"Olha quem decidiu aparecer," disse a minha sogra, o seu tom gotejante de sarcasmo. "Pensei que ias ficar no hospital para sempre, a aproveitar a simpatia de todos."
Joana levantou-se e veio na minha direção, a sua voz falsamente doce.
"Sofia, sinto muito pela tua perda. Estávamos todos tão ansiosos por conhecer o bebé."
Ela tentou abraçar-me, mas eu dei um passo atrás.
"Onde está o Pedro?" perguntei, a minha voz vazia.
"Ele está no escritório," respondeu a minha sogra. "Alguém tem de trabalhar nesta casa, já que tu estás demasiado ocupada a ser dramática."
Eu ignorei o seu veneno e fui para o nosso quarto.
As minhas coisas já estavam embaladas em caixas, empilhadas num canto. O berço que montámos juntos, com tanta esperança e alegria, tinha desaparecido.
O quarto parecia estéril, despido de qualquer vestígio de mim. De nós.
Sentei-me na beira da cama, o meu corpo pesado de exaustão e dor.
A porta abriu-se e Pedro entrou. Ele evitou o meu olhar.
"Assinei os papéis do divórcio," disse ele, a sua voz monótona. "O meu advogado entrará em contacto com o teu."
Ele colocou uma pasta na cómoda.
"Podes ficar com a casa. Eu vou mudar-me para um apartamento."
Ele falou como se estivesse a discutir um negócio, não o fim do nosso casamento.
"Porque é que fizeste isto?" perguntei, a minha voz um sussurro. "Porque é que tiraste as minhas coisas?"
Ele finalmente olhou para mim, e os seus olhos estavam frios, vazios de qualquer calor que um dia tiveram por mim.
"A minha mãe pensou que seria melhor. Para te ajudar a seguir em frente."
"A tua mãe?" repeti, incrédula. "Tu nem sequer tiveste a decência de falar comigo? Deixaste a tua mãe decidir o destino do nosso casamento, da nossa casa?"
"Ela está apenas a tentar ajudar!" ele retorquiu, a sua voz a elevar-se. "Ela está de luto, Sofia! Todos nós estamos! Porque é que tens de tornar tudo tão difícil?"
"Eu tornei difícil?" A minha voz tremeu de raiva contida. "Eu estava a carregar o teu filho, Pedro! Sozinha! Onde é que tu estavas quando eu caí? Onde é que tu estavas quando eu precisei de ti?"
"Eu estava a trabalhar! A tentar dar uma vida boa a esta família!"
"Não," eu disse, levantando-me, sentindo uma onda de força a percorrer-me. "Tu estavas de férias. Com ela."
Eu apontei para a porta, onde a Joana estava a espreitar, a sua cara uma máscara de falsa preocupação.
O rosto do Pedro ficou pálido.
"Isso não é justo. A Joana estava a passar por um momento difícil. Ela precisava de apoio."
"E eu não?" gritei, a minha voz finalmente a quebrar-se. "O teu filho não precisava de ti?"
O silêncio encheu o quarto, espesso e sufocante.
Eu peguei na minha mala, a única coisa que a minha mãe não tinha embalado.
"Acabou, Pedro. Realmente acabou."
Passei por ele, passei pela minha sogra e pela Joana na sala de estar, e saí pela porta da frente sem olhar para trás.
O ar fresco da noite encheu os meus pulmões. Senti-me livre. E terrivelmente sozinha.