A minha bolsa de águas rompeu às oito da noite, em ponto.
O som foi baixo, um pop húmido, seguido por um jorro quente pelas minhas pernas.
O pânico subiu-me pela garganta, frio e rápido. Peguei no telemóvel com as mãos a tremer e liguei ao meu marido, Leo.
O barulho do outro lado da linha era ensurdecedor, gritos e cânticos de futebol. Era a final da taça, Benfica contra Porto.
"Clara? O que foi? Não consigo ouvir nada!"
A voz dele soava distante, irritada.
"Leo, a bolsa rebentou. Tens de vir para casa. Agora."
Ouvi uma risada do lado dele. Era a sua irmã, Sofia.
"Ela está outra vez com essas coisas? Clara, da última vez também pensaste que era a sério e era só alarme falso. Relaxa."
A voz dela era melosa e condescendente.
Tentei manter a calma, a primeira contração apertou a minha barriga como um punho de ferro.
"Não é alarme falso, Sofia. Estou a perder líquido. Leo, por favor."
"Amor, o jogo está quase a acabar", disse o Leo, a impaciência clara na sua voz. "Faltam quinze minutos. Aguenta aí. Se for mesmo a sério, chama uma ambulância. Eu encontro-te no hospital."
Ele disse aquilo como se estivesse a pedir para eu ir buscar pão.
"Não desligues, Leo, eu preciso de ti..."
Mas a chamada terminou.
Fiquei a olhar para o ecrã do telemóvel, para o nome dele. Sozinha, no meio de uma poça de água no chão da nossa sala.
A dor veio outra vez, mais forte.
Arrastei-me até ao sofá e liguei para o 112. A minha voz era um fio, quebrada pela dor e pelo medo.
Eles disseram que uma ambulância estava a caminho.
Mas com o trânsito do jogo, não sabiam quanto tempo ia demorar.