Capítulo 4 Primeira semana

Com certeza a semana inicial de aulas não foi nada, nada mesmo, daquilo que imaginei que seria. Logo na primeira aula de segunda-feira, em uma das disciplinas que pareciam ser mais legais, o professor fez com que nos apresentássemos para os outros colegas, dizendo de onde viemos e o quais nossas expectativas para o curso. O problema foi que exatos trinta e cinco minutos após o início ele encerrou a aula que deveria ter duração de duas horas. Como eu não conhecia ninguém, além de não saber como encontrar a Alana e os outros, acabei vagando e, talvez, me perdendo algumas vezes pelo campus.

Nessa minha aventura, até descobri que em um dos pavilhões ao lado do ocupado pelo meu curso, há uma exposição permanente de fósseis de dinossauros e coisas do tipo. Fiquei encantado e até fotografei algumas coisas, o que fez com que quem passasse me olhasse de forma engraçada. Com certeza estava na cara que eu era um novato, como se a mochila nova e cheia de cadernos e outros materiais não me entregasse.

Lala e eu ficamos impressionados quando ouvimos Charlie e Harry falando que iriam reaproveitar o que sobrou das folhas nos cadernos do semestre anterior, assim como algumas canetas, que aparentemente foram "emprestadas" por seus colegas e eles "esqueceram" de devolver.

− Hey, estranho! O que faz tão longe dos seus companheiros engenheiros engomadinhos?

− Crarlie! Graças a Deus, um rosto conhecido!

− O que aconteceu cara, já conseguiu se perder? Por que não ligou para um de nós?

− Eu não quis incomodar. Minha primeira aula acabou muito cedo, então fiquei vagando um período e meio até a próxima, quando cheguei na sala havia um aviso dizendo que o professor não iria comparecer.

− Não foi por falta de aviso, Lima! − Sorrio com o apelido idiota que ela colocou em mim e que imediatametne todos na casa adotaram para tentar me irritar. − As coisas aqui demoram para engrenar e os professores quase sempre prolongam as férias. Daqui a duas semanas serão as festas para receber os novatos, será a nossa vez de faltar.

− Ah! Nós não iremos às festas.

− Aguardando ansiosamente o dia em que seus pensamentos serão no singular, pequeno Lima...

− Não seja rude, Charlotte. Foi um dos primeiros acordos, entre a Lala e eu, quando resolvemos vir para o mesmo lugar: nada dessas festas onde coisas podem acontecer.

− Cara, mas assim vocês não vão ter a experiência toda! Sei que todo mundo imagina que as festas são uma orgia do início ao fim e não vou dizer que essas não acontecem, até se um dia estiver pronto posso te arrastar para uma dessas e -

− Charlie!

− Não seja um velho rabugento e preste atenção! Essas festas são bem tranquilas, até porque são aqui mesmo no campus e o pessoal geralmente se controla. Vão ser centenas de novatos tão perdidos quanto você e a sua pequena Lala. Vai ser o jeito mais rápido de conhecer o pessoal e se enturmar.

Eu sorri mais uma vez para Charlie. Se nos escutasse, Alana teria uma coisa ou duas para falar sobre ser chamada pequena. Mesmo sendo quase vinte centímetros mais baixa que meus 1,83 m, ela se recusa a admitir ter a estatura baixa. Chegando a extremos, quando era mais nova, de andar na ponta dos pés perto de garotas mais altas. Na verdade, ultimamente preciso fazer um esforço enorme para não rir da situação quando vejo a Lala se espichando toda para não parecer menor que Charlie com seus 1,75 m, quando caminhamos por aí.

− Unidos pelo álcool? − Retomo o assunto. − Sério mesmo, Charlie?

− Tanto medo assim de ficar bêbado com desconhecidos na volta?

− Não faça essa cara. Nós... Digo, eu não bebo e minha namorada também não. Nunca fomos de festas, então...

− Tudo bem! Tudo bem. Vem comigo então, vou te mostrar o refeitório. Só não se engane com a cara da comida. Eles nos iludem por uma semana enquanto os pais dos novatos estão por aqui conhecendo tudo. É melhor começar a trazer comida pronta ou dinheiro para comprar algo em uma das lancherias.

− Sinto que estou começando a me desiludir um pouco a cada hora que passa.

− Você nem recebeu seu primeiro zero e está assim? Amigo, você não vai longe!

− Idiota.

