Capítulo 5 QUATTRO

- O que você está fazendo? - questiona Madeleine.

- Procurando um livro.

- Qual?

- Ainda não achei - respondo rapidamente, tentando parecer casual.

Estamos na biblioteca. Eu vasculho as prateleiras atrás de A Divina Comédia, de Dante Alighieri. É dentro dele que vou esconder minha próxima mensagem para o garoto cujo nome ainda não sei - o que é ridiculamente frustrante.

- Você está estranha. Ainda se sente mal? - Madeleine pergunta, esticando-se nas pontas dos pés para espiar a prateleira acima de nós.

- Não, estou bem. Perfeitamente bem - digo, com um sorriso ensaiado.

- Entendo - ela comenta, mas continua me observando com atenção demais para o meu gosto.

Vou encontrá-lo no domingo. Tudo está correndo conforme o planejado: dizer que sou maltratada, despertar a piedade dele, fazê-lo querer me ajudar... e, com um pouco de charme bem aplicado, garantir que ele se apaixone o suficiente para não fazer perguntas quando eu começar a agir de forma, digamos, questionável.

- Allegra, olha esse livro que achei! - Madeleine parece estar empolgada com o livro, mas seu sorriso não alcança os olhos. Por quê? Talvez eu esteja imaginando coisas.

Finjo interesse enquanto, discretamente, retiro A Divina Comédia da estante. O bilhete já está pronto. Preciso apenas despistar Madeleine.

- Madeleine, desculpa te interromper, mas acho que não estou me sentindo bem - digo, colocando as mãos na testa. Finjo uma leve tontura. - Você poderia pegar um copo de água para mim, por favor?

- Claro, Allegra! Senta aqui. Eu vou num pé e volto no outro! - Ela sai correndo, mas não sem antes lançar um último olhar por cima do ombro. Sempre tão atenta. Ela desaparece pelo corredor, mas a porta da biblioteca demora mais do que deveria para bater. Fico com a estranha sensação de que ela ainda está ali, ouvindo.

Madeleine... o que você quer comigo? Algo em você me incomoda, mas ainda não sei o quê.

Levanto e caminho até a estante. Enfio o bilhete cuidadosamente no lugar certo: quarta estante, segunda prateleira, oitavo livro da fileira. Nosso ponto de encontro.

O domingo amanhece. Como de costume, estou encarregada da limpeza do pátio. Espero pelo horário do almoço, o momento ideal, já que todos estarão ocupados. Caminho até a biblioteca e, inicialmente, não o vejo. Mas então, um vulto passa atrás de uma das estantes. É ele. Ele veio.

- Você veio! Obrigada - digo, deixando transparecer um traço genuíno de felicidade.

- Sim. No começo, pensei em não vir... poderia me meter em confusão. Mas, quando li seu bilhete e vi que dizia "por favor, ajude-me, estou sendo negligenciada", não consegui ignorar. Fiquei preocupado. O que está acontecendo exatamente?

- Primeiro, me diga seu nome. Não sei como devo chamá-lo.

- Dante.

Claro que é Dante, como Dante Alighieri. Ah, o inferno de Dante. Sorrio comigo mesma.

- Dante, não temos muito tempo. Eu preciso da sua ajuda. Estou presa aqui há tantos anos, e elas são más comigo. Não me deixam comer, me colocam em trabalhos exaustivos e me batem - digo, enquanto mostro um hematoma roxo em minha pele. Hematoma este que eu mesma fiz me beliscando na noite anterior. - Este lugar não é nada do que parece. Por favor, não tenho mais ninguém a quem recorrer. - Talvez eu tenha exagerado um pouco no tom dramático, mas era necessário. Ele precisa entender o meu desespero, ou pelo menos acreditar nele.

- Meu Deus! Eu... achei que esse lugar fosse normal. Não imaginava que as freiras fossem... assim - ele parece genuinamente abalado.

- Mas por que eu? Por que pediu ajuda a mim especificamente? - ele pergunta, franzindo a testa.

- Tenho visto você me olhando - olho no profundo azul de seus olhos.

- Não sei do que está falando.

- Sabe sim. Todos aqueles domingos em que você passa por mim, no pátio. Te vejo me observando, me analisando - vou falando e me aproximando do seu corpo. - Você achou que eu não iria perceber? Sabe por que eu percebi?

- Por quê? - ele parece desconfortável. Suas pernas tremem. Tímido. Que fofo.

- Porque estou te olhando também - a essa altura, meu corpo já está quase tocando o dele. Posso ouvir nossas respirações, nossos pulmões trabalhando. Sinto o cheiro do seu hálito, mentolado. Ele respira mais rápido do que eu, obviamente.

- Por favor, não faça isso - ele se afasta rapidamente, visivelmente afetado.

Dou um leve sorriso.

- Não precisa ficar com vergonha. Me sinto assim em relação a você também - tento soar o mais romântica possível.

- Para. Eu sou um seminarista e você é uma freira, nós não podemos.

- Eu sei, eu sei. Me desculpe por ter sido invasiva - respondo com o olhar triste e abatido.

Ele está sério, me encarando. Será que fui com muita sede ao pote? E se ele desistir ou nem quiser tentar me ajudar? Acho que talvez eu tenha utilizado a abordagem errada. Merda!

- Vou te ajudar - ele diz, mantendo uma certa distância.

Bin-go!

- Sério? Obrigada, muito obrigada! - dou pequenos pulinhos de alegria. Eu consegui!

- Sim. Mas vou te ajudar porque, como servo do Senhor, devemos fazer a boa obra Dele aqui na Terra. E, se você está sendo maltratada, isso é contra as leis do Nosso Senhor Deus - ele fala, ajeitando o colarinho da batina.

- Claro. Obrigada, Dante. Deixei um bilhete para você dentro desse livro, A Divina Comédia. Ele vai ser a forma de nos comunicarmos. Aos domingos, quando você vier, vão ter mensagens para você dentro desse livro, e você pode me responder por aqui também. Assim, poderemos combinar a minha fuga.

- Está bem. Preciso voltar. Vou te ajudar, mas não repita as coisas que fez hoje - ele diz, nervoso e suando frio. Então vira as costas e vai embora.

Pobre peixinho, você ficou totalmente afetado apenas pela proximidade de nossos corpos. Acho que vai infartar quando eu conseguir roubar o seu primeiro beijo. Estou nas nuvens. Me aguarde, papai. Logo estarei de volta e vou fazer você se arrepender por todo o tempo que me deixou trancada neste lugar!

                         

COPYRIGHT(©) 2022