No dia seguinte, fui fazer os exames pré-operatórios.
A médica, Dra. Sofia, olhou para os meus resultados com uma expressão séria.
"Eva, os teus indicadores físicos estão todos bons. Podemos agendar a cirurgia."
Senti um alívio imenso.
"Obrigada, doutora. Quando podemos fazer?"
"Na próxima quarta-feira. Mas preciso que assines os formulários de consentimento. Há riscos, como em qualquer procedimento."
Ela explicou os possíveis efeitos secundários: dor, fadiga, risco de infeção.
Eu ouvi atentamente e assinei sem hesitar.
Pelo Leo, eu faria qualquer coisa.
Quando saí do consultório, vi o meu pai a sair apressadamente do quarto 302. Ele não me viu.
A porta ficou entreaberta.
Curiosa, aproximei-me devagarinho e espreitei pela fresta.
Vi a minha mãe sentada ao lado da cama, a descascar uma maçã com muito cuidado.
Na cama estava uma mulher pálida, com cerca de quarenta anos. Parecia fraca, mas os seus olhos brilhavam.
Era a Inês.
A minha mãe cortou um pequeno pedaço de maçã e levou-o à boca da Inês.
"Come um bocadinho, Inês. Precisas de recuperar as forças. A Eva já concordou com a doação. Em breve, terás uma nova vida."
O meu sangue gelou.
O que é que ela queria dizer com "terás uma nova vida"?
A doação era para o Leo.
A Inês respondeu com uma voz fraca mas clara.
"Obrigada, Clara. E obrigada ao Rui. Vocês são a minha única família."
Clara e Rui. Os nomes dos meus pais.
Recuei da porta, o coração a bater descontroladamente no meu peito.
Uma confusão terrível instalou-se na minha mente.
Porque é que os meus pais estavam a tratar esta mulher com tanto carinho? Porque é que lhe estavam a prometer a minha medula óssea?
Voltei para o corredor, a cabeça a andar à roda.
Miguel encontrou-me ali, pálida como um fantasma.
"Eva? O que se passa? Pareces ter visto um fantasma."
Eu agarrei-lhe no braço, a minha voz a tremer.
"Miguel, algo está muito errado."