A noite foi longa. Não consegui dormir.
Fiquei sentada na sala de estar escura, a olhar para as malas junto à porta.
Por volta das 3 da manhã, ouvi a chave na fechadura.
Pedro entrou, a andar na ponta dos pés. Ele não me viu no escuro.
Ele foi direto para a cozinha, abriu o frigorífico e bebeu água diretamente da garrafa.
Acendi a luz.
Ele sobressaltou-se, a água a escorrer pelo seu queixo.
"Ana! O que estás a fazer acordada? Assustaste-me."
Os seus olhos foram para as malas junto à porta. A sua expressão mudou de surpresa para irritação.
"O que é isto? Ainda estás zangada com aquilo? Já te disse, a Sofia estava doente."
"Eu sei," disse eu calmamente. "Ela mandou-me uma foto."
O rosto do Pedro ficou pálido.
"Que foto?"
"Tu e ela. A cozinhar. Pareciam muito íntimos."
Ele desviou o olhar. "Ela está a ser dramática. Sabes como ela é. Estávamos apenas a cozinhar."
"Ela também me disse que tu lhe disseste que o meu prémio era apenas um pedaço de metal."
O silêncio dele foi a sua confissão.
"Pedro, eu quero o divórcio."
Desta vez, a sua raiva era diferente. Não era quente e explosiva, mas fria e cortante.
"Para com isso, Ana. Estás a exagerar. Eu cometi um erro. Peço desculpa. Agora desfaz as malas."
Ele caminhou em direção às malas, mas eu interpus-me no seu caminho.
"Não. Acabou."
Ele agarrou-me pelo braço, a sua mão apertada com força. "Não sejas ridícula. Nós estamos casados. Tu não podes simplesmente ir embora."
"Larga-me," disse eu, a minha voz baixa e perigosa.
"Não até parares com este disparate. O que é que as pessoas vão pensar? O que é que a tua mãe vai pensar? Vais humilhá-la?"
A menção da minha mãe fez o meu sangue ferver.
"Tu não te atrevas a falar da minha mãe. O teu sogro insultou-me e a ela hoje à noite, e tu não fizeste nada."
Ele largou o meu braço, parecendo genuinamente confuso. "O quê? O Ricardo? O que é que ele disse?"
"Não importa. Já não importa."
Peguei na minha mala. "Eu vou ficar num hotel. O meu advogado entrará em contacto contigo."
Virei-me para sair.
"Ana, espera!" A sua voz estava desesperada agora. "Não faças isto. Eu amo-te."
Parei na porta, sem me virar.
"Não, não amas. Tu amas a ideia de mim. A arquiteta bem-sucedida que te faz parecer bem. Mas não me amas a mim."
Saí e fechei a porta atrás de mim.
O som do clique do trinco foi o som mais definitivo que alguma vez ouvi.