O meu telemóvel caiu no chão com um baque surdo, mesmo ao lado da cama do hospital.
O ecrã estilhaçado mostrava a última mensagem que enviei ao meu marido, Leo.
"Leo, o nosso filho nasceu. É um menino."
Isso foi há três horas.
Ainda não houve resposta.
A enfermeira entrou para verificar os meus sinais vitais, o seu rosto era uma mistura de pena e profissionalismo.
"Senhora Alves, tentou ligar novamente ao seu marido? O bebé precisa de ser registado em breve, e precisa de um nome."
Eu balancei a cabeça em silêncio, o meu corpo ainda dorido do parto.
Eu sabia exatamente onde o Leo estava.
Ele estava com a sua ex-namorada, a Sofia. O filho dela, que não é dele, estava com febre alta.
"Vou cuidar disso," murmurei, a minha voz rouca.
Peguei no telemóvel novamente. Desta vez, em vez de uma mensagem, liguei-lhe.
A chamada foi atendida quase instantaneamente, mas não foi a voz do Leo que ouvi.
"Helena? É a Sofia. O Leo está a dar banho ao Tiago para baixar a febre. Ele não pode falar agora."
A sua voz era suave, quase apologética, mas carregada de um sentido de posse.
"Sofia, preciso de falar com o meu marido. É urgente."
"Eu sei, querida. Ele disse-me que o teu bebé estava a chegar. Parabéns. Mas o Tiago está mesmo muito doente, coitadinho. O médico disse que podia ser uma convulsão febril se não tivermos cuidado."
"O meu filho nasceu," disse eu, com a voz firme. "O Leo precisa de vir para o hospital."
Houve uma pausa. Ao fundo, ouvi o som de água a chapinhar e a voz do Leo a acalmar a criança. "Está tudo bem, campeão. O papá está aqui."
Papá.
O meu peito apertou. O meu filho, o seu filho de verdade, estava deitado num berço a poucos metros de mim, e o Leo estava a ser o "papá" de outro homem.
A Sofia voltou ao telefone. "Helena, ele sabe. Ele vai aí assim que puder. Apenas sê compreensiva, por favor. O Tiago realmente precisa dele."
Ela desligou.
Não gritou, não foi rude. Foi pior. Ela tratou-me como uma interrupção inconveniente na sua pequena emergência familiar.
Olhei para o meu filho. O seu rostinho estava enrugado, os seus olhos bem fechados. Ele era perfeito.
E o seu pai escolheu estar com outra pessoa.
A raiva que senti era fria e clara. Não havia lágrimas. Apenas uma decisão a formar-se na minha mente.
Isto não era novo. Durante toda a minha gravidez, a Sofia e o seu filho foram sempre a prioridade.
Uma constipação, um joelho arranhado, um pesadelo. Tudo exigia a presença imediata do Leo.
"Ele é apenas uma criança, Helena," o Leo dizia-me sempre. "A mãe dele não tem mais ninguém."
E eu? Eu não era ninguém? E o nosso filho que ainda não tinha nascido?
Agarrei no telemóvel com uma mão trémula e abri o contacto da minha advogada.
Comecei a escrever uma mensagem.
"Marta, preciso dos papéis do divórcio. O mais rápido possível."
Antes que eu pudesse enviar, uma chamada entrou. Era a minha sogra, a mãe do Leo.
Atendi, esperando uma explosão de alegria.
"Helena! Então? O bebé já nasceu? O Leo não atende o telemóvel!"
"Sim, nasceu," disse eu, a minha voz desprovida de emoção. "É um menino."
"Oh, graças a Deus! Um rapaz! Eu sabia! Como é que ele está? E tu? O Leo está aí contigo, certo? Ele deve estar nas nuvens!"
A sua felicidade genuína fez com que o meu coração doesse um pouco.
"Não, ele não está aqui. Ele está com a Sofia. O filho dela está com febre."
O silêncio do outro lado da linha foi pesado.
"O quê? Ele deixou-te sozinha... depois de dares à luz... para ir para casa dela?"
A sua voz mudou de alegria para incredulidade, e depois para uma fúria gelada.
"Aquele idiota. Aquele idiota egoísta! Eu vou ligar-lhe agora mesmo. Vou arrastá-lo para aí pelas orelhas se for preciso! Como é que ele se atreve!"
"Não se preocupe," disse eu calmamente. "Já tomei uma decisão."
"Que decisão?"
"Vou divorciar-me dele."