Capítulo 6 Uma maldição

Rosanna fitava Millie com um olhar tranquilo.

Millie, por outro lado, exibia um sorriso doce e perfeitamente ensaiado, mas que não alcançava os olhos. "Senhorita Williams, você parece bem mais exausta pessoalmente do que na televisão."

Rosanna mantinha o tom calmo, mas suas palavras vieram carregadas de um veneno sutil: "Tenho cuidado de um gato de rua em casa. De vez em quando, ele se distrai com alguma gata no cio e sai correndo atrás dela como se o mundo fosse acabar. Ultimamente, ele tem me feito perder o sono."

Millie entendeu de imediato a metáfora. Por um breve instante, seu rosto endureceu e o sorriso vacilou. "Se esse gato vive correndo atrás de gatas de rua, talvez seja porque o lar não é bom o bastante para ele. Parece que você não consegue mantê-lo sob controle."

Rosanna suspirou, como quem já esperava exatamente esse tipo de resposta. "É verdade. Por isso, assim que as coisas se acalmarem, estou pensando em castrá-lo definitivamente."

Após uma breve pausa, ela concluiu com ironia: "Ainda assim, tenho pena da gata que vive rondando lá embaixo por causa do meu gato. Ela ainda está no cio. O que será que vai fazer?"

O rubor de raiva no rosto de Millie foi evidente, mas ela se conteve, já que estavam em público.

Quando as portas do elevador se abriram, o embate delas finalmente terminou.

Após conduzir Rosanna e os outros até o andar superior, Millie logo se afastou, mantendo a pose.

Nos bastidores, Cecily Mason, maquiadora de Rosanna, se inclinou discretamente e murmurou: "Quando você mencionou o gato, a senhorita Rogers não gostou nada. Ela ficou te olhando com puro veneno. Ela é a queridinha de Oliver, sabe como é. Não podemos nos dar ao luxo de provocá-la. Cuidado da próxima vez."

Rosanna respondeu num tom carregado de sarcasmo: "A queridinha de Oliver, é? Sem dúvida não é alguém com quem eu possa me dar ao luxo de cruzar."

Todos em Qegan sabiam que Oliver nutria sentimentos por Millie, mas o que ninguém sabia era que Rosanna era sua esposa.

Ainda assim, para ela, a própria saúde vinha antes de qualquer triângulo amoroso mesquinho. Esse tipo de confusão não merecia sua energia.

A festa de fim de ano estava marcada para as cinco da tarde, no salão de conferências no último andar do edifício do Grupo Marshall.

Na semana anterior, a empresa havia encerrado sua parceria com a emissora, e no dia anterior, Jeffrey Brewer, o diretor do evento, já trouxera sua equipe de câmeras e iluminação para deixar tudo em ordem.

Rosanna e seu co-apresentador subiram ao palco para um rápido ensaio.

Com mais de três anos na emissora e dezenas de grandes eventos no currículo, lidar com uma plateia de menos de mil pessoas era, para ela, quase como brincar de faz de conta.

Depois de revisar o roteiro com o apresentador, Rosanna se retirou para os bastidores e se sentou em um canto mais calmo, aproveitando o silêncio para repassar suas falas.

Mas logo o som de passos apressados ecoou pela entrada. A voz aguda de uma assistente anunciou: "O senhor Marshall e a senhorita Rogers chegaram."

Rosanna mordeu o lábio inferior.

Era quase cômico: quanto mais tentava evitar a dupla, mais parecia que o universo se encarregava de colocá-los diante dela.

Ela respirou fundo, se esforçando para ignorar o desconforto e mantendo os olhos presos ao papel.

Mas nem trinta segundos se passaram até que seu olhar traísse sua vontade e deslizasse até Oliver.

Ele trocava algumas palavras com Jeffrey antes de cumprimentar seu co-apresentador.

Logo, os passos familiares se aproximaram.

Rosanna não ergueu os olhos, fingindo não notar sua presença.

"Rosanna, o senhor Marshall veio nos visitar", Jeffrey disse rapidamente, percebendo o comportamento estranho dela.

Sem alternativa, Rosanna se levantou, encarou Oliver brevemente e o cumprimentou como se fossem completos desconhecidos.

"Senhor Marshall", ela disse, a voz impessoal, quase fria.

"Senhorita Williams, se houve alguma falha na recepção por parte da minha equipe, pode me avisar. Mas eu preferiria que você não complicasse a vida da minha secretária", Oliver avisou friamente.

Rosanna piscou, confusa.

O que ele estava insinuando?

Complicar a vida da secretária? Ela não tinha feito absolutamente nada. Enquanto Millie não começasse nada, ela não tinha interesse em sequer olhar para ela.

Millie, parada logo atrás de Oliver, mantinha uma expressão de falsa inocência, como uma donzela ofendida.

