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O dia seguinte foi marcado por uma calma tensa, quase irreal, como se o mundo lá fora tivesse parado de girar para dar tempo àquela decisão. Mariana acordou com o coração apertado, o estômago pesado, e a sensação de que havia finalmente libertado algo dentro de si – mas, ao mesmo tempo, a liberdade parecia estar impregnada de um vazio imenso. O que ela mais desejava naquele momento era que Vinícius a tivesse procurado, que tivesse se mostrado vulnerável, que tivesse pedido, de alguma forma, para que ela ficasse.
Mas, em vez disso, ele a deixou no silêncio da manhã seguinte, como se as palavras que ela havia dito na noite anterior tivessem sido apenas um eco distante.
A mansão, com suas paredes de vidro e decoração impecável, parecia ainda mais fria naquele dia. Mariana se levantou da cama, olhou pela janela, e não viu nada além de uma cidade distante e inatingível. O céu estava cinza, e o vento parecia fazer com que as árvores tremessem em uma dança solitária. Era como se o próprio ambiente sentisse o peso da sua decisão, a responsabilidade de se distanciar de um homem que, até aquele momento, havia sido a linha tênue entre seu mundo de sonhos e a realidade das obrigações.
Ela desceu para a cozinha e preparou um café, tentando preencher o vazio com a familiaridade das pequenas ações. Cada movimento parecia uma tentativa de criar algum sentido, algum controle, em meio ao caos de sua mente. Mas o café ficou amargo, e a solidão se arrastava como uma sombra ao seu lado. Ela sentia falta de algo que não sabia exatamente o que era: talvez fosse da conversa fácil, do olhar cúmplice, da leveza que um relacionamento saudável poderia proporcionar. Mas não, o que ela mais sentia falta era de si mesma. Da mulher que havia sido antes de tudo isso.
O telefone tocou, interrompendo seus pensamentos. Ela olhou para a tela, e o nome de Raíssa apareceu. Mariana hesitou por um momento, mas então decidiu atender. A voz da amiga soou ao mesmo tempo familiar e reconfortante, como um refúgio em meio ao turbilhão que sua vida se tornara.
"Oi, Mari! Como você está? Eu estive pensando em você o dia todo..." A voz de Raíssa transbordava preocupação, e Mariana sentiu um nó na garganta. Ela queria dizer que estava bem, que tudo estava sob controle, mas as palavras não saíam.
"Raíssa..." começou Mariana, a voz falhando. "Eu... eu não sei como começar."
"Ei, ei, o que aconteceu? Está tudo bem?" Raíssa respondeu rapidamente, sentindo o tom de desespero em sua amiga. "Você está me assustando."
Mariana respirou fundo antes de falar. "Eu tomei uma decisão. Eu e o Vinícius... nós tivemos uma conversa. E eu acho que é hora de seguir caminhos diferentes."
Raíssa ficou em silêncio por um momento, como se tentasse processar as palavras de Mariana. Então, ela falou, com suavidade, mas também com um toque de incredulidade: "Você está dizendo que... vocês se separaram?"
"Sim", disse Mariana, a palavra saindo como um sussurro. "Foi uma decisão difícil, mas acho que não há mais nada entre nós além do que já está estabelecido. Eu não consigo mais viver assim, Raíssa. Eu estou sozinha, mesmo casada com ele."
A amiga suspirou do outro lado da linha, e Mariana sabia que, embora Raíssa estivesse preocupada, ela também a compreendia. Raíssa sempre fora mais espontânea, mais leve, e talvez não entendesse completamente as complexidades do casamento de Mariana, mas certamente sabia o que significava sentir-se sufocada e invisível. Ela não hesitou em falar com sinceridade.
"Mariana, você não pode viver sua vida esperando que ele mude. Eu sei que você queria mais, que queria uma conexão verdadeira, mas, pelo que você me disse sobre o Vinícius, ele não parece ser capaz disso. Talvez seja hora de você começar a viver por você mesma. Você tem todo o direito de ser feliz, de buscar o que realmente quer."
As palavras de Raíssa ressoaram como um alívio, como se, ao finalmente tomar aquela decisão, Mariana estivesse se permitindo respirar novamente. Ela não sabia o que o futuro reservava, mas naquele momento, ela sentiu que, ao menos, havia feito a escolha certa para si mesma.
"Eu sei, Raíssa. Eu sei. É só... é tão difícil. Eu me sinto perdida, sozinha, e o vazio dentro de mim parece crescer a cada dia. Não sei nem por onde começar, sabe?"
Raíssa fez uma pausa antes de responder. "A primeira coisa que você precisa fazer é não se culpar. Você não é a única responsável pelo que aconteceu. O Vinícius também tem sua parte nisso. Ele nunca te deu espaço para ser quem você realmente é, e, ao longo do tempo, você foi se perdendo nesse casamento. Agora é hora de se encontrar de novo."
Mariana não sabia o que dizer. Ela queria acreditar nas palavras da amiga, mas, no fundo, ela sabia que a solidão seria uma companhia constante até que ela pudesse encontrar seu próprio caminho.
"Eu sei que vai ser difícil, Raíssa. Mas acho que, no fundo, eu nunca estive com o Vinícius de verdade. Talvez eu tenha me casado com a ideia dele, com o que ele representa, e não com quem ele realmente é. E isso me destruiu aos poucos. Eu perdi a mim mesma tentando agradá-lo, tentando me encaixar na vida dele."
Raíssa ficou em silêncio por um momento, como se estivesse refletindo sobre tudo o que Mariana acabara de dizer. Então, com suavidade, ela respondeu: "Eu entendo, Mari. Eu entendo. Mas a boa notícia é que agora você pode começar a reconstruir sua vida. Você vai encontrar sua essência de novo, vai descobrir quem você realmente é, sem a pressão de viver a vida que os outros esperam de você."
"Eu espero que sim", disse Mariana, sentindo um pequeno lampejo de esperança surgir dentro de si. Ela não sabia como nem quando, mas agora estava mais certa de que precisava caminhar em direção a si mesma. Não mais como a esposa que estava ali por obrigação, mas como a mulher que tinha o direito de viver sua própria história.
Depois de desligar o telefone, Mariana sentiu uma sensação de alívio, mas também de tristeza. Era o fim de um ciclo, mas o começo de algo incerto, algo que ela não sabia como definir ainda. O vazio dentro dela ainda estava ali, mas, de alguma forma, ele já não parecia tão opressor. Havia uma leveza tímida em sua alma, uma liberdade que, embora dolorosa, era genuína.
Nos dias seguintes, a rotina na mansão continuou da mesma forma. Vinícius estava cada vez mais ausente, e Mariana, de certa forma, já não sentia mais a pressão de tentar encaixar-se no molde que ele havia criado para ela. As conversas eram mínimas, quase formais, e ele parecia tão imerso em seus próprios negócios que mal notava o que acontecia ao seu redor.
Era como se, ao tomar sua decisão, Mariana tivesse passado a viver em outra frequência. A presença de Vinícius, antes esmagadora, agora não passava de um eco distante. Ela se encontrava sozinha na casa, mas, ao contrário do que havia imaginado, essa solidão não era mais um fardo. Era um convite à descoberta, à reconfiguração de sua identidade.
Ela sabia que o caminho à frente não seria fácil. Haveria dias em que o peso da solidão voltaria, onde a dor da perda de algo que poderia ter sido ainda a assombraria. Mas, ao olhar para dentro de si, Mariana sentia que estava pronta para caminhar sozinha. Era o momento de começar de novo. E, desta vez, ela não deixaria que o medo ou a dúvida a impedissem de encontrar seu verdadeiro eu.