"Pedrinho," ele chamou, a voz suave, em total contraste com a tensão na sala. "Filho, coloque seus fones de ouvido e jogue um pouco no seu tablet, ok? Papai precisa conversar com a sua mãe."
Ele ouviu um "tá bom, pai" abafado vindo de dentro do quarto. Só então ele se virou para Joana, o rosto transformado em uma máscara de frieza.
"Nós dois," ele disse, apontando para a cozinha. "Vamos ter uma conversa. Agora."
O tom dele era tão autoritário que Joana, por um momento, ficou sem palavras. Ela o seguiu até a cozinha, a raiva dando lugar a uma certa apreensão. Ele fechou a porta, isolando-os.
"O que foi agora, Marcos? Vai me dar um sermão?"
Ele não respondeu. Apenas a encarou, os olhos fixos na lapela de seu blazer.
"Bonito broche," ele disse, a voz baixa. "Onde você conseguiu?"
Joana tocou instintivamente a joia, uma ponta de pânico em seus olhos.
"Ah, isso? Eu... eu comprei. Vi numa vitrine e me dei de presente. Eu mereço, não acha?"
A mentira era tão descarada, tão mal construída, que Marcos sentiu uma onda de náusea.
"Você mente muito mal, Joana. Sempre mentiu."
Ele se aproximou, o corpo tenso. "Você estava disposta a deixar nosso filho ser humilhado e agredido. Você queria que ele, a vítima, pedisse desculpas. Tudo para proteger seu caso com o pai do agressor. Você tem noção do quão baixo você foi?"
"Caso? Que caso? Você está delirando, Marcos! O Sr. Almeida é um... um cliente em potencial!"
"Um cliente que te dá joias idênticas às que ele usa? Um cliente com quem você se encontra em hotéis de luxo? Pelo amor de Deus, Joana, tenha pelo menos a decência de não me tratar como um idiota!"
A máscara dela finalmente caiu. O rosto se contorceu em uma careta de desprezo.
"E se for? O que você tem a ver com isso? Nós não estamos mais juntos! Eu tenho o direito de refazer a minha vida! O Sr. Almeida é um homem poderoso, influente. Ele pode me dar coisas que você nunca pôde!"
"Coisas? É disso que se trata? De 'coisas'?", ele a condenou, a voz carregada de nojo. "Você trocou a segurança e a dignidade do seu próprio filho por 'coisas'?"
Ela tentou uma tática diferente. Aproximou-se, o rosto suavizando, tentando parecer sedutora. Colocou as mãos no peito dele.
"Marcos, não vamos brigar. Nós sempre nos demos bem, mesmo depois da separação. Não vamos estragar isso. Pense no Pedrinho..."
Ele sentiu o toque dela como se fosse algo sujo. Com um movimento rápido e firme, ele segurou os pulsos dela e os afastou de seu corpo.
"Não toque em mim," ele disse, a voz cheia de repulsa. "E não use o nome do nosso filho para justificar essa sua sujeira."
Nesse exato momento, o celular dele vibrou no bolso. Era uma nova mensagem de Sérgio, o investigador. Ele soltou Joana e pegou o aparelho.
A mensagem continha um link para uma pasta segura. Ele abriu. Havia dezenas de fotos. Joana e Almeida jantando em restaurantes caros, entrando em hotéis, se beijando dentro de um carro. Havia também extratos bancários, mostrando transferências de valores altos da conta de Almeida para a de Joana. A investigação de Sérgio fora rápida e brutalmente eficiente. Aquilo não era um caso recente. Durava há quase um ano.
Ele ergueu os olhos do celular e encarou Joana. A prova definitiva estava em suas mãos. A raiva que sentia era tão intensa que ele precisou se controlar para não explodir. Em vez disso, uma calma assustadora tomou conta dele. A decisão estava tomada.
Ele caminhou até um armário na sala de estar, onde guardava documentos importantes. Pegou uma pasta e voltou para a cozinha, colocando-a sobre a mesa na frente de Joana.
"O que é isso?", ela perguntou.
"Nossos papéis de divórcio. A parte da partilha de bens. Eu fui generoso com você, Joana. Te dei o apartamento, um carro, uma pensão que a maioria das mulheres só sonha em ter. Tudo para que você e Pedrinho tivessem uma vida confortável."
Ele abriu a pasta. "Isso acaba hoje."
Antes que ela pudesse reagir, a porta da cozinha se abriu lentamente. Era Pedrinho, os olhos vermelhos. Ele segurava seu tablet.
"Pai...", ele disse, a voz baixa. "A mamãe... ela me disse para não te contar."
"Não me contar o quê, filho?", Marcos perguntou, o coração apertado.
"Que o amigo rico dela ia dar um presente bem grande para a escola. E que se eu fosse um bom menino e não contasse para ninguém sobre a briga, ela me compraria aquele videogame novo. Ela disse que era o nosso segredinho."
A revelação foi como um soco final. Joana não só tentou abafar o caso, ela tentou subornar o próprio filho, manipulando-o para que mentisse para o pai.
Marcos sentiu a última gota de compaixão que poderia ter por ela evaporar. Ele se ajoelhou na frente de Pedrinho, ignorando completamente a presença de Joana.
"Obrigado por me contar, campeão. Você fez a coisa certa. Você é o menino mais corajoso que eu conheço," ele disse, abraçando o filho com força. "E eu te prometo, eu prometo que a justiça será feita. Ninguém nunca mais vai te machucar ou te pedir para mentir. Eu estou aqui."
Ele se levantou e olhou para Joana, que estava pálida, chocada com a revelação do filho.
"Fora", ele disse, a voz mortalmente calma.
"O quê?"
"Eu quero você fora da minha casa. Agora. Pegue suas coisas e suma da minha frente." Ele apontou para os papéis na mesa. "Meu advogado vai entrar em contato com o seu. A partir de agora, nossa única comunicação será através deles. Você perdeu tudo, Joana. Especialmente, o direito de ser mãe do meu filho."