As semanas passaram. A minha barriga crescia, e os meus recursos diminuíam.
Consegui um trabalho a fazer traduções online, o que me permitia trabalhar a partir de casa.
Não era muito, mas pagava o aluguer e a comida.
Um dia, enquanto estava no supermercado, senti uma presença familiar.
Virei-me e vi a minha mãe.
Ela parecia mais velha, com o rosto carregado de preocupação.
"Inês."
"Mãe. O que estás aqui a fazer?"
"Eu... eu andei à tua procura. O teu senhorio deu-me o teu novo endereço, mas eu não tive coragem de bater à porta."
Ela olhou para o meu cesto de compras. Leite, pão, vegetais. O básico.
"Estás a comer o suficiente? Pareces pálida."
Era a primeira vez em meses que ela mostrava alguma preocupação genuína.
"Eu estou bem, mãe."
"O Pedro e a Sofia vão casar no próximo mês."
Ela disse aquilo como se estivesse a dar uma notícia terrível.
"Eu sei. Ela disse-me."
A minha mãe abanou a cabeça, com os olhos a encherem-se de lágrimas.
"Como é que isto aconteceu? Vocês eram inseparáveis, tu e a Sofia. E tu amavas tanto o Pedro."
"As pessoas mudam, mãe."
"Mas falsificar um teste de paternidade? Divorciar-se enquanto estás grávida? Inês, isso é autodestruição. O que é que te levou a fazer uma coisa tão drástica?"
Olhei para a minha mãe. Para a mulher que sempre valorizou as aparências acima de tudo.
Poderia ela compreender a verdade?
"Mãe, eles não eram as pessoas que tu pensavas que eles eram."
"O que queres dizer com isso? O Pedro sempre foi tão educado, e a Sofia... ela era como uma filha para mim."
"Isso era uma fachada. Por trás das portas fechadas, as coisas eram diferentes."
Hesitei, sem saber quanto devia revelar.
"Diferentes como?"
"Eles... magoavam-me."
A palavra soou estranha, inadequada para descrever a crueldade subtil e constante.
A minha mãe franziu a testa.
"Magoavam-te? Fisicamente? O Pedro bateu-te?"
"Não, não fisicamente. Era... psicológico. Eles faziam coisas para me minar, para me fazer sentir louca."
Ela olhou para mim com ceticismo.
"Psicológico? Inês, isso soa a desculpa. Todas as relações têm os seus altos e baixos. Estás a dizer-me que te divorciaste por causa de algumas discussões?"
Eu vi nos olhos dela que ela não acreditava em mim.
Para ela, a dor só era real se deixasse marcas visíveis.
"Esquece, mãe. Tu não ias entender."
Paguei as minhas compras e saí da loja, deixando-a para trás, no meio do corredor.