Tentei ligar ao Miguel outra vez, mas a chamada foi direta para o voicemail. Ele tinha-me bloqueado.
Um sorriso amargo formou-se nos meus lábios.
Claro que o fez. A sua preciosa Clara precisava dele. A minha dor era apenas um incómodo.
De repente, o meu telemóvel tocou. Era a minha sogra, a mãe do Miguel, a Dona Isabel.
O meu coração deu um salto. Talvez ela me trouxesse algum conforto. Ela sempre pareceu gostar de mim.
Atendi a chamada, a minha voz ainda fraca. "Olá, mãe."
"Sofia! O Miguel disse-me que queres o divórcio! O que se passa contigo?" a sua voz era estridente, cheia de acusação.
"Ele disse-te que eu perdi o bebé?" perguntei, sentindo um frio a instalar-se no meu estômago.
"Ele mencionou que tiveste um pequeno acidente," ela disse com desdém. "Mas isso não é desculpa para tentares destruir a tua família. O Miguel está a passar por muito stress no trabalho. E a pobre da Clara está tão doente, é natural que ele a ajude. Ela não tem ninguém."
A pobre da Clara. E eu? Eu não tinha acabado de perder o meu filho, o neto dela?
"Ele empurrou-me," disse eu, a minha voz a ganhar uma força que eu não sabia que tinha. "Ele empurrou-me e eu perdi o meu filho."
A Dona Isabel fez uma pausa. Quando falou novamente, a sua voz era gelada. "Não acuses o meu filho. O Miguel nunca faria tal coisa. Deves estar a exagerar para te fazeres de vítima. Sempre soube que eras manipuladora."
A chamada terminou.
Fiquei a olhar para a parede, sentindo-me completamente vazia. A família em que eu pensei que tinha entrado era uma ilusão. Eles não eram a minha família. Eram os guardiões do Miguel, e eu era apenas uma estranha.
A porta do meu quarto abriu-se e uma enfermeira entrou. "Sofia? Há um homem aqui que diz ser o seu irmão. Devo deixá-lo entrar?"
O meu irmão? Eu não via o meu irmão mais velho, o Tiago, há anos. Ele era um advogado ocupado noutra cidade. Como é que ele sabia?
"Sim, por favor," sussurrei.
O Tiago entrou. Ele parecia mais velho, com linhas de preocupação à volta dos olhos que eu não me lembrava. Ele estava a usar um fato caro, mas estava amarrotado, como se ele tivesse vindo a correr.
Ele olhou para mim, para a minha cara pálida e para a cama de hospital, e a sua expressão endureceu.
"Sofia," disse ele, a sua voz baixa e controlada. "O que aconteceu?"
Eu contei-lhe tudo. Sobre o empurrão, a perda do bebé, as chamadas telefónicas com o Miguel e a sua mãe.
Quando terminei, o Tiago estava em silêncio. Ele apenas ficou ali, a sua mandíbula cerrada.
"Ele vai pagar por isto," disse ele finalmente. "Ambos vão."