"Eu estava com Rosanna. As duas só estavam conversando sobre bichos de estimação. Acho que houve um mal-entendido, senhor Marshall", Jeffrey comentou, rindo sem graça. Ele continuava olhando para Rosanna, a instando silenciosamente a se desculpar e resolver a situação.

Agora, Rosanna entendia finalmente a situação. Millie havia distorcido a pequena troca de palavras e se feito de vítima.

Era por isso que Oliver estava ali - para defendê-la.

Claro, Millie podia provocar, mas a errada sempre seria Rosanna. E ele acreditaria em tudo que Millie dissesse, como sempre fazia.

Rosanna sabia que se explicar não mudaria nada e que não havia motivo para fazer isso, então decidiu manter a dignidade.

"Senhor Marshall, ouça com atenção, porque direi isso apenas uma vez: eu nunca compliquei nada para a senhorita Rogers."

Antes que Oliver pudesse retrucar, Jeffrey deu um leve puxão na manga da blusa de Rosanna, num gesto silencioso de alerta.

Rosanna desviou o olhar para o marido, pegou seu roteiro e se virou para sair em direção à sala de maquiagem.

Enquanto caminhava, ela ainda pôde ouvir a voz melosa de Millie ecoar atrás dela: "Acho que exagerei. Foi um julgamento errado da minha parte. Eu deveria me desculpar com a senhorita Williams. Vamos esquecer isso, sim?"

Rosanna nem sequer se deu ao trabalho de reagir. Ela empurrou a porta da sala de maquiagem e entrou, com Cecily logo atrás.

Esse ano, o Grupo Marshall havia caprichado na estrutura do evento, e até mesmo os apresentadores tinham camarins separados.

Rosanna trouxera três vestidos diferentes. Depois de conversar com seu co-apresentador, optou pelo mais elegante.

Enquanto Cecily ajeitava sua maquiagem, o clima ficou mais leve.

"Apesar da diferença de status, dá para ver no olhar de Millie que ela realmente gosta de Oliver. Mas os sentimentos dele... são mais difíceis de decifrar."

Rosanna sorriu de canto, sentindo sua amargura crescer. "Não são tão difíceis assim. Ele também sente algo forte por ela."

Cecily arqueou uma sobrancelha, intrigada. "Você fala como se o conhecesse."

Rosanna respondeu com um meio sorriso, carregado de sarcasmo: "Não sou sortuda o suficiente para conhecer alguém como ele."

A maquiadora estreitou os olhos. "Sinceramente? Eu apostaria que há uma história entre vocês. E se não houver, talvez ele esteja interessado em você."

Rosanna retrucou rapidamente: "Não diga bobagens. Todo mundo da cidade sabe que o coração dele é de Millie. Ele só veio aqui por causa dela, para defendê-la."

Cecily percebeu o desconforto na voz da apresentadora e decidiu recuar. Talvez ela tivesse tocado em um assunto sensível.

"Bem, cada âncora aqui tem algum tipo de apoio nos bastidores. Oliver é galanteador, sim, mas também é bonito e podre de rico. Mesmo que uma mulher seja apenas o segredo dele, ainda assim está em vantagem."

Rosanna zombou sem humor. "Talvez... Mas ser esposa dele deve ser mais uma maldição do que um sonho."

Cecily arqueou uma sobrancelha. "Por que você pensaria isso? Isso não é verdade."

Ela riu com um ar de quem entendia das coisas e continuou: "Por mais mulherengo que ele seja fora de casa, ainda tem que cumprir seu papel entre quatro paredes. E vamos combinar, com aquele maxilar, aquele cabelo... ele deve ser um espetáculo na cama."

O comentário aparentemente inofensivo pegou Rosanna desprevenida, atingindo um ponto delicado.

Durante os dois primeiros anos de casamento, ela e Oliver foram praticamente estranhos - até dormiam em quartos separados.

Exceto pela primeira vez, não houve intimidade física entre eles nesses dois anos.

Mas no terceiro ano, tudo mudou numa noite. Ele chegou bêbado, invadiu seu quarto, e o que aconteceu depois não saiu mais da memória dela.

Por mais que tentasse resistir, ele sempre conseguia fazer seu corpo traí-la. Ela odiava isso, e odiava lembrar como ele a fazia se sentir viva.

Sem notar as emoções nos olhos de Rosanna, a maquiadora prosseguiu: "Acho que ser a esposa dele significava luxo e muito prazer físico. Se eles tivessem um filho juntos, o divórcio seria quase impossível. A esposa dele não teria preocupações, nem precisaria trabalhar. Muito melhor do que nós, que corremos todos os dias só para pagar as contas."

Rosanna sentiu a raiva borbulhar.

Mas antes que ela pudesse responder, alguém bateu à porta e Oliver entrou.