Sofia concordou em ir ao jantar.
Seria mais fácil manter as aparências por mais alguns dias, até que seu visto ficasse pronto e ela pudesse finalmente partir.
Qualquer confronto agora só complicaria as coisas.
No casarão dos Andrade pais, a atmosfera era ainda mais fria e opressora que na mansão de Ricardo.
Dona Helena mal disfarçava o desprezo, enquanto o pai de Ricardo, um homem igualmente altivo, a ignorava completamente.
Isabella, claro, era o centro das atenções, elogiada e mimada por Dona Helena.
"Você é a filha que eu sempre quis ter, Isabella," Dona Helena dizia, lançando um olhar ferino para Sofia.
Durante o jantar, Sofia sentiu-se invisível.
Os Andrade e Isabella conversavam sobre negócios, viagens à Europa, eventos sociais dos quais ela jamais faria parte.
Dona Helena, entre um gole e outro de vinho caro, fazia comentários velados sobre "gente sem berço" e a importância de "manter a linhagem pura".
Antigamente, quando Ricardo ainda era Leo, ele a defenderia, mesmo que de forma sutil, com um toque na mão ou um olhar de reprovação para a mãe.
Agora, ele permanecia em silêncio, concordando com a cabeça vez ou outra, completamente alheio ao desconforto de Sofia.
O abandono era completo.
Na volta para casa, Ricardo dirigia o carro de luxo.
Isabella ia no banco do passageiro, tagarelando sobre os planos para o casamento deles.
Sofia estava no banco de trás, como uma intrusa.
Lembrou-se das noites em que ela e Leo se amontoavam no banco da frente de um carro velho emprestado, rindo e trocando beijos roubados.
A dor da perda era quase física.
De repente, um clarão. Um estrondo.
O carro foi atingido na lateral por outro veículo que surgiu do nada.
Rodopiaram na pista.
Instintivamente, Ricardo se jogou sobre Isabella, protegendo-a com o próprio corpo.
Sofia, no banco de trás, foi arremessada contra a lateral do carro.
Sentiu uma dor lancinante na cabeça e na perna antes de tudo escurecer.
Ela acordou num quarto de hospital.
A primeira pessoa que viu foi Dona Helena, parada ao pé da cama, o rosto impassível.
"Vejo que acordou," a matriarca disse, sem um pingo de emoção na voz. "Este acidente foi um sinal, não acha? Para você finalmente aceitar meu dinheiro e sumir de nossas vidas. Desta vez, pode ser pior."
A ameaça era clara.
Sofia, ainda grogue, apenas assentiu.
"Sim, senhora. Eu vou."
A porta se abriu e Ricardo entrou.
"Mãe? O que faz aqui?"
"Vim ver como Sofia estava," Dona Helena respondeu, a voz subitamente melosa. "Ela já concordou que o melhor é descansar longe daqui por um tempo."
Ricardo olhou para Sofia, desconfiado.
"É verdade, Sofia?"
"Sim, Ricardo. Preciso de um tempo," ela mentiu, para evitar mais conflitos.