Na sua vida anterior, a história que contaram foi que Clara, frágil e sensível, ficou tão triste com o casamento da irmã que teve um colapso nervoso.
A verdade, que Laura descobriu muito depois, era mais sórdida.
Naquela manhã, Clara não teve um colapso.
Ela enviou um vídeo para João.
No vídeo, ela estava na beira de uma ponte, com um vestido branco, parecendo um anjo da morte, chorando e dizendo que se ele se casasse com Laura, ela se jogaria.
Era chantagem emocional em seu estado mais puro e cruel.
Claro que João, obcecado por ela como era, entrou em pânico.
Na memória de Laura, ela viu o rosto dele, pálido e aterrorizado, quando recebeu a mensagem.
Ele nem sequer pensou nela, na noiva que o esperava, nas centenas de convidados.
Seus olhos ficaram vermelhos de pânico e ele saiu correndo como um louco, deixando tudo para trás para "salvar" sua amada Clara.
Ele a salvou, é claro.
Eles viveram seu romance proibido às escondidas por cinquenta anos, enquanto Laura vivia uma vida de fachada.
Mas agora, parada ali, em seu vestido de noiva, olhando para Pedro, todo aquele drama parecia distante e patético.
Não era mais o seu problema.
O sofrimento de João e a manipulação de Clara não lhe pertenciam mais.
Ela sentia uma calma fria, uma clareza que nunca tivera.
O caos que se desenrolava ao seu redor, as vozes irritadas de sua família e da família de João, tudo parecia um ruído de fundo.
Ela focou novamente em Pedro.
"Pedro, eu não estou brincando" , disse ela, sua voz trazendo-o de volta do seu estupor. "Eu o escolho. Você me aceita?"
O olhar dele percorreu o rosto dela, buscando qualquer sinal de hesitação, de loucura.
Mas ele só encontrou determinação.
Lentamente, como se estivesse se movendo contra uma forte correnteza, ele deu um passo à frente, afastando-se da parede.
Ele parou a centímetros dela.
O cheiro dele era de sabonete barato e algo vagamente metálico, talvez de seu trabalho.
Era real.
Ele era real.
Sua voz, quando finalmente falou, era rouca, como se não fosse usada há muito tempo.
"Sim."
Uma única palavra.
Mas para Laura, foi o som mais bonito do mundo.
Ele a pegou pela mão.
Sua mão era grande e áspera, cheia de calos, muito diferente das mãos macias e bem cuidadas de João.
Mas o toque era firme, seguro.
Quente.