O confronto aconteceu no dia seguinte, no corredor silencioso do hospital. Eu estava a voltar da cafetaria, com um chá morno na mão. Ele estava à minha espera, com a cara fechada.
"Precisamos de falar, Clara."
"Eu não tenho nada para te dizer, Miguel."
"Ah, não tens? Pois eu tenho. Quero saber que história é essa do divórcio. Estás a brincar comigo? Depois de tudo o que eu estou a fazer por ti?"
"Tudo o que estás a fazer por mim? O que é que tu estás a fazer, exatamente? Além de me culpares e de te preocupares com os sentimentos da tua prima?"
Ele passou a mão pelo cabelo, um gesto que ele fazia quando se sentia encurralado.
"Eu estou a trabalhar para pagar esta conta de hospital caríssima. Eu estou a tentar manter a nossa vida a funcionar. Enquanto tu estás aqui, a fazer este drama todo."
"Drama? O meu filho está a lutar pela vida e tu chamas a isso drama?"
"O nosso filho!", gritou ele, e algumas pessoas olharam. "Para de dizer 'meu filho', como se eu não existisse! Eu sou o pai! E estou farto desta tua atitude fria e acusadora. Desde que o Tiago nasceu que não me dás uma palavra de apoio. Só sabes criticar."
Eu ri. Não consegui evitar.
"Apoio? Tu queres apoio? Onde estavas tu quando a minha bolsa rebentou? Onde estavas tu quando eu estava a ser levada para uma cirurgia de emergência? Onde estavas tu quando o nosso filho nasceu? Ah, pois. A consolar a Sofia por causa de uma pizza. Desculpa se não sinto vontade de te dar uma medalha."
A cara dele ficou vermelha de fúria.
"Tu és impossível. Sempre foste egoísta. Só pensas em ti. A Sofia tem uma saúde mental frágil, já te disse mil vezes. Ela precisa de cuidados. Tu és forte, Clara. Tu aguentas. Ela não."
"Eu cansei-me de ser forte, Miguel", disse eu, com a voz baixa e firme. "Eu cansei-me de aguentar por ti, por ela, por todos. Agora, a minha única força é para o meu filho. E tu não fazes parte disso."
Virei-lhe as costas e comecei a andar.
"Clara!", ele gritou. "Não te atrevas a virar-me as costas! Nós temos um filho juntos! Não podes simplesmente decidir tudo sozinha!"
Continuei a andar, sem olhar para trás. A decisão estava tomada. Ele só ainda não tinha percebido.