A fazenda era imponente, um símbolo da riqueza e do poder da família dela. A festa de São João estava no auge: fogueiras crepitavam, bandas de forró tocavam animadamente, e o cheiro de milho assado e canjica pairava no ar. Centenas de pessoas da alta sociedade pernambucana circulavam pelo local.
Logo ao chegarem, JP avistou Rico Tavares. Ele estava ao lado de Isa, cochichando e rindo, a cumplicidade entre os dois evidente. Rico lançou um olhar de desprezo para JP, que apenas confirmou suas suspeitas: ele estava totalmente envolvido nos planos de Isa. A presença dele era um lembrete constante da humilhação no hospital, da vingança orquestrada.
Isa, depois de apresentá-lo a alguns convidados com um sorriso falso, rapidamente o abandonou para dar atenção a Rico. Eles se afastaram, de braços dados, rindo e interagindo com outros jovens ricos, deixando JP sozinho no meio da multidão. Ele se sentiu um peixe fora d'água, um estranho naquele ambiente de ostentação.
JP tentou se misturar, pegou um prato de comida típica, mas o nó em seu estômago não o deixava comer. Ele observava Isa e Rico de longe, a raiva crescendo dentro dele.
Mais tarde, enquanto assistia a uma apresentação de bacamarteiros, sentiu um empurrão forte nas costas. Eram as amigas de Isa, as "Patricinhas de Boa Viagem". Elas o cercaram, rindo.
"Olha quem está aqui, meninas! O músico Zé Ninguém!"
"Perdido, queridinho?"
Antes que JP pudesse reagir, uma delas "acidentalmente" tropeçou, derrubando uma bandeja cheia de fogos de artifício acesos perto dos seus pés. Um dos fogos explodiu, atingindo sua perna. A dor foi lancinante. JP caiu no chão, gritando.
As meninas fingiram preocupação, mas seus olhos brilhavam com malícia.
"Oh, meu Deus! Coitadinho!"
"Alguém ajuda ele!"
Isa apareceu, a expressão indecifrável.
"JP! O que aconteceu?"
Ela se ajoelhou ao lado dele, examinando a queimadura. A dor era intensa, a pele vermelha e latejante.
"Calma, eu vou cuidar de você," disse ela, a voz surpreendentemente suave.
Ela o ajudou a se levantar e o levou para dentro da casa grande da fazenda, para um quarto afastado da festa. As amigas a seguiram, cochichando.
Isa limpou a ferida com cuidado e depois pegou uma cartela de comprimidos. "Toma isso, vai aliviar a dor."
JP, ainda atordoado pela dor e pela confusão, engoliu os comprimidos com um copo d'água. Ele queria acreditar que ela estava genuinamente preocupada, mas uma parte dele desconfiava.
A dor não diminuiu. Pelo contrário, parecia piorar. JP começou a sentir calafrios, a cabeça latejar.
Isa e suas amigas entraram no quarto, rindo.
"E aí, JP? O remedinho fez efeito?" perguntou Isa, um sorriso cruel nos lábios.
"O que... o que você me deu?" JP conseguiu balbuciar, a voz fraca.
"Açúcar, meu bem. Pílulas de açúcar. Placebos," respondeu uma das amigas, gargalhando. "Achou mesmo que a gente ia te dar remédio de verdade?"
Isa se aproximou, o rosto a centímetros do dele. "Isso foi a pegadinha número dois. E a queimadura? Digamos que foi um... acidente planejado. Você precisava de um pouco mais de emoção na sua vidinha sem graça."
A zombaria em sua voz era insuportável. JP percebeu a extensão da maldade delas. A queimadura fora intencional, o "remédio" uma farsa cruel. O choque e a traição renovada o deixaram sem palavras, o desespero tomando conta de seu corpo febril. Ele estava preso num jogo sádico, e Isa era a mestra titereira, se divertindo com seu sofrimento.
Ele fechou os olhos, a escuridão parecendo um alívio temporário para a dor física e emocional que o consumia. Ouviu as risadas delas se afastando, deixando-o sozinho com sua agonia.