem pra cara dele, sem pressa de fazer nada, só esperando ele digerir tudo que tinha ouvido. Ele tava ali, me encarando como se tivesse esperando um milagre, mas sabia que o único milagre que ele ia ter ia ser sair vivo dessa.

- Tá, Antônio, não quero mais ver tu nessa situação de novo, entendeu? Tu vai fazer tudo certinho, ou vai me ver de novo, e aí a história vai ser outra. - falei, deixando claro que eu não sou de brincadeira.

Ele não respondeu. Só abaixou a cabeça, como se aquilo tudo fosse o preço que ele tinha que pagar. Não ia ser fácil pra ele, mas nem tudo na vida é fácil, e quem entra na minha área tem que estar preparado pro que vem.

- Agora, da um jeito de trazer a garota pra mim, mas é tudo na surdina, no esquema. E se alguém souber, já era. A parada vai ser sem volta, e vou garantir que tu nunca mais veja nem sua esposa e sua filha. - Eu disse, sentindo a confiança tomando conta de mim.

O velho só assentiu, como se soubesse que eu não tava de brincadeira. Sabia que, com essa dívida paga, ele ia ter que engolir o resto da história, e que ia perder a filha dele no processo. Mas eu não tava nem aí pro que ele sentia. Eu tava ali pelo que era meu, e ia cobrar do jeito que fosse preciso. Virei as costas e saí da sala. Deixei o velho pra lá, sabendo que o acordo tava fechado e que, mais cedo ou mais tarde, ele ia se dar conta do peso de tudo que tinha feito. Não tinha mais volta, e a dívida dele era minha agora.

                         

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