O Jogo dos Ossos: Uma Traição Sangrenta
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Capítulo 3

Passei os dias seguintes numa névoa de ansiedade.

Os meus pais evitavam o assunto. Sempre que eu perguntava sobre a Inês, eles davam respostas vagas.

"É uma amiga da família, está muito doente."

"Não te preocupes com isso, foca-te em preparar-te para a cirurgia."

A desculpa deles era fraca, e eles sabiam disso.

A cirurgia estava marcada para dali a dois dias. A minha angústia crescia a cada hora.

Decidi que precisava de respostas.

À noite, quando o hospital estava mais calmo, fui ao arquivo de registos médicos.

A minha empresa tinha feito um projeto de sistema para este hospital há uns anos. Eu ainda tinha acesso a algumas áreas não críticas.

Usei as minhas credenciais antigas. Funcionou.

Procurei pelo nome "Inês Santos".

O seu ficheiro apareceu.

Diagnóstico: Leucemia Mieloide Aguda. O mesmo que o Leo.

Necessidade: Transplante de medula óssea urgente.

Mas foi a secção de informações pessoais que me fez parar de respirar.

Nome da mãe: Clara Alves.

Nome do pai: Rui Gomes.

Os nomes dos meus pais.

A Inês era a irmã deles. A minha tia. Uma tia que eu nunca soube que existia.

E depois vi outra coisa.

Um documento anexado. Um teste de compatibilidade.

O nome do dador: Leonardo Gomes. O meu irmão.

Compatibilidade: 100%.

O chão pareceu desaparecer debaixo dos meus pés.

O Leo não era o recetor. Ele era o dador.

Eles mentiram.

Todos eles mentiram.

A doença do Leo era a desculpa. A desculpa para me fazerem vir e doar a minha medula óssea.

Mas para quem? Se o Leo era o dador para a Inês, então para quem era a minha doação?

Percorri os registos do Leo.

O seu diagnóstico não era leucemia. Era uma anemia aplástica severa. Grave, mas não uma sentença de morte imediata como a leucemia aguda.

E depois, o choque final.

No seu ficheiro, havia um pedido pendente para um transplante de medula óssea.

O recetor: Leonardo Gomes.

A dadora designada: Eva Gomes. Eu.

Eles queriam a minha medula para o Leo.

E a medula do Leo para a Inês.

Um transplante em cadeia. Uma teia de mentiras tão complexa, tão cruel, que me deixou sem ar.

Eles sacrificaram a saúde do Leo, pondo-o no risco de uma doação, para salvar a irmã deles. E usaram a sua doença para me coagir a salvar o Leo.

Senti uma náusea violenta.

Fechei o computador e saí do arquivo, a tremer incontrolavelmente.

No corredor, dei de caras com o Miguel. Ele devia ter-me seguido.

Ele olhou para o meu rosto e soube imediatamente.

"Descobriste, não foi?"

A sua voz era suave, cheia de uma tristeza que eu não compreendi.

Eu olhei para ele, os olhos a arder com lágrimas não choradas.

"Tu sabias? Miguel, tu sabias disto tudo?"

Ele não conseguiu encontrar o meu olhar. Baixou a cabeça.

"Eva, eu..."

O seu silêncio foi a única resposta de que eu precisava.

A traição era total.

            
            

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