Capítulo 3

A viagem para São Paulo foi um borrão. Pedro organizou tudo. Um jato particular, uma clínica discreta. O procedimento foi rápido, asséptico. Senti um vazio, mas também um alívio imenso. Era o fim de um pesadelo.

Pedro estava ao meu lado quando acordei.

"Acabou, Helena. Estás livre."

Ele contou-me que o divórcio tinha sido finalizado. O acordo pré-nupcial, que o meu pai insistira que Tiago assinasse, era brutal. Estipulava que, em caso de infidelidade comprovada, ele perderia tudo o que foi adquirido durante o casamento com o apoio da minha família. Ou seja, tudo.

A fazenda da minha família em São Paulo recebeu-me com o seu silêncio acolhedor. O meu pai abraçou-me, os seus olhos cheios de uma dor que espelhava a minha.

"Perdoa-me, minha filha. Eu devia ter-te protegido melhor."

"A culpa não foi tua, pai."

Enquanto isso, no Rio, Tiago recebia a notificação oficial do divórcio e da execução do acordo. A sua empresa, construída sobre as fundações do meu apelido, começou a ruir. Clientes cancelaram contratos. Fornecedores exigiram pagamento imediato. O castelo de cartas dele estava a desmoronar-se.

Dona Lurdes, alheia à ruína financeira, estava focada noutra coisa. Foi ao hospital visitar Sofia, que se recuperava do ataque que o próprio filho de Lurdes ordenara.

"Minha querida, não te preocupes. Vou obrigar o Tiago a casar contigo. O meu neto precisa de um lar."

Sofia, mestra na manipulação, chorou.

"Eu só quero uma família para o Léo, Dona Lurdes. Um lugar seguro."

A sua vingança estava apenas a começar.

Dona Lurdes levou Sofia e Léo para o apartamento de Ipanema. O apartamento que um dia fora meu.

Encontraram Tiago lá, bêbado, a olhar para o nada.

"Tiago, vais casar com a Sofia. Agora."

Ele riu, um som oco e desesperado. "Casar? A minha vida acabou, mãe."

"Não acabou! Tens um filho! Uma mulher que te ama! Vais assumir a tua responsabilidade."

O casamento foi uma farsa no cartório. Tiago estava de ressaca, os olhos vazios. Sofia usava um vestido branco, um sorriso vitorioso nos lábios.

A vida deles tornou-se um inferno. Tiago passava os dias a beber e a ligar para o meu número, que agora estava bloqueado. Tratava Sofia com um desprezo gelado.

Uma noite, ela tentou seduzi-lo. Pôs um sonífero na bebida dele e levou-o para a cama. Quando ele acordou, nu ao lado dela, a sua reação foi de puro nojo e raiva.

Semanas depois, Sofia anunciou que estava grávida. Dona Lurdes exultou. Tiago olhou para ela com suspeita. Ele mal lhe tinha tocado.

Sofia, agora a "senhora da casa", tornou-se uma tirana. Despedia empregados antigos, gritava, humilhava. A cozinheira, que trabalhava para mim há anos, disse-lhe um dia:

"A Dona Helena nunca nos tratou assim. A senhora não lhe chega aos calcanhares."

Sofia despediu-a no mesmo instante.

Tiago, desesperado, tentava encontrar-me. Foi à fazenda em São Paulo, mas os seguranças barraram-lhe a entrada. A sua empresa faliu oficialmente. Ele perdeu tudo.

Numa noite de bebedeira, ele gritou com Sofia.

"Eu odeio-te! Odeio essa criança na tua barriga! Eu só quero a Helena! A minha Helena!"

A vingança final de Sofia estava pronta. Havia uma última grande oportunidade para Tiago salvar um fragmento da sua empresa: uma apresentação para novos investidores.

No meio da apresentação dele, as luzes apagaram-se. No ecrã, em vez de projetos de arquitetura, apareceram as fotos do U-drive. Tiago com Léo, a "Nossa Família". E depois, um vídeo. Sofia, a confessar a um amigo que o bebé que esperava não era de Tiago, mas de um dos marginais que a atacaram.

Ela tinha planeado tudo. A humilhação pública. A destruição total.

Tiago ficou paralisado. Os investidores levantaram-se e saíram em silêncio.

Ele voltou para casa, a mente a estalar. Encontrou Sofia na sala, a fazer as malas.

"Acabou, Tiago. Tiveste o que merecias."

"Porquê?" sussurrou ele.

"Porque me usaste. E depois descartaste-me. Eu disse-te que te faria sofrer."

A raiva cega tomou conta dele. Ele avançou para ela, as mãos a fecharem-se à volta do pescoço dela.

"Tu destruíste a minha vida!"

Dona Lurdes entrou na sala, a gritar, a tentar separá-los. Ela conseguiu empurrar Tiago, protegendo Sofia.

Ele olhou para a mãe, para a mulher que carregava o filho de outro, e a sua mente quebrou-se.

"Se eu descobrir que esse filho não é meu," sibilou ele para Sofia, "eu mato-te."

Ele saiu do apartamento, cambaleando para a noite, um homem completamente destruído.

                         

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