No dia seguinte, comecei a arrumar as coisas do Lucas.
Cada pequeno brinquedo, cada peça de roupa, era uma memória dolorosa.
A minha sogra, a mãe do Pedro, entrou no quarto sem bater.
Ela olhou para as caixas com desdém.
"O que estás a fazer? A livrar-te das coisas dele tão depressa? Nem sequer o enterraste e já estás a tentar apagar a sua memória."
Eu continuei a dobrar uma pequena camisola azul.
"Estou a arrumar as minhas coisas. Vou-me embora."
Ela riu-se, um som áspero e desagradável.
"Ir embora? Não sejas ridícula. O Pedro está de coração partido. Ele precisa do teu apoio agora."
De coração partido? Ele não estava lá quando o coração do nosso filho parou de bater.
"Ele não precisa de mim. Ele tem a sua carreira e a filha do seu chefe para se preocupar."
A minha sogra aproximou-se, o seu rosto contorcido de raiva.
"Como te atreves a falar assim? Tu não entendes os sacrifícios que um homem tem de fazer. O Pedro estava a construir uma vida para vocês! E tu? O que fizeste? Provavelmente nem cuidaste do rapaz como devias! Se fosses uma mãe melhor, talvez ele ainda estivesse vivo!"
As suas palavras eram veneno.
Eu parei o que estava a fazer e olhei-a nos olhos.
"Eu era uma boa mãe. Eu estava lá. Onde estava o seu filho?"
Ela levantou a mão para me bater, mas eu segurei-lhe o pulso. A minha força surpreendeu-a e a mim também.
"Nunca mais me toques", disse eu, com uma voz fria que não reconheci como minha. "Sai da minha casa."
"Esta é a casa do meu filho!", gritou ela.
"Não por muito mais tempo."
Ela saiu a praguejar, dizendo que eu era uma esposa ingrata e sem coração.
Eu não me importei. As suas palavras não significavam nada.
Nesse mesmo dia, o Pedro chegou a casa com um advogado.
O seu nome era Sr. Guimarães, um homem de fato caro e sorriso falso.
"Sofia", começou o Pedro, evitando o meu olhar. "Eu não quero o divórcio. Acho que estamos ambos a agir por impulso, por causa da dor."
O Sr. Guimarães interveio.
"A minha cliente entende que este é um momento de grande sofrimento. No entanto, o meu cliente, o Sr. Alves, acredita que uma decisão tão drástica como o divórcio seria um erro."
Eu olhei para os dois, sentada no sofá rodeada de caixas.
"A minha decisão não é por impulso. É final."
O Pedro finalmente olhou para mim, os seus olhos suplicantes.
"Sofia, por favor. Eu amo-te. Eu amava o Lucas. Eu cometi um erro terrível, eu sei. Mas podemos superar isto juntos."
"Não há 'nós' para superar isto. Eu vou superar isto sozinha. Tu vais ter de viver com o teu erro sozinho."
O sorriso do Sr. Guimarães vacilou.
"Sra. Alves, talvez devêssemos discutir os termos. O Pedro está disposto a ser muito generoso."
"Eu não quero a generosidade dele. Eu quero o divórcio."
O Pedro levantou-se, a sua frustração a aumentar.
"O que queres, então? Vingança? Queres castigar-me para o resto da vida?"
"Eu não quero nada de ti, Pedro. Eu só quero que desapareças da minha vida."
A minha calma parecia enfurecê-lo mais do que qualquer grito.
Ele e o advogado saíram. Eu sabia que esta seria uma luta feia.
Mas eu estava pronta. Eu já tinha perdido tudo o que importava. Não tinha mais nada a perder.