A Verdade de Sofia: Contra o Vento e a Calúnia
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Capítulo 4

Uma semana depois do encontro no café, a minha vida tinha entrado numa nova rotina.

Encontrei um emprego a tempo parcial numa livraria perto do meu apartamento. O salário não era muito, mas era o suficiente para pagar as contas. E, mais importante, mantinha-me ocupada.

Os livros sempre foram o meu refúgio. Estar rodeada por eles, pelo cheiro a papel e a histórias, era reconfortante.

Numa tarde tranquila de terça-feira, enquanto arrumava uma prateleira de romances, a campainha da porta da livraria soou.

Levantei o olhar e o meu coração parou.

Era a Clara.

Estava mais magra, com o rosto pálido e olheiras profundas. Usava um vestido simples e escuro. Não parecia a mulher confiante e radiante que eu conhecia.

Ela caminhou lentamente na minha direção, os seus olhos fixos nos meus.

"Sofia. Podemos conversar?"

A minha primeira reação foi dizer não. Mandá-la embora.

Mas a sua aparência frágil desarmou-me. Ela parecia... quebrada.

"Aqui não, Clara. Estou a trabalhar."

"Por favor. Só cinco minutos. Lá fora."

Hesitei, depois acenei ao meu chefe, um senhor idoso e simpático chamado Sr. Mateus, que me deu um aceno de compreensão.

Saímos para a calçada. O sol da tarde era quente.

Cruzámos os braços, um espelho estranho uma da outra.

"O que queres?", perguntei, a minha voz mais suave do que eu pretendia.

Ela olhou para o chão.

"Eu queria... pedir desculpa."

As palavras saíram num sussurro.

"Eu sei que 'desculpa' não conserta nada. Mas eu precisava de o dizer. Eu fui horrível. Fui uma péssima prima, uma péssima pessoa."

Lágrimas começaram a escorrer pelo seu rosto.

"Eu estava tão invejosa de ti, Sofia. Sempre estiveste. Tinhas tudo. O amor dos teus pais, boas notas, e depois... tinhas o Pedro. Eu sempre o amei, desde que éramos adolescentes."

Fiquei a ouvi-la, sem a interromper.

"Quando ele começou a dar-me atenção, eu senti-me... especial. Senti que finalmente estava a ganhar alguma coisa. Fui egoísta e cega. Não pensei nas consequências. Não pensei em ti."

Ela soluçou, um som doloroso.

"E depois... quando eu perdi o bebé... eu percebi. Percebi a dor que te causei. Perder um filho... é um inferno. E eu fiz-te passar por isso sozinha."

O seu arrependimento parecia genuíno. A sua dor era real.

E apesar de tudo o que ela me tinha feito, eu não consegui sentir ódio. Apenas uma tristeza profunda por nós as duas, por tudo o que tínhamos perdido.

"Porque é que me estás a dizer isto agora, Clara?"

Ela limpou as lágrimas com as costas da mão.

"Porque eu terminei tudo com o Pedro. Disse-lhe que não o queria voltar a ver. E porque... a mãe dele, a Helena, ela está a tornar a minha vida num inferno."

"O que é que ela fez?"

"Ela culpa-me por tudo. Por ter perdido o 'neto precioso' dela. Por o Pedro estar deprimido. Ela liga-me todos os dias, a insultar-me. Diz que eu te destruí a família e que agora estou a destruir o filho dela."

A ironia era amarga. A mesma mulher que me desprezava agora atormentava a sua nova protegida.

"Ela disse que eu nunca serei boa o suficiente para ele. Que eu sou uma destruidora de lares."

Clara olhou para mim, os seus olhos vermelhos e inchados.

"Ela tem razão, não tem? Eu sou."

Eu não sabia o que dizer. Não podia absolvê-la, mas também não queria condená-la.

"O que vais fazer agora?", perguntei.

"Vou-me embora. Vou mudar-me para o Porto. Começar de novo. Longe de tudo isto. Longe dele, longe da mãe dele."

Ela deu um passo em frente e, para minha surpresa, pegou na minha mão.

"Eu só queria que soubesses, Sofia. E queria avisar-te. Tem cuidado com a Helena. Ela não vai deixar o Pedro em paz. E ela vai culpar-te para sempre por o teres 'abandonado'."

Soltou a minha mão e deu um passo atrás.

"Adeus, Sofia. Espero que um dia consigas ser feliz."

Ela virou-se e foi-se embora, deixando-me ali, na calçada, a processar a sua confissão e o seu aviso.

A guerra podia ter acabado para a Clara, mas eu tinha a sensação de que a minha batalha com a minha ex-sogra estava apenas a começar.

                         

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