Levei a Eva para a cirurgia eu mesma.
Nenhum outro cirurgião ortopédico estava disponível, e eu não ia deixar a minha filha à espera.
A fratura era grave. Uma fratura exposta da tíbia e da fíbula.
Enquanto operava, as minhas mãos eram firmes, os meus movimentos precisos. Era como se outra pessoa estivesse no controlo, uma versão de mim que era apenas uma máquina médica.
Mas o meu coração estava a ser feito em pedaços.
O Pedro não apareceu. Nem uma vez.
Ele não me ligou. Não enviou uma mensagem.
A cirurgia demorou quatro horas. Quando terminei, sentia-me esgotada, vazia.
Fui para o quarto de recuperação da Eva. Ela dormia, a sua perna engessada e elevada. Parecia tão pequena, tão frágil.
Sentei-me ao lado dela e finalmente deixei-me chorar, silenciosamente, para não a acordar.
O meu telemóvel vibrou. Era o Pedro.
Atendi, esperando, estupidamente, um pedido de desculpas.
"Sofia, onde estás?" A sua voz era irritada. "A Sra. Almeida quer agradecer-me pessoalmente. Ela está a oferecer-me um bónus enorme! E disse que vai considerar-me para a posição de Diretor de Projeto. Isto é enorme!"
Eu não disse nada. O que poderia eu dizer?
"Estás a ouvir?" ele insistiu. "Isto vai mudar as nossas vidas! Todo aquele trabalho extra, todas aquelas noites no escritório, finalmente valeram a pena."
"A Eva partiu a perna," disse eu, a minha voz monótona. "Em dois sítios. Acabou de sair de uma cirurgia de quatro horas."
Houve um silêncio. Não um silêncio chocado ou culpado. Era um silêncio irritado.
"Partiu a perna? Oh. Bem, ela vai ficar bem, certo? Tu és a melhor médica de lá. Tenho a certeza de que a consertaste."
Ele disse aquilo como se eu tivesse acabado de consertar um brinquedo partido.
"Onde estás, Pedro?" perguntei eu, calmamente.
"Estou a levar a Sra. Almeida e o Leo a jantar. Para celebrar. Ela insistiu. Não posso dizer que não, pois não? Isto é pelo nosso futuro."
"Nosso futuro," repeti eu, sem emoção. "Entendo."
"Ótimo. Fico feliz por finalmente entenderes as minhas prioridades. Tenho de ir. Liga-me mais tarde e diz-me como está a Eva."
Ele desligou.
Olhei para o telemóvel na minha mão. Depois olhei para a minha filha a dormir.
Prioridades.
Sim, agora eu entendia perfeitamente as prioridades dele.
E as minhas.
Abri a minha lista de contactos e encontrei o número de uma advogada de divórcios que uma colega me tinha recomendado há meses.
Hesitei por apenas um segundo.
Depois, carreguei em "ligar".