***

Já era final da tarde quando as aulas finalmente acabaram e estávamos no ônibus voltando para casa. E eu nunca estive tão frustrado. A tarde começou com três períodos de Física I, nessa disciplina o professor poderia ter sido abduzido que eu não reclamaria! Nunca me senti tão deslocado como quando ele começou com o que ele disse serem os princípios básicos, mas o que no inferno são derivadas? Como assim derivar a posição resulta na velocidade e se derivar outra vez, eu acho a aceleração? Antes não era só usar uma fórmula? Não! E coitada da menina que questionou isso, o cara ficou um dos três períodos só para explicar que engenheiros usam EQUAÇÕES e os alquimistas que usavam fórmulas. Claro que com isso ele mudou minha vida. Fora que em quase três horas ele encheu o quadro infinitas vezes de cálculos que só levavam letras, não nos mostrou nada que chegasse a um número no final.

− Por que tão sério,amor? Foram tão ruins assim as primeiras aulas?

− Ah, Lala! Não tive aula pela manhã. Por falar nisso, depois te mostro o que achei de legal em alguns prédios perto do meu, mas a aula da tarde serviu para eu refletir se me inscrevi no curso certo, tenho certeza que dizia EN.GE.NHA.RIA, no formulário. Só que nunca vi tantas letras na minha vida.

− Calma, Li! Logo você vai estar sabendo tudo isso e explicando para esse cara! Você sempre foi o melhor. Não fica assim, certo?

Tentei aceitar o que Alana disse e relaxar com os carinhos dela no meu cabelo, só não acho que vou me sentir menos frustrado tão cedo.

− Seu curso é um dos mais complexos, Liam. Se você interagir com os veteranos vai descobrir que mais de noventa por cento deles se sentiu assim ou pior. − Escutei Charlie falando do banco de trás e lá estava ela mais uma vez me empurrando para socializar.

− É isso mesmo, não se apegue muito. − Harry falou virando para trás no banco em nossa frente, que dividia com Lucy, e depois encarou Alana bem empolgado − E você Lala, como foi o primeiro contato com o pessoal?

Hazza e Lala.

− Eu só não tive uma das aulas, nas outras nós precisamos nos apresentar e uma das professoras fez um exercício de concentração que foi muito legal mesmo!

− Que bom, amor! − Não sei porquê, mas precisei falar antes de deixar Harry continuar. − Disse que você ia adorar! Você sempre quis isso e sempre se saiu muito bem nas peças da escola.

− Você é suspeito para falar, mas sim, olhando no geral eu me senti no lugar certo.

− Oh, vai ficar tudo bem sim, pelo menos até nos formarmos. − Lucy finalmente pareceu nos achar dignos de suas palavras e também se virou para trás depois de guardar o celular.

Foi a primeira vez que a loira falou e ela estava com um sorriso torto no rosto com as bochechas vermelhas, desde que vimos pela primeira vez, fez Alana e eu concordarmos que ela parece um bebezinho, mesmo que não seja a mais nova de nós, esse lugar era ocupado por Harry e seus cachos que, algumas vezes, pareciam fazer as mãos da minha namorada coçarem para poder tocá-los.

− Como assim Lucy? Não me assuste ainda mais! − Falei realmente me sentindo triste novamente, mas dessa vez havia um pouco de ciúmes misturado com minha decepção pelas aulas iniciais. − Me deixe viver o sonho por mais um tempo.

− Mas é verdade! De nós cinco, só você e talvez Charlie têm a chance de se dar bem depois de pegar o diploma. Um fotógrafo que só tira fotos em preto e branco como o Harry, uma atriz de teatro recém formada e eu, uma música.... Enquanto vocês dois ficam ricos atrás de uma mesa, nós três vamos estar vendendo nossa arte no centro da cidade, com sorte na praia durante o verão.

Ela falou tudo muito rápido ficando com o rosto parecendo em chamas pelo esforço e o sotaque irlandês puxado só completou mais o quadro. Quando finalmente terminou sua previsão nada auspiciosa, nós começamos a gargalhar por vários minutos deixando os outros passageiros com a certeza de que não éramos normais.

***

− Então, Li?

− Pode dizer o que você quer.

− Grosso!

− E grande, nunca esqueça! − Eu provavelmente mereci o tapa que levei no braço. − Isso doeu Lala, vou ficar com a marca dos seus dedos no meu braço!

− Você mereceu!

− Não faz essa carinha, não é justo. Apenas me abrace e fale logo o que quer, criatura adorável.

− Como sabe que eu vou pedir algo?

− Alana...

− Certo! Não é pedir. É perguntar: o que você acha de ir na festa para os novatos?

− Eu achei que isso estivesse discutido anos atrás...

− Hey! Não fique bravo, por favor. Acho que me empolguei com isso tudo. Desculpa, eu sei que seu dia foi cansativo, apenas esqueça. Vamos tomar banho e jantar, depois eu posso cuidar de você.

− Não precisa ficar assim. Eu que peço desculpas por descontar isso em você. Podemos falar sobre isso depois? Ainda temos duas semanas, vamos ver como vão ser as coisas até lá e descobrir como são essas festas. Pode ser?

− Você que manda, senhor Engenheiro! Agora: banho.