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A madrugada caía sobre Busan como um cobertor silencioso. As luzes da cidade piscavam distantes pela janela do apartamento de Patrícia, e o barulho suave das ondas se misturava ao som de uma playlist de músicas instrumentais que ela colocava sempre para relaxar antes de dormir.
Mas naquela noite... relaxar parecia impossível.
Ela havia chegado em casa há pouco, depois de se despedir de Jungkook no café. Um simples "foi bom te conhecer" antes de sair, explicando que tinha trabalho cedo no dia seguinte. Ele sorriu, respeitou, e se despediu com aquele olhar escuro e intenso que ficou gravado na memória dela.
Patrícia deitou-se na cama, mas o sono não veio. O livro que lia mais cedo continuava na mesinha de cabeceira, aberto na mesma página. Era como se aquele encontro tivesse travado o tempo.
Virou-se de um lado para o outro, abraçando o travesseiro.
- Por que ele mexeu tanto comigo? - pensou.
Não era só pelo fato de ele ser famoso. Já tinha visto artistas antes. Já tinha ido à turnê solo dele e mantido tudo no nível saudável da admiração. Mas ali, no café, havia sido diferente.
O jeito como ele a olhou, como se quisesse descobrir o que existia atrás dos olhos dela. Como se enxergasse além do óbvio.
E aquilo ficou ecoando.
Patrícia tentava racionalizar. Talvez fosse só carência, talvez o acaso tivesse pegado ela num dia mais sensível. Mas, no fundo, sabia que não era só isso.
Foi uma conexão rara. Daquelas que a gente sente, mas não sabe explicar.
Do outro lado da cidade, Jungkook também não conseguia dormir.
O apartamento dele em Busan era discreto, num prédio antigo de frente para o mar. Ali, ele se escondia do mundo quando precisava respirar. Colocava playlists antigas, tocava violão descalço na sala e esquecia dos compromissos que o pressionavam em Seul.
Mas, naquela noite, nem as canções antigas conseguiam distrair.
Ele se pegava olhando para o celular, lembrando do sorriso dela, da forma calma como Patrícia falava, como não tremeu diante dele, como não tentou tirar uma foto ou pedir autógrafo.
Era raro encontrar alguém assim.
Sentou-se na beirada da cama, pegou o celular e abriu a lista de contatos, embora nem tivesse o número dela. Suspirou.
- Droga... por que eu não pedi?
Se sentia idiota por não ter arriscado mais, mas ao mesmo tempo... tinha gostado do jeito como tudo aconteceu. Natural. Sem obrigação, sem pressão.
Patrícia tinha algo que ele não via há muito tempo. Simplicidade. Verdade.
Ele fechou os olhos e lembrou da voz dela dizendo que tocava piano, bateria e guitarra, que fazia boxe e dançava. Imaginou ela em uma academia qualquer, batendo no saco de pancadas com o rosto determinado.
E sorriu, meio bobo.
Foi até a varanda, sentou-se no chão e ficou olhando o mar. O vento frio batia no rosto, mas ele não ligava.
Dentro dele, um turbilhão.
Por que alguém que ele mal conhecia tinha mexido tanto?
A mente de Jungkook se recusava a deixá-la ir. Pensava na maneira como ela o fitou sem medo, como sorriu de canto quando ele fez aquela pergunta meio idiota sobre ela saber quem ele era.
A naturalidade dela tinha desarmado tudo.
Ele se perguntava onde ela estaria agora. Como seria o trabalho dela. Se estaria deitada como ele, sem conseguir dormir.
E, no fundo, desejou que sim.
Patrícia, no quarto escuro, respirava fundo, tentando ignorar a vontade de mandar mensagem para a melhor amiga no Brasil contando o que tinha acontecido. Mas sabia que a amiga surtaria, e ela não queria transformar aquele momento em um espetáculo.
Era deles dois.
Mesmo que ele não soubesse disso.
Rolou no colchão, fechou os olhos e tentou imaginar que aquilo não tinha significado nada. Que era só um encontro passageiro, que a vida seguiria normalmente dali pra frente.
Mas a verdade era que ela sentia uma vontade absurda de vê-lo de novo. De ouvir aquela voz rouca. De continuar a conversa que ficou pela metade.
Só que Busan era grande.
E o destino não repete coincidências tão facilmente.
Ou será que repete?
Sem saber, os dois adormeceram quase no mesmo instante.
Ele, no sofá da sala, com o celular no peito.
Ela, abraçada ao travesseiro, com o livro esquecido ao lado.
O universo já sabia.
Mas eles ainda não faziam ideia.
E mal podiam imaginar que o próximo encontro estava mais perto do que pensavam.