O ar no pequeno quarto ficou pesado.
A minha mãe deu um passo à frente, colocando-se entre mim e o meu pai.
"Tu não tens o direito," disse ela, com a voz baixa e feroz. "Não depois de todos estes anos. Não tens o direito de aparecer aqui e agir como se te importasses."
"Stella, por favor," disse o meu pai, a sua voz calma. "Isto não é sobre nós. É sobre a Sofia. Olha para este lugar. Ela não pode ficar aqui."
"E para onde a vais levar?", retorquiu a minha mãe. "Para outro dos teus esquemas falhados? Vais desaparecer de novo quando as coisas ficarem difíceis?"
As suas palavras eram veneno, destilado de anos de dor.
Eu fiquei ali, apoiada na ombreira da porta, a ver a velha guerra a reacender-se à minha frente.
"Eu mudei, Stella."
"As pessoas não mudam, Ricardo."
Ele finalmente desviou o olhar de mim para ela.
"Eu mudei. Tenho um negócio estável. Uma casa. Posso cuidar dela."
Ele olhou de volta para mim.
"Sofia, vem comigo. Pelo menos até recuperares. Tens o teu próprio quarto. Espaço. Podes descansar como deve ser."
A oferta era tentadora. Este quarto sufocava-me. A tensão com a minha mãe era insuportável.
"Não vás, Sofia," disse a minha mãe, virando-se para mim, com os olhos desesperados. "Ele vai magoar-te. Ele magoa sempre toda a gente."
Olhei para o meu pai.
Vi um homem mais velho, cansado, com um pedido de desculpas silencioso nos olhos.
Olhei para a minha mãe.
Vi uma mulher aterrorizada, a agarrar-se à única coisa que lhe restava no mundo: eu.
"Mãe," comecei, com a voz suave. "É só por um tempo. Até eu conseguir andar de novo. Até eu arranjar um emprego e um lugar para nós."
"Não!", ela gritou, a sua voz a quebrar. "Se fores com ele, não precisas de voltar!"
O ultimato pairou no ar, feio e final.
Senti o meu coração partir-se um pouco mais.
O meu pai suspirou.
"Stella, não faças isto."
"Sai da minha frente, Ricardo. Saiam os dois!"
Ela apontou para a porta, com a mão a tremer.
O meu pai olhou para mim, uma pergunta nos seus olhos.
Tomei uma decisão.
Talvez fosse a errada. Talvez a minha mãe tivesse razão.
Mas eu não conseguia respirar naquele quarto. Não conseguia curar-me no meio daquele desespero.
"Eu vou com ele," disse eu, baixinho.
O rosto da minha mãe desmoronou-se. A raiva foi substituída por uma dor pura e crua.
Ela não disse mais nada. Apenas se virou e sentou-se na cama, de costas para nós.
O meu pai ajudou-me a pegar na minha pequena mala. A sua mão no meu braço era firme e segura.
Enquanto ele me ajudava a descer o corredor, olhei para trás uma última vez.
A porta do quarto continuava aberta. A minha mãe continuava de costas, uma figura pequena e solitária no meio do quarto sombrio.
Senti uma culpa avassaladora.
Mas continuei a andar.