A tempestade rebentou com uma fúria inesperada.
O vento uivava e a chuva caía em lençóis. Dentro do local da festa, os convidados riam e conversavam, alheios à violência lá fora.
O local tinha um magnífico teto de vidro, que agora era bombardeado por granizo do tamanho de bolas de golfe.
Sofia estava perto da varanda, a observar a tempestade, quando ouviu um som agudo de estalido vindo de cima.
As pessoas começaram a gritar.
O teto de vidro estava a ceder.
O pânico instalou-se. Todos corriam para as saídas.
Sofia ficou paralisada por um segundo, a olhar para cima enquanto os estilhaços de vidro começavam a chover.
Ela procurou por Thiago.
Ele estava a poucos metros de distância. Os seus olhos encontraram-se por uma fração de segundo.
Mas depois, ele virou-se.
Isabela estava a gritar, encolhida de medo.
Instintivamente, sem um segundo de hesitação, Thiago correu na direção dela. Ele atirou-se sobre ela, protegendo-a com o seu próprio corpo enquanto o vidro estilhaçado caía à volta deles.
Ele nem olhou para trás.
Um pedaço grande de vidro atingiu o ombro de Sofia. A dor foi aguda e imediata. Ela caiu de joelhos, o sangue a manchar o seu vestido.
O mundo à sua volta tornou-se um borrão de gritos e caos.
A última coisa que ela viu antes de desmaiar foi Thiago a ajudar Isabela a levantar-se, a verificar se ela estava bem, completamente alheio ao facto de a sua própria esposa estar ferida no chão.
Ela acordou num quarto de hospital.
O cheiro a antisséptico enchia o ar. O seu ombro estava enfaixado e doía a latejar.
Ela estava sozinha.
Uma enfermeira entrou no quarto, o seu rosto uma mistura de pena e irritação.
"A senhora Mendes? Como se sente?"
"Onde está o meu marido?" A voz de Sofia era um sussurro rouco.
A enfermeira suspirou. "O senhor Alves está no quarto ao lado, com a senhora Rocha. Ela está em choque, mas não se feriu. Ele não saiu do lado dela."
Sofia fechou os olhos. Claro que não.
Ela pediu à enfermeira o seu saco. A enfermeira hesitou, mas depois entregou-lho.
Dentro, entre os seus pertences, estava o "Caderno de Pontos".
Com a mão que não estava ferida, ela abriu-o. A sua caligrafia estava instável, mas a sua intenção era clara.
"15 de Setembro. Aniversário de casamento. Festa de Isabela. Ele protegeu-a e deixou-me ser ferida. Menos 20 pontos."
A pontuação era agora de 45.
A enfermeira observava-a, curiosa. "O que é isso, se não se importa que pergunte?"
"Um registo," disse Sofia, a voz vazia. "Um registo do fim."
Nesse momento, a porta abriu-se e Thiago entrou. Ele parecia cansado e preocupado.
"Sofia! Graças a Deus. Como estás? Fiquei tão preocupado."
As suas palavras soaram ocas. Falsas.
Sofia olhou para ele, os seus olhos frios e vazios de qualquer emoção.
Ele tinha feito a sua escolha.
Agora, ela ia fazer a dela.