No dia em que o meu filho Lucas completou três anos, o meu marido, Pedro, não apareceu.
Liguei para ele, mas a chamada foi direta para o voicemail.
O bolo de aniversário com o tema de super-heróis estava na mesa, intacto.
Lucas, na sua pequena cadeira, olhava para a porta com os seus grandes olhos castanhos, à espera do pai.
A minha sogra, Helena, sentada no sofá, suspirou alto.
"Mariana, não precisavas de fazer tanto alarido. O Pedro está ocupado com coisas importantes."
"Coisas importantes?", perguntei, a minha voz a tremer um pouco. "Mais importantes que o aniversário do próprio filho?"
"A Sofia não está bem", disse ela, como se isso explicasse tudo. "Ela precisa do Pedro. Tu e o Lucas podem aguentar-se sozinhos."
Sofia. A irmã mais nova do Pedro. A menina dos olhos da família.
Ela tinha vinte e quatro anos, era saudável, mas vivia num estado de drama perpétuo. E o Pedro era sempre o seu cavaleiro andante.
"Ela teve uma pequena discussão com o namorado", continuou Helena, a inspecionar as unhas. "O Pedro foi consolá-la. Ele é um bom irmão."
Um bom irmão, mas um pai ausente. E um marido negligente.
Olhei para o Lucas. A sua pequena boca começou a tremer.
"O papá não vem?"
O meu coração partiu-se. Ajoelhei-me à sua frente e forcei um sorriso.
"O papá ficou preso no trabalho, meu amor. Mas nós vamos festejar, só nós os dois. Que tal?"
Lucas assentiu, mas a desilusão no seu rosto era evidente.
A minha decisão foi tomada naquele momento. Já não podia continuar assim.
"Helena, eu quero o divórcio", disse eu, com a voz firme.
Ela olhou para mim, chocada, e depois desatou a rir. Um riso frio e desdenhoso.
"Divórcio? Mariana, não sejas ridícula. O Pedro ama-te. Ele só está a passar por uma fase."
"Uma fase que já dura três anos?", retorqui. "Uma fase que o faz faltar a todos os momentos importantes da vida do nosso filho?"
"Tu és tão egoísta!", exclamou ela, levantando-se. "A Sofia precisa dele! Ela é frágil! Tu és forte, tens de compreender!"
Frágil? A Sofia passava os fins de semana a fazer caminhadas na montanha e a viajar pelo mundo. Eu não saía de casa há meses, exausta entre o trabalho e cuidar do Lucas.
"Eu compreendi durante demasiado tempo", disse eu, a minha voz a ganhar força. "Agora acabou. Quando o Pedro voltar, diga-lhe para falar com o meu advogado."
Peguei no Lucas ao colo, ignorei os protestos da minha sogra e fui para o quarto.
Fechei a porta e o som dos seus gritos ficou abafado.
Lucas enterrou o rosto no meu ombro e começou a chorar baixinho.
"O papá não gosta de mim, mamã?"
Abracei-o com força, o meu próprio corpo a tremer de raiva e tristeza.
"Claro que gosta, meu amor. O papá só está... confuso."
Mas as palavras soaram ocas até para mim. O Pedro não estava confuso. Ele tinha feito a sua escolha. E essa escolha não éramos nós.