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O silêncio que reinava no salão naquela manhã era tão denso quanto o top coat que usavam para encapsular os cristais nas unhas de gel. Aitana entrou no spa com a cabeça baixa e a respiração presa, como se cada passo no chão polido fosse uma provocação ao infortúnio.
A área de recepção, sempre cheia de música ambiente e risadas ao fundo, agora parecia um museu de boatos. Assim que ele entrou pela porta, ele sentiu: os olhares, as sobrancelhas levantadas, os sussurros atrás das xícaras de chá. Até o cheiro habitual de lavanda e acetona parecia julgá-la.
-Tudo certo? -Lina, sua companheira de mesa, perguntou em tom baixo e com um sorriso sem graça.
Aitana fingiu estar procurando algo entre seus materiais.
-Sim. Eu só quero... trabalhar.
Mentira. Eu queria desaparecer.
Não fazia nem 14 horas que uma mulher, completamente louca, gritou para o spa inteiro que tinha dormido com o namorado. E mesmo que não houvesse nenhuma prova... Que outra prova eles queriam além de uma foto nas redes sociais, onde você pudesse ver as mãos de Aitana - suas unhas, seu cunho artístico - entrelaçadas com as de Iker?
Ele havia carregado a foto com o texto:
"Há designs que não são esquecidos."
E todos entenderam. O cliente desesperado. Os companheiros. E o pior: o gerente.
"Aitana, para o escritório, por favor", disse Monica, do corredor de vidro fosco.
Aquele "por favor" não teve a mínima cortesia.
O aviso
Monica a esperava com as mãos cruzadas sobre a mesa branca, sem nenhuma gota fora do lugar. Ela usava seu clássico coque perfeito e manicure francesa impecável, como se a elegância fizesse parte do uniforme.
"Sente-se", disse ele, sem olhá-la nos olhos. Não quero prolongar isso.
Aitana sentou-se. Seu coração batia forte como se glitter corresse por suas veias, tremendo a cada palavra não dita.
"Ontem foi constrangedor", começou Monica sem rodeios. Não só para você. Para todos nós. Os clientes não vêm aqui para assistir a escândalos de novelas.
-Eu não fiz nada. Ela chegou gritando...
-E você não a impediu. Você não sabia como lidar com a situação. Aitana, você sabe o tipo de clientela que atendemos. Mulheres com milhares de seguidores. Embaixadores da marca. Influenciadores. Aqui a imagem é tudo.
Silêncio.Aitana apertou as mãos entre as pernas.
"Não estou dizendo para você não se apaixonar", continuou Monica, agora com um toque de compaixão na voz. Só não traga seus problemas pessoais para cá. Este lugar é sua vitrine. Seu selo. Se isso acontecer de novo... não terei escolha a não ser deixar você ir.
O golpe não veio com gritos ou ameaças. Estava limpo. Preciso. Como uma unha mal lixada que dói o dia todo.
-Entendido?
"Sim..." murmurou Aitana.
Ele saiu sem dizer mais nada. Ele foi até o banheiro, fechou a porta e se olhou no espelho. Seu reflexo olhou para ela com decepção.
"Como chegamos a esse ponto?" ele se perguntou.
Ele sentou na tampa do vaso sanitário. As lágrimas começaram a cair silenciosamente, encharcando o avental branco com seu nome bordado em rosa.
"Tanto esforço... só para acabar sendo 'a outra garota' em uma história que nem me pertence."
"Por que você postou essa foto, Iker? Pra quê?"
"Para provocá-la? Para me marcar?"
Ela chorou silenciosamente até ouvir a porta abrir. Foi limpo rapidamente. Nenhuma fraqueza diante da equipe.
Interlúdio – O spa, depois do escândalo
De volta ao seu posto, ele tentou agir como se nada tivesse acontecido. Ela calçou as luvas de látex rosa. Ele colocou uma música de fundo em seu tablet: pop suave, o de sempre. Mas os clientes notaram sua expressão, sua postura. Não era a mesma Aitana.
-Ei... você vai ficar bem no meu encontro amanhã? - escreveu uma cliente para ela no WhatsApp, com emojis preocupados.
Outro cancelado sem explicação.
E isso doeu mais que os gritos do dia anterior. Sua reputação estava começando a rachar como esmalte mal curado.
Lina se aproximou dele com um café.
-Você não precisa falar se não quiser, ok?
Aitana assentiu, forçando um sorriso.
"Tenho que continuar. Tenho que brilhar. Se eu deixar isso me abater... tudo o que construí vai para o inferno."
Flashback – O começo com Iker
Tudo começou no evento de primavera do ano passado. Um desses eventos de marcas locais onde maquiagem, extensões e unhas se tornaram arte de alto nível.
Aitana foi convidada como um talento emergente. Iker foi um dos organizadores. Ele usava uma camisa preta justa, um sorriso letal e a atitude de um produtor da Netflix. Nada nele parecia seguro... e ainda assim tudo nele parecia viciante.
-É você quem faz aquelas unhas de aurora boreal? "ela perguntou, apontando para um mostruário de pregos espelhados multicoloridos em seu suporte.
-A aurora, o olho de gato, as térmicas... o que você pedir - ela respondeu sorrindo, sem saber ainda que aquele homem seria o início de seu transtorno emocional.
-Adoro o jeito como você trabalha. Você sabia que muitas das minhas meninas podem precisar delas para seus eventos?
-Suas meninas?
-Tenho uma agência. Modelos, apresentadores, influenciadores. Às vezes preciso de alguém para prepará-los em tempo recorde para campanhas.
Foi assim que tudo começou. Com uma conversa de negócios. Com ele recomendando clientes para você. Com ela dando a ele descontos especiais. Com olhares que duravam um pouco mais do que o apropriado.
Até que um dia eles foram deixados sozinhos no spa depois do expediente.
-Por que você está fazendo isso? - ele perguntou enquanto ela limpava seus pincéis.
-Porque me faz sentir útil. Criativo. Porque com mãos bem cuidadas, muitas mulheres ousam fazer coisas que antes não faziam.
-E você? O que você ousaria fazer... se não tivesse medo?
Ele não a beijou naquela noite. Mas isso a deixou pensando por dias.
Presente – O retorno à sua mesa
De volta à cadeira, Aitana tentou se concentrar nos produtos.Ela preparou uma bandeja com os novos tons de gelatina, aqueles que mudam de cor dependendo da temperatura do corpo. Os clientes os adoravam porque eram como anéis de humor modernos.
Ele limpou as ferramentas, desinfetou e organizou as pontas de teste. Cada gesto, cada passo, como um ritual para não desmoronar.
"Hoje tenho uma garota da sua agência", Lina sussurrou.
-Do Iker?
-Sim. Uma nova. Ela diz que quer "unhas perigosas, mas sensuais". Literal.
Aitana fechou os olhos.
"Tudo o que eu quero é que parem de falar nele. Que o nome dele nunca mais apareça hoje."
Mas esse era o seu mundo. E ele havia se infiltrado em cada canto. Não havia como evitar.