Deixei-a entrar, contra a minha vontade. Ela parecia desesperada.
"O que queres, Sofia?"
"O Pedro precisa de ti," disse ela, com a voz a tremer. "Os médicos dizem que ele não tem muito tempo se não encontrar um dador compatível. Eu imploro-te, Clara. Faz o teste."
"Porque é que eu haveria de o fazer?"
"Porque tu amavas-o!" gritou ela. "Eu sei que o que fizemos foi horrível, mas ele vai morrer! Não consegues pôr a tua raiva de lado para salvar a vida dele?"
Olhei para ela. A mulher que tinha sido a minha melhor amiga, agora a implorar-me para salvar o homem que ambas amávamos. A situação era surreal.
"Onde estavas tu, Sofia, quando eu precisava de uma amiga? Onde estavas tu quando o meu mundo estava a desabar?"
As lágrimas escorriam-lhe pelo rosto. "Eu sei que errei. Eu fui egoísta. Mas isto não é sobre mim, é sobre o Pedro. Se ainda tens algum sentimento por ele, por favor, ajuda-o."
Senti um turbilhão de emoções. Raiva, dor, e uma pequena, teimosa centelha de compaixão. Apesar de tudo, a ideia do Pedro a morrer... era difícil de aceitar.
"Eu vou pensar nisso," disse eu, finalmente.
Não era uma promessa, mas foi o suficiente para lhe dar um vislumbre de esperança. Ela agradeceu-me profusamente e foi-se embora.
Fiquei sozinha com os meus pensamentos. Salvar o Pedro? Significaria perdoá-lo? Significaria esquecer a traição?
Não. Não significava nada disso. Significaria apenas que eu era uma pessoa decente. Ou talvez significasse que eu era uma idiota.
No dia seguinte, fui ao hospital. Não para visitar o Pedro, mas para falar com o médico dele.
O Dr. Almeida explicou-me a situação. O estado do Pedro era crítico. A lista de espera por um dador era longa e as suas hipóteses eram reduzidas.
"Fazer o teste é um procedimento simples," disse ele. "Uma simples amostra de sangue."
Concordei em fazer o teste. Fi-lo por mim, para poder dormir à noite. Para saber que, quando tudo acabasse, eu não teria o peso de uma morte na minha consciência.
Uma semana depois, recebi os resultados.
Eu era compatível. Cem por cento compatível.