Na manhã seguinte, disse à minha mãe que precisava de sair para apanhar ar.
"Queres que vá contigo?" ela perguntou, os seus olhos preocupados.
"Não, preciso de estar sozinha."
Pedro ouviu-nos da cozinha.
"Onde vais, Clara?"
"Não é da tua conta," respondi friamente e saí antes que ele pudesse dizer mais alguma coisa.
O Parque Central estava cheio de gente a aproveitar o sol. Crianças a rir, casais de mãos dadas.
Cada som feliz era uma tortura.
Encontrei a fonte e esperei. O meu coração batia forte contra as minhas costelas.
Exatamente ao meio-dia, uma mulher aproximou-se de mim. Ela era pequena, com cabelo escuro e olhos nervosos.
"Você é a Clara?" ela perguntou em voz baixa.
Eu assenti.
"Eu sou a Ana. Eu enviei-lhe as mensagens."
Ela olhou à volta, como se tivesse medo de ser vista.
"Obrigada por ter vindo," disse eu. "A gravação..."
"Está aqui," disse ela, tirando um pequeno gravador de voz da sua bolsa. "Eu estava a gravar uma nota para mim mesma quando tudo aconteceu. A janela do café estava aberta. A gravação apanhou a vossa discussão."
Ela entregou-mo. As minhas mãos tremiam tanto que quase o deixei cair.
"Porquê agora? Porque não foi à polícia?" perguntei novamente.
Ana suspirou.
"Eu tenho medo. O seu marido... ele trabalha para uma empresa poderosa. E a chefe dele, Sofia Almeida... ela é uma pessoa muito influente nesta cidade. Eu tenho um filho. Não posso arriscar o meu emprego, a minha segurança."
Sofia Almeida. O nome atingiu-me. Claro. A chefe do Pedro. Uma mulher conhecida pela sua crueldade nos negócios.
"Eu entendo," disse eu, embora uma parte de mim ainda estivesse zangada. "O que está na gravação?"
"Tudo," disse Ana. "A voz da Sofia a pressioná-lo. O seu marido a responder. O barulho do acidente. Até... até o grito do seu filho."
Eu fechei os olhos, sentindo uma onda de náusea.
"Obrigada," sussurrei. "Não sei como lhe pagar."
"Não quero dinheiro," disse ela rapidamente. "Só quero que a justiça seja feita. Aquele menino merece isso."
Ela olhou para o relógio.
"Tenho de ir. Por favor, tenha cuidado, Clara. Estas pessoas são perigosas."
Ela virou-se e desapareceu na multidão.
Fiquei ali, a segurar o pequeno dispositivo de metal.
Era a minha única arma.
E eu ia usá-la.