As fotos eram de Paris.
O Pedro e a Helena, a sorrir para a câmara.
Numa foto, estavam em frente à Torre Eiffel, os braços um à volta do outro.
Noutra, estavam num restaurante chique, a brindar com taças de champanhe.
A legenda dizia: "A celebrar o fecho do maior negócio de sempre! Parabéns a esta dupla de sucesso, Pedro e Helena!"
As fotos eram de sexta-feira.
A hora da publicação correspondia exatamente à hora da reunião na escola da Sofia.
A "reunião de conselho" dele.
Senti o sangue a fugir-me do rosto.
A mentira era tão descarada, tão cruel.
Ele não estava numa sala de reuniões.
Ele estava a celebrar em Paris.
Com ela.
"Mamã? Estás bem?"
A voz da Sofia tirou-me do meu torpor.
Olhei para ela, para o seu rosto inocente e preocupado.
Forcei um sorriso. "Estou ótima, meu amor. Só vi uma mensagem de trabalho. Olha, é a nossa vez!"
Empurrei a raiva e a dor para o fundo da minha mente.
Este dia era para a Sofia.
Eu não ia deixar que ele o estragasse.
Mas à noite, depois de a Sofia adormecer, a raiva voltou.
Sentei-me no sofá escuro, o brilho do telemóvel a iluminar as fotos.
Ampliei o rosto dele.
Ele parecia feliz. Genuinamente feliz.
Um tipo de felicidade que eu não via nele há anos.
Uma felicidade que ele nunca partilhava connosco.
Senti-me uma idiota.
Por ter acreditado nele, mesmo que por um segundo.
Por ter defendido a sua ausência.
Por ter reencaminhado o email da escola, a pensar que talvez, só talvez, desta vez ele aparecesse.
O meu telemóvel tocou.
Era ele.
A chamada que ele prometera fazer.
Atendi, a minha voz fria como gelo.
"Olá."
"Olá! Então, como está a minha princesinha?" A sua voz era alegre, despreocupada.
"Ela está a dormir," respondi, sem rodeios.
"Ah, que pena. Queria falar com ela. O dia correu bem?"
"Sim, fomos a um parque de diversões."
"Ótimo! Vês? Não precisas de te preocupar tanto. Ela está bem."
Não consegui conter-me.
"Como foi a tua reunião de conselho, Pedro?"
Houve uma pequena hesitação.
"Foi... longa. Cansativa. Mas produtiva. Fechámos o negócio."
"Parabéns," disse eu, a minha voz carregada de sarcasmo. "Deves ter celebrado bastante."
"Sim, a equipa toda foi jantar. Foi bom para o moral."
"A equipa toda? Ou só tu e a Helena?"
O silêncio do outro lado foi a minha resposta.
"Eu vi as fotos, Pedro. Em Paris. Enquanto eu estava sentada numa cadeira minúscula a ouvir que a nossa filha se sente abandonada por ti."
Ele suspirou, um som de irritação.
"Clara, não é o que parece."
"Não? Então o que é? Ilumina-me. A Torre Eiffel faz parte do vosso novo escritório?"
"Foi uma viagem de negócios! A celebração aconteceu depois. Qual é o problema?"
"O problema, Pedro, é que mentiste! Mentiste sobre uma reunião de conselho para evitares ir à escola da tua filha. Preferiste ir celebrar com a tua amante a assumires as tuas responsabilidades como pai!"
"Não lhe chames isso!" gritou ele. "A Helena é minha colega!"
"Colegas não se abraçam em frente à Torre Eiffel como se estivessem em lua de mel!"
"Estás a ser histérica e ciumenta! O nosso casamento acabou, Clara! Eu não te devo explicações sobre a minha vida pessoal!"
"Deves explicações à tua filha! Ela é a tua responsabilidade! Uma responsabilidade que tu abandonaste para ires passear para Paris!"
A minha voz estava a subir, a raiva a transbordar.
"Eu não a abandonei! Eu sustento-a! Dou-lhe tudo o que ela precisa!"
"Ela não precisa do teu dinheiro, Pedro! Ela precisa do pai dela! Mas é óbvio que esse papel já foi preenchido por coisas mais 'importantes'."
"Se vais continuar com este drama, eu desligo."
"Desliga," desafiei-o. "Foge. É o que fazes melhor."
Ele desligou.
Atirei o telemóvel para o outro lado do sofá.
As lágrimas que eu tinha contido durante todo o dia finalmente caíram.
Não eram lágrimas de tristeza.
Eram lágrimas de pura raiva.
Ele não tinha apenas mentido.
Ele tinha-me desrespeitado. Tinha desrespeitado a nossa filha.
E tinha-o feito sem um pingo de remorso.
Naquele momento, algo mudou dentro de mim.
A dor deu lugar à determinação.
Ele achava que podia simplesmente apagar-nos da sua vida, tratando-nos como um inconveniente.
Ele estava muito enganado.
Eu não ia deixar que ele saísse impune.
Não mais.