Eu era apenas uma mãe, com o meu filho de cinco anos, Leo, a enfrentar uma cirurgia urgente depois de partir o braço.
Respirei fundo, esperando que o meu marido, João, chegasse para nos dar apoio.
Mas o seu telefone estava desligado. Uma, duas, três horas de silêncio de rádio.
Até que a minha sogra atendeu, com uma voz cheia de cautela.
"Ah, querida... o João está ocupado. A prima dele, a Catarina... o cão dela fugiu."
Senti a minha alma rasgar-se. O meu filho estava a ser operado, e ele estava a procurar um cão para a sua prima "frágil"?
A raiva borbulhava, mas nada me preparou para o que ouvi a seguir, a voz do João ao fundo: "Calma, Cati. Vamos encontrá-lo. Eu estou aqui. Não te vou deixar."
Aquela ternura, que nunca mais fora direcionada a mim, nem ao nosso filho, atingiu-me como um raio. Era uma faca no coração.
Quando ele finalmente apareceu no hospital, não veio sozinho. Trazia a Catarina, que encenava um ataque de pânico ali mesmo, no quarto do meu filho.
Ele sequer hesitou em ir atrás dela, deixando-nos para trás, Leo assustado, o braço engessado.
Era o fim.
Mas a partir daquele momento, a minha dor transformou-se em aço. Eu sabia o que tinha que fazer.
Ele me abandonou, mas nós iríamos renascer das cinzas.