/0/14677/coverbig.jpg?v=0e9ca7b017bc3f19e7b110371954366a)
O café seguia calmo naquela noite. Algumas pessoas dispersas em suas mesas, sorrisos discretos, o som de jazz misturado com o tilintar de colheres contra xícaras. Patrícia ainda sentia o eco daquele olhar que tinham trocado. Tentou voltar ao livro, mas as palavras dançavam na página, confusas. O cheiro do cappuccino parecia mais forte, o ambiente mais quente.
Sentia o olhar dele, mesmo sem se virar.
Foi então que escutou a voz.
- Com licença... posso me sentar aqui? - perguntou, a voz baixa, rouca, carregada de cansaço e um tom curioso.
Patrícia ergueu os olhos e lá estava ele. Jungkook. A máscara agora abaixada, revelando o rosto que ela só tinha visto em telas e palcos. Mas ali, cara a cara, ele parecia menos inalcançável e mais... real.
Ela manteve o sorriso discreto, aquele de quem sabe que a vida, às vezes, gosta de pregar peças inesperadas.
- Claro - respondeu, tirando o livro de cima da cadeira ao lado.
Jungkook se sentou, ajeitou os fones no pescoço e o copo de café gelado na mesa. Por um instante, os dois ficaram em silêncio. Só o som da música ambiente e o farfalhar das folhas do lado de fora preenchiam o ar.
Ele olhou para o livro na mão dela.
- Gosta de ler?
- Muito - ela respondeu, fechando a capa azul-marinho. - Principalmente à noite... ajuda a desligar.
Ele sorriu, passando a língua pelos lábios antes de perguntar:
- Você não é daqui, né? Seu coreano soava natural, mas tinha uma leve curiosidade embutida.
Patrícia apoiou o cotovelo na mesa, encarando os olhos escuros dele.
- Não. Sou brasileira.
O olhar de Jungkook se acendeu.
- Sério? Brasil... uau. E tá há quanto tempo aqui?
- Quase quatro anos. Me mudei pra Busan depois de morar um tempo em Seul.
- E fala coreano tão bem assim?
Ela riu de leve.
- Além do inglês. Vim pra cá com esses dois na bagagem.
Ele pareceu genuinamente impressionado.
- Caramba... e o que faz aqui?
- Trabalho como assistente pessoal de um artista. Um coreano famoso... - ela brincou, levantando uma sobrancelha, sem dizer quem.
Jungkook deu uma risadinha, aquele sorriso de canto que parecia escapar sem ele perceber.
- E gosta?
- Gosto. Me dá certa liberdade. E além disso... faço academia, danço, toco alguns instrumentos, faço boxe.
- Boxe? - ele arqueou as sobrancelhas, claramente surpreso.
- Uhum. E piano, guitarra e bateria também. Preciso de coisas que me mantenham em movimento.
Jungkook riu baixo, balançando a cabeça.
- Definitivamente não é o que eu esperava encontrar aqui hoje.
Ele a olhou de um jeito que não era de artista pra fã. Era de homem pra mulher. De alguém curioso com o mistério que ela carregava.
- E você? - ela perguntou, fingindo não saber. - Mora aqui?
Ele hesitou, divertido.
- De certa forma... - deu de ombros. - Venho pra Busan quando preciso sumir um pouco. Nasci aqui, sabe?
- Ah... Busan é linda. Tem cheiro de lar.
Jungkook a observou por alguns segundos, como se tentasse decifrar quem era aquela mulher tão segura, tão natural, tão pouco impressionada por ele. E aquilo, ele sabia, era raro.
- Você sabe quem eu sou, né? - perguntou, num tom meio sem jeito, rindo no final.
Patrícia deu um meio sorriso.
- Sei. Mas... hoje você é só mais um cara tentando tomar um café tranquilo.
Ele riu de verdade dessa vez.
- Gostei de você, Patrícia.
Ela sentiu um calor subir pelo rosto, mas manteve a postura.
- Você nem me conhece.
- É... mas acho que quero conhecer. - Jungkook disse, com os olhos brilhando daquele jeito que faz o mundo desacelerar.
E assim, naquela mesa pequena, entre uma xícara de cappuccino e um americano gelado, o destino começou a tecer os primeiros fios de uma história que nenhum dos dois imaginava.
O relógio marcava 23h12.
E nada, dali pra frente, seria só coincidência.