Capítulo 4 O jogo do mestre

"O novato não fala", disse Enzo, com uma taça de vinho na mão, deitado no sofá de couro preto.

"Ele nem olha para você", acrescentou Dante, rindo como se fosse uma piada.

Luciano recostou-se ainda mais na cadeira, entediado. As luzes da casa estavam fracas, música eletrônica vibrava ao fundo como um pulso artificial. Através da janela, o jardim dos fundos brilhava ao luar. A mansão estava calma, como se nenhum outro mundo existisse além daquela sala de estar cheia de herdeiros mimados e fumaça de charuto cara.

-Quanto você quer apostar que eu consigo fazê-la falar? -Disse Luciano sem olhar para ninguém.

Dante levantou uma sobrancelha.

-Silenciosamente? Aquela que esfrega como se devesse sua vida ao chão?

"É esse mesmo", ele sorriu, um pouco de lado, como alguém que lança um anzol casualmente.

"Aposto cinco mil que você não vai conseguir", disse Enzo, pegando o celular para registrar a aposta.

Luciano girou o copo na mão, observando o uísque se mover como ouro líquido.

-Eu faço isso de graça. Só por diversão.

E ele se levantou. O eco de seus passos pelo corredor soava com aquele estrondo vazio que só as casas dos ricos têm. Ele desceu as escadas de mármore, com as mãos nos bolsos. Ele não se importava com quem visse. Era Luciano De La Vega.Ninguém lhe disse o que fazer. Exceto em sua própria casa.

No final do corredor, ao lado da biblioteca fechada ao público, estava ela.

Amélia. De novo. Sempre a mesma coisa: cabelo preso para trás, uniforme cinza usado, rosto sério como uma estátua. Esfregão na mão. Em silêncio.

A luz dos holofotes incidia sobre o mármore, deixando-o como um espelho. Luciano caminhava sem pressa, como um predador entediado. Ela não olhou para ele.

E isso o incomodava.

-Que? Você não está dizendo olá agora? -disse ele, fingindo um tom jovial-. Eles não ensinam boas maneiras nos chiqueiros?

Amelia continuou movendo o esfregão. Como se ele não estivesse ali! Como se suas palavras fossem moscas.

Luciano estalou a língua.

-Ah, certo. Você é o mudo da casa. -E tirou do bolso uma nota amassada. Ele estendeu-a elegantemente, como se estivesse oferecendo uma rosa. Isso solta sua língua?

Era uma nota de cem mil dólares.

Amélia parou.

O ar entre eles ficou tenso.

Luciano deixou cair. A nota flutuou por um segundo e caiu no mármore limpo.

Amélia olhou para baixo. O silêncio ficou denso. O mundo inteiro pareceu parar naquele momento.

E então, com uma calma que parecia um insulto, ele deslizou o esfregão sobre a nota.

A. Dois. Três passes.

Ele deixou-o encharcado, sujo, pisoteado pelo esfregão.

Luciano não se moveu.

-Você acha que é engraçado? - ele disse em voz baixa, mas ríspida. Isso vale mais que seu salário mensal.

Amélia olhou para cima. Direto nos olhos dele. Sem ódio. Destemido. Apenas aquela firmeza teimosa que ele não entendia direito.

"Então junte seu dinheiro, senhor", ele disse, pela primeira vez. A voz é firme, serena, sem servilismo. E pare de deixar lixo no chão que acabei de limpar.

Luciano congelou. Não por palavras. Mas por causa de como ele disse isso. Aquele jeito maldito de ficar parado como se não significasse nada. Como se ela fosse apenas mais uma que faz bagunça e a única que realmente limpa.

-Quem você pensa que é? - ele retrucou, ferido em seu orgulho.

"Alguém que não está à venda", respondeu Amelia.

O silêncio ficou ainda mais pesado. Uma gota caiu do esfregão e espirrou na conta molhada.

Luciano deu um passo em sua direção. Estava a menos de meio metro de distância. Eu conseguia sentir o cheiro do seu perfume barato, sentir o vapor do seu trabalho grudado na minha pele. Seu coração batia mais rápido, mesmo que ele não entendesse. Era raiva. Sim. Mas também algo mais.

Uma maldita intriga.

Ela não baixou o olhar. Ele não pediu perdão. Ele não reclamou. Ele nem se desculpou por falar com ela daquele jeito. Ele apenas ficou ali, firme, com um esfregão molhado e seus sapatos velhos apontados para ele.

Ele olhou para baixo por um momento. O bilhete ainda estava lá. Como um símbolo. Como uma ofensa.

Luciano deu um passo para trás. Ele sorriu, embora não fosse um sorriso amigável.

-Você tem coragem, isso eu admito.

Ele se abaixou, pegou a nota molhada e a dobrou lentamente.

-Isso não acabou, boneca. Estava apenas começando.

E ele foi embora.

Amelia observou-o enquanto ele desaparecia no corredor. Ele não suspirou. Não desmoronou. Ele simplesmente engoliu novamente. Ele cerrou os dentes. E ele continuou esfregando.

A vida dos ricos era cheia de jogos idiotas. Mas ela não ia tocar aquela.

Embora, no fundo, algo tivesse rangido em seu estômago.

Porque pela primeira vez em anos, eu me senti mais valioso do que uma maldita conta.

            
            

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