O Diário Que Virou o Jogo
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Capítulo 2

A expressão de Inês mudou de desprezo para fúria pura.

"Divórcio? Atreves-te a dizer essa palavra?"

Ela levantou-se, o seu corpo tenso de raiva.

"Depois de tudo o que a nossa família fez por ti? Demos-te uma vida que nunca poderias ter sonhado!"

Uma vida? Que vida?

Uma vida de solidão numa casa vazia, à espera de um marido que nunca estava lá. Uma vida a ser tratada como uma empregada, não como uma esposa.

"A tua família não me deu nada além de dor," respondi calmamente.

"Ingrata! O meu filho trabalha dia e noite para te dar do bom e do melhor, e é assim que lhe agradeces? Causando problemas num momento tão importante?"

Ela aproximou-se da cama, o seu dedo apontado para o meu rosto.

"És uma desilusão. Nem sequer conseguiste levar uma gravidez até ao fim. És inútil."

Cada palavra dela era um golpe.

Mas eu já não sentia a dor aguda de antes. Era uma dormência fria.

O meu telemóvel tocou. Era o meu pai. Atendi imediatamente.

"Ana, filha? Como estás? A tua mãe contou-me. Estou a ir para aí."

A voz calorosa e preocupada do meu pai foi a primeira gota de bondade que senti em horas.

"Pai, estou bem," menti, a minha voz a falhar.

Inês ouviu e bufou.

"Claro, vai a correr para o teu paizinho. A tua família de falhados é a única que te atura."

Antes que eu pudesse responder, a porta do quarto abriu-se.

Era Leo. A sua cara estava vermelha de raiva. Ele deve ter corrido do restaurante.

Ele marchou até mim, ignorando completamente o meu estado.

"Que raio se passa contigo, Ana? Divórcio? Estás a falar a sério?"

A sua voz era alta, enchendo o pequeno quarto.

"Nunca estive tão séria em toda a minha vida," disse eu, olhando-o nos olhos.

"Porquê? Porque não larguei tudo para vir a correr para aqui? Já te disse, não havia nada que eu pudesse fazer! O bebé já se tinha ido!"

Ele disse "o bebé" como se estivesse a falar de uma encomenda perdida.

"Não é por isso, Leo. É por tudo. É porque tu não te importas."

"Eu não me importo? Eu dou-te uma casa, um carro, dinheiro! O que mais queres?"

"Eu queria um marido," disse eu, a minha voz a quebrar. "Queria um parceiro. Queria o pai do meu filho ao meu lado."

Leo riu, um som seco e sem humor.

"És tão dramática. Sempre a fazer uma tempestade num copo de água."

Ele olhou para a mãe. "Mãe, deixa-nos a sós."

Inês lançou-me um olhar vitorioso e saiu, fechando a porta atrás de si.

Leo sentou-se na beira da cama. A sua expressão suavizou-se, mas os seus olhos continuavam frios. Era uma atuação.

"Ouve, Ana. Eu sei que estás abalada. É normal. Mas falar em divórcio é um exagero."

Ele tentou pegar na minha mão, mas eu afastei-a.

"Não é um exagero. É a minha decisão."

A sua paciência esgotou-se instantaneamente.

"Não sejas ridícula. Não te vou dar o divórcio. Vais para casa, descansas e esqueces esta estupidez. A nossa família não precisa deste escândalo."

"A tua família," corrigi. "Eu já não faço parte dela."

Ele levantou-se, a sua mandíbula cerrada.

"Vais arrepender-te disto, Ana. Vais ver."

Ele virou-se e saiu, batendo a porta com força. O som ecoou no silêncio do quarto.

Fiquei sozinha, a olhar para a porta fechada.

Não, Leo.

Pela primeira vez em muito tempo, eu tinha a certeza de que não me ia arrepender.

            
            